Márcia Silveira – Sozinha: luto e transformações na vida de uma adolescente

Colunista do DIÁRIO DO RIO fala sobre o romance “Sozinha”, escrito por Keka Reis

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Rosa, protagonista do romance “Sozinha”, escrito por Keka Reis, está vivendo intensamente a adolescência. Tem uma boa relação com as amigas e o namorado, porém, em casa, aflora o seu comportamento rebelde. As brigas entre mãe e filha são frequentes e é em um destes episódios de discussão e rebeldia que vem à mente de Rosa o pensamento que irá assombrá-la no futuro: “Acho que minha vida seria muito mais fácil se você morresse de uma vez.” Nesta mesma noite, Julieta, a mãe de Rosa, sofre um aneurisma fatal. Aos quinze anos, Rosa se vê precisando enfrentar sozinha uma das fases mais difíceis da vida.

Professora de História e “feminista raiz”, Julieta trabalhava no colégio onde Rosa estudava e era adorada pelas amigas da filha. Tentava driblar a rebeldia de Rosa conversando e dando conselhos (como, por exemplo, maneiras de se livrar dos abusadores no transporte público), mas não era ouvida. Após a morte de Julieta, além da tristeza, Rosa sente culpa. Se a adolescência costuma ser a fase em que começamos a deixar de nos influenciar pelos pensamentos dos mais velhos, Rosa faz o caminho contrário: começa a se lembrar das falas da mãe e tenta ser a filha que acredita que Julieta gostaria que ela fosse. Pelo mesmo motivo, tenta, a todo custo, ser forte, e muitas vezes é ácida com quem se aproxima – não se permite chorar nem conversar sobre o luto com outras pessoas.

Quem quer sair de um lugar quente e aconchegante para viver em um mundo que tem tiozinhos abusadores? Quem quer viver em um lugar em que as pessoas desaparecem das nossas vidas de uma hora para outra e sem aviso? Eu nunca falei isso para ela. Porque, para a minha mãe, eu sempre fui a garota mais forte do mundo. É justamente o que estou tentando ser agora. Agora que ela foi embora e me deixou sozinha. Sozinha. Sozinha.

Para tornar a situação de Rosa ainda mais complicada, ela precisa se mudar com seu pai para a casa da avó paterna – com quem também tem uma relação conflituosa – e mudar de colégio. Todas estas mudanças, o luto e a tentativa de guardar para si o sofrimento, acabam desencadeando crises de pânico, que ela sente como ondas gigantes que a impedem de respirar.

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Rosa pode despertar sentimentos contraditórios em quem lê “Sozinha”. A rebeldia é, muitas vezes, irritante, mas a indignação é aliviada quando nos lembramos de que ela é apenas uma adolescente tentando lidar com diversas situações complexas e desafiadoras para alguém tão jovem. A autora Keka Reis consegue, com destreza, expressar nas falas e pensamentos de Rosa a voz de uma adolescente que ao mesmo tempo se sente triste, culpada, revoltada e confusa com a reviravolta que ocorre em sua vida. “Sozinha” traz uma protagonista que é obrigada a passar por um intenso e repentino amadurecimento sem poder contar com o amparo daquela que seria sua maior companhia nessa jornada, mas sabendo que o amor entre mãe e filha é eterno.

Keka Reis é escritora, roteirista e dramaturga. Estreou na literatura com “O dia em que a minha vida mudou por causa de um chocolate comprado nas Ilhas Maldivas”, seguido por “O dia em que a minha vida mudou por causa de um pneu furado em Santa Rita do Passa Quatro”, finalistas do Prêmio Jabuti em 2018 e 2019, respectivamente. Em 2021, lançou o romance “Medley ou os dias em que aprendi a voar”. “Sozinha” foi publicado pela editora Gutenberg em 2022.

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Livro: Sozinha
Autora: Keka Reis
Editora: Gutenberg
Páginas: 203

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