Parece piada, mas é Lei – o