Na sua coluna do UOL no último sábado, Julián Fuks profetizou que a crônica está morrendo como um gênero literário no Brasil. Em tom melancólico, o escritor e crítico literário argumenta que “a crônica já não resiste à velocidade, aos imperativos da produtividade, seja no trabalho, na diversão ou no vício. A crônica não sabe existir neste mundo alucinado…” Ele pode ter razão: o gênero folhetinesco e tipicamente brasileiro foi perdendo força, mas ainda resiste.
Exemplo dessa resistência é o livro “Os óculos do poeta e outras crônicas de circunstância”, produzido pela Kotter Editorial. A coletânea de 50 crônicas(35 já publicadas em jornais e revistas e 15 inéditas) marca a estreia na literatura do dentista e professor universitário Luciano Alberto de Castro. No seu debut, o escritor transita por temas diversos: da crônica lírica existencial aos temas políticos; da crônica urbana às personalidades históricas, da música e da literatura. O lançamento acontecerá no dia 10/08, em Goiânia, onde reside o autor.
Endossado por um prefácio de Solange Fiúza — Professora titular da Faculdade de Letras da Universidade Federal de Goiás e estudiosa da literatura brasileira — o livro de Luciano desperta interesse também pelo bem cuidado design gráfico da capa e pela caprichada editoração. No texto de orelha, a jornalista e escritora paulista Adília Belloti qualifica o autor como um “cronista genial, que alia o olhar agudo e perceptivo ao “sentimento do mundo”, numa clara referência a Carlos Drummond de Andrade. As opiniões de Fiúza e Belloti são, sem dúvida, um convite à leitura.
A editora Kotter, com sede em Curitiba e filiais em São Paulo e Lisboa, está no mercado editorial há quase 10 anos. A empresa investe em novos escritores, porém autores veteranos como Franklin Martins e Luis Cosme Pinto publicaram seus livros pelo selo paranaense. Em 2022, a Kotter abiscoitou dois prêmios literários importantes: o Prêmio Machado de Assis com “Siameses” de Antônio Geraldo Figueiredo Pereira e o Prêmio Catarinense de Literatura com “Clarice Lispector ou a flutuação do instante” de Jayro Schmidt.
Apesar de editado no Paraná e assinado por autor mineiro radicado em Goiás, “Os óculos do poeta” tem um pé (ou os dois pés) no Rio de Janeiro; uma vez que várias crônicas foram ambientadas aqui na cidade. A começar pela que dá nome ao livro e que discorre sobre a saga dos furtos à estátua de Drummond em Copacabana. Além dessa, “Barão da Torre, 42” e “Tiradentes na praia do Leblon” são referências explícitas à paisagem carioca. “Minha afinidade com o Rio, e por extensão com o samba e a Portela, é espiritual…” declarou o autor na crônica “Samba em desalinho”, escrita após o falecimento de Monarco e já publicada no Diário do Rio.
Julián Fuks está certo: a crônica não tem a mesma popularidade de outros tempos. Depois dos icônicos cronistas cariocas dos anos 60 e 70, poucos escribas contemporâneos (entre os quais me incluo) se dedicam ao gênero. Xico Sá, Antônio Prata, Marcelo Moutinho e Luís Henrique Pellanda são alguns nomes de destaque atualmente. Seria o mineiro-goiano Luciano Alberto de Castro um novo talento no cenário cronístico nacional? A conferir, vendo o que nos mostra esses distorcidos óculos de poeta.
O livro pode ser comprado no site da editora Kotter neste link: https://kotter.com.br/loja/os-oculos-do-poeta-e-outras-cronicas-de-circunstancia-luciano-alberto-de-castro/
