Mordomo Carioca: Pulando o muro do jardim

Colunista do DIÁRIO DO RIO fala sobre conexões com pessoas e outras realidades

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Foto: pexels-suhas-hanjar-12573378

Após os meus já cumpridos 8 anos de colaboração e prestações de serviços em SP — entre idas e vindas por meio da frenética e exaustiva ponte área RJ/SP, somados aos períodos mais sossegados dos quase 2 anos em que residi entre o tradicional bairro Morumbi (que eu amo) e Campos do Jordão — cheguei a conclusão que não conhecia absolutamente nada na cidade de SP, além de grandes e elegantes casas, e seus jardins encantadores. E nasceu um desejo orgânico, eminente e necessário de começar a “desvendar” mais dos outros cenários que também, compõem a beleza peculiar desta cidade encantadora que “does not sleep”… e que me assusta a medida que também me fascina… 

Então resolvi “pular os muros do jardim” e aventurar-me na noite paulistana. Obviamente que contei com um suporte humano técnico do meu Amigo especializado em cultura pop, por pura vocação, que foi fundamental para a realização do meu projeto de aventura — um homem chinês, nômade que muda de pais ou estado a cada 2 meses aproximadamente; inteligentíssimo, usuário de toda classe de apps; famoso nos 4 cantos do mundo pop; educado; engenheiro de formação; 57 anos muito bem vividos; fluente em outros idiomas; fascinado pelo comportamento humano e pela vida urbana; ligado nos 220v; easygoing e cool; bem conectado; fluido; com uma bússola interna — que organizou os roteiros do final de semana.

Para fazer uma imersão na cultura pop, e mudar totalmente o meu contexto  morumbiano, que eu realmente amo… aluguei um imóvel (naquele famoso app de imóveis de temporada)no boêmio bairro chamado Santa Cecília ao lado da estação de metrô, e próximo uma charmosa e bem aprovisionada padoca — aquele lugar em SP que você pode tomar um reforçado breakfast, almoçar e jantar com qualidade; ou degustar uma pizza deliciosa assada na pedra — que deixaria a Alice com “água na boca” no seu país das “maravilhas”…

Combinamos que permaneceríamos entre 30 e 60 minutos em cada local; também faríamos todo o trajeto a pé entre os pontos; e que usaríamos metro para iniciar a jornada. Aahhh! Começamos por volta das 20h para desbravarmos a maior quantidade de lugares possíveis, até as 6h da manhã, finalizando com o café na padoca.

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Ou seja, foi imersão com várias estreias acontecendo ao mesmo tempo para viver a experiência completa. Adrenalina nas alturas!

Também preparei um look básico preto quase one block: jaqueta de couro (feita sob medida por um conhecido estilista de couro de Campos do Jordão); sweater de cashmere sem mangas; cachecol de lã e sapatos de couro; óculos escuros minimalista tipo “fenda” para disfarçar as possíveis olheiras ao amanhecer.

Está tudo perfeito, favorável, para a minha primeira aventura na night paulistana, um verdadeiro céu de brigadeiro14C de temperatura com sensação térmica de 7C; sem a mínima previsão de chuva e um céu lindamente “cravejado” de estrelas.

Só tenho que agradecer a DEUS por ter enviado um tal Ciclone Extratropical que mandou um frio de origem polar para coroar a nossa noite, já que sou amante das baixas temperaturas. Será um desafio manter-se aquecido durante a noite — sem os meus cafés espressos — apenas com isotônicos, Schweppes Cítrus e minerais com gás, já que não apreciador de bebidas alcoólicas… entre outras coisas…

UMA CENA DE FELLINI OU ALMODÓVAR? 

De repente fui auspiciosamente surpreendido por uma cena inesquecível… um homem longilíneo, nos auge dos seus 40 anos, caminhando com muita postura e segurança pelo meio fio da rua no sentido contrário do trânsito, com o seu “figurino baphonyko” de quem valoriza a noite e que sabe que o ser humano nasceu para brilhar — ele vestia uma calça de couro preta de modelagem básica; um acessório (poderia ser um cinto ou uma bijoux customizada) composto de várias delicadas correntes prateadas que caiam assimetricamente em um movimento de “cascata” pela lateral da sua longa perna esquerda; um coque despretensioso bem posicionado no topo da cabeça preso, e finalizado apenas com a sua própria madeixa loira de aspecto ultra bem cuidado… aquele padrão “Galisteu”; calçava uma bota de couro preta e de cano curto com solado tratorado; para fechar o look levava muito bem posto um hipnotizante max casaco de pele nos tons terrosos entre caramelos e beges, com volume irregular e várias alturas de pele (parecia que ele estava abraçado por sua própria nuvem pessoal), que aumentava ainda mais a sua imponência, chegava até a cintura e tinha uma envergadura de o ombros bem ampla, criando um efeito visual de silhueta de ampulheta — e iluminado naturalmente pelos faróis dos automóveis da av. Augusta que contribuíram para desenhar esta cena cinematográfica de Fellini que vos descrevo aqui.

