O bonde de Santa Tereza e a fusão do Rio

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Sonia Rabello é doutora em Direito Público e pós-doutora pela Universidade de Paris II. Professora de Direito Administrativo na Uerj. Vereadora na Câmara Municipal do Rio de Janeiro e líder do PV. contato@soniarabello.com.br

Sonia Rabello

A tragédia com os bondes de Santa Tereza, no Rio, remete-nos aos problemas de conservação não só de serviços públicos urbanos, como também de bens do patrimônio cultural do Estado.

Mas se os bondes devem ser preservados como patrimônio cultural do Estado, seria este também responsável pela fiscalização, controle e funcionamento deste serviço público?

Por que o Estado seria responsável por este transporte coletivo urbano se, pela Constituição Federal de 1988, art.30, inciso V, cabe ao Município a responsabilidade de “prover o transporte público municipal”?

A resposta a esta pergunta nos remete à fusão do Estado do Rio com o Estado da Guanabara, com a criação, então, do Município do Rio de Janeiro, em 1974; uma fusão ainda muito mal resolvida, em termos institucionais para o Município do Rio de Janeiro. E isto acaba se refletir nos bondes de Santa Tereza. Senão vejamos.

Quando em 1974, em plena ditadura militar, foi criado o novo Estado e o Município do Rio de Janeiro, tudo“patrimônio, bens, rendas, bem como direitos, e obrigações de ordem interna e internacional, encargos e prerrogativas” dos então Estado do Rio de Janeiro, e do Estado da Guanabara (hoje Cidade do Rio) foram “transferidos ao novo Estado” (art.12 §1º da Lei Complementar nº20/74). A Cidade ficou à míngua, e ao arbítrio único e exclusivo da vontade do Governador interventor que, por determinação desta mesma lei, governava por decreto-lei a Cidade, até a criação de sua Câmara de Vereadores, nomeando, inclusive o seu Prefeito. A Cidade teve então que se recriar, institucionalmente, a partir do zero; ou melhor, do menos zero, já que uma imensa parte do seu patrimônio foi arrecadado, por decreto-lei pelo Estado. Nisso se incluiu o bonde de Santa Tereza, e também o Metrô do Rio.

Porém, isto tudo aconteceu na vigência da Constituição de 1967, onde os Municípios não tinham o status de entes federativos, e quando suas competências eram circunscritas pelas Constituições Estaduais. Tudo mudou com a Constituição de 1988. Por ela os Municípios são entes da Federação, e sua competência, independente, deriva diretamente do seu texto constitucional.

Mas, se o Município do Rio, pelo art.30 da CF de 1988 tem competência e, por consequência, a responsabilidade pelo transporte coletivo municipal, por que os bondes não estariam sob a regulação e fiscalização do Município?

A resposta só poderia ser pelo fato de que, no Município do Rio ainda não tomamos, plenamente, o domínio de nossas competências e bens. Por isso, o Teatro Municipal ainda é estadual, assim como a rodoviária do Município; é tido como estadual o Metrô que circula exclusivamente no âmbito do seu território, bem como os terrenos e bens que pertenciam à Cidade, quando ainda era Distrito Federal. E por aí vai, numa longa lista.

E agora? Agora, cabe ao Município seguir na reconquista plena de suas competências constitucionais sobre os serviços públicos que se circunscrevem ao âmbito do seu território. Neles se incluem, obviamente, os bondinhos de Santa Tereza e, por que não, o Metrô também.

Quem sabe, os seus serviços melhoram?

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