Acredito que a esmagadora maioria dos leitores habituais do Diário do Rio não vão votar em Crivella, inclusive, votam em qualquer um, menos Crivella. Afinal, o leitor do Diário faz parte daquele grupo de pessoas em que Crivella, segundo qualquer pesquisa, perderia feio. O Bispo Marcelo Crivella representa aquilo que a política tem de mais hediondo, que é aproveitar a miséria, o assistencialismo, o populismo e misturar a fé das pessoas com a política.
Desta forma não dá para deixarmos de reproduzir o ex-blog do Cesar Maia de hoje, em que faz uma análise da espécie de política feita pelo sobrinho do Edir Macedo.
CRIVELLA: NEO-CHAGUISMO! BICA D’ÁGUA E CIMENTO SOCIAL!
A política de clientela no Rio tem larga tradição. Já estava estruturada nos anos 20, com os chefes eleitorais nos bairros e assume o poder -50 anos depois- por obra e graça dos militares, através do governador Chagas Freitas. A política de clientela nos bairros, desde aquela época, sempre contou com os centros sociais e, portanto não é isso, hoje, o que a inova. Aliás, nem as milícias.
O populismo na Cidade do Rio, desde o DF, tem nuances a cada período. Quando chegou ao poder com o chaguismo, caracterizou-se pelo que se chamou de “política da bica d’água”. Por outro lado subdividia a cidade por área e entregava todo o poder de nomear aos políticos diretamente vinculados ao esquema do governador. O que caracterizava a “política de bica d’água” eram os pequenos consertos que eram feitos nas favelas, criando clientela própria com eles, sem entrar nas questões sociais básicas, como educação, saúde, urbanização completa…
No início dos anos 90, o crescimento dos neopentecostais nas favelas e a desintegração dos espíritas nestas comunidades, muitas vezes por perseguição, introduziu uma vertente nova do populismo com essa base política, neo-religiosa. A primeira expressão dela no Rio-Capital foi a votação da deputada Benedita da Silva, em 1992 que liderou a eleição no primeiro turno. Intensificou-se com ela mesma -senadora e depois com as vitórias de Garotinho.
Mas Benedita por fazer parte do PT, em seu período ideológico, tinha seus constrangimentos para adotar uma política aberta de bica d’água. Garotinho fez uma adaptação menos explícita, ao usar a política de renda mínima com seu cheque-cidadão. O que caracterizaria a clientela seriam o cadastro e as regras de distribuição, coisa que se manteve em segredo até hoje, já que o atual governo estadual, ao adotar o bolsa-família e eliminar do benefício milhares de pessoas, não contratou uma pesquisa para analisar os desvios e os critérios adotados.
A terceira etapa do populismo de referência neopentecostal veio com Marcelo Crivella, segundo homem na hierarquia efetiva da IURD. Vencedor na eleição para o senado numa chapa com esta característica liderada pela candidatura da Sra. Garotinho, testou mais duas vezes seu prestígio eleitoral nas eleições de 2004 para prefeito (21%) e de 2006 (14%) para governador.
Ele e sua assessoria chegaram à conclusão que este patamar de 15% a 20% não o levaria a vitória se não se afastasse formalmente da condição de “bispo” da IURD e se não tivesse uma proposta efetiva para estas comunidades mais pobres. Suas derrotas nas favelas em 2004 e 2006, apesar da boa votação exigiam mudanças.
E assim foi feito. “Desligou-se” pró-forma da IURD e do título de “bispo”, e mobilizou os membros da IURD nas comunidades e nas ruas, pedindo que não declarassem que era esta filiação a razão de o apoiarem (embora estes não resistam e digam, hoje, a qualquer um a razão de estarem com as bandeiras azuis de Crivella, nas comunidades e nas ruas).
Trouxe um programa de intervenções nas comunidades, de forma a ter um carro-chefe de votos. E veio com recursos públicos, com o exército, apoio vice e presidencial, et caterva. O interessante é que ao propor o Cimento Social, não está trazendo rigorosamente nada de novo. De novo, só o nome. É exatamente a mesma “política de bica d’água” do chaguismo, onde se pinta uma casa, se doa um sanitário, uma bica para o banheiro, etc.
Volta o chaguismo de forma explícita. Até se afastar de mentirinha de sua igreja é igual, pois na época do chaguismo a presença de várias religiões exigia um vetor ecumênico e seus políticos circulavam com a mesma facilidade pelos terreiros, capelas católicas e cultos evangélicos (claro, sem a expressão de hoje).
É importante que todos saibam que o “crivelismo” representa apenas o chaguismo com outra roupa, que nem nova se pode dizer que seja. Que ninguém se engane e que todos se lembrem do atraso produzido pelo chaguismo na administração pública, nas políticas para os mais pobres e na plasticidade com que os recursos públicos eram tratados (que voltam à baila no caso recente das ONGs estaduais).
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