Você deve estar se perguntando por que eu não dei um cliquei com o meu celular para captar o momento, mas a resposta é bem simples: – eu não queria perder nenhum segundo daquela poderosa e deslumbrante fotografia viva que estava se desenvolvendo logo ali há poucos metros, bem diante dos meus olhos… eu fiquei paralisado por alguns segundos percebendo e apreciando aquele desfile de empoderamento da vida (é a primeira vez que uso esta palavra nos meus textos, e em excelente hora!) e classe. Preferi registrar e absorver na mente cada instante… e agora, estou eu aqui, “tentando” compartilhar este acontecimento com Vocês… 

A minha sensação depois deste episódio é que realmente o meu vestuário é muito básico, e que precisaria urgentemente de um up grade para as próximas “aventuras”. Já estou trabalhando neste tema…

Eu vi muitas pessoas com looks bem produzidos e adequados para noite, muitas referências de moda, mas sobretudo com estilo, que é o que define a imagem e identidade pessoal.

HÁ DIFERENTES TIPOS DE “PRAIS”

Pude observar que a mesma informalidade e valorização que nós cariocas temos em relação a praia (mar), os paulistanos também têm pela noite. Realmente a noite paulistana é uma verdadeira estrela que brilha 7 noites por semana

Então eu ousaria de forma lúdica, fazer a seguinte reflexão: uma das “praia” do paulistano é a noite mas com muitas camadas de roupas, iluminada e aquecida pelo brilho da luz da lua. Todos socializam, bebem juntos, celebram, são felizes e no final do “rolê” se despedem e dizem “nos encontrarmos aqui novamente amanhã”… não trocam cartões nem sobrenomes, sem menção aos seus locais de residência, quase não há intimidade e sem confidências. E logo inicia-se a nova semana e todos se ocupam das suas milhares de tarefas e responsabilidades, e talvez voltem a se “esbarrarem” em algum “point” na próxima noite. Bem parecido com o nosso comportamento informal e “carioca de ser” que habitualmente dizemos assim: 

“- … Nos encontrarmos no posto 8, amanhã neste mesmo horário, se fizer sol”.

O MEU SENTIMENTO DE GRATIDÃO SOBRE UMA EXPERIÊNCIA “TÃO SIMPLES” ASSIM

“Manter-se no apenas no jardim (que apesar de ser lindo…) sem pular o muro”, muitas vezes pode aprisionar e limitar a visão do que está bem “ali do outro lado”. Então sair da zona de conforto é libertador e pode permitir que as novas oportunidades surjam, e proporcionem experiências enriquecedoras. Cada vez mais reforça em mim a certeza que a vida tem milhões de nuances, que somos feitos de um pouco de cada uma delas, e de um pouco de todas as “coisas”. Então, quanto mais misturamos mundos, culturas e realidades nos conectamos com a humanidade que existe no próximo, e que também está em nós. Nossa percepção pode mudar se observarmos atentamente com os “olhos do coração” bem abertos. 

A noite, até pode ser um lugar ideal para um grande exercício de abstração, mas também pode ser o  lugar do teu encontro contigo mesmo. Quem sabe o que cada indivíduo procura, ou foge nas suas noites?!? Sem dúvida foi libertadora a minha primeira experiência… desejo “pular muitos outros muros” daqui para frente. 

Tive 2 noites absolutamente enriquecedoras, encantadoras e inusitadas. Foram quase 46 horas sem dormir, com “pit stop” de apenas 2 horas para uma cochilo antes de retornar para o Morumbi no domingo, para tomar o café da manhã com a Família que eu amo, e que “adotou-me” em São Paulo.

E finalizo citando … cantarolando é bem desafinado que sou… um fragmento do que o nosso admirado cantor Lulu Santos diz na sua icônica canção Tempos Modernos: …”Hoje o tempo voa, amor… Escorre pelas mãos… Mesmo sem se sentir… Não há tempo que volte, amor… Vamos viver tudo que há pra viver… Vamos nos permitir”.

É sobre conectar-se com pessoas e outras realidades e viver este milagre que é a vida… simples assim… é sobre!

Aos meus Selectos Leitores,

Deixo o meu abraço cordial,

O teu Mordomo Carioca,

Ruan Schayder 

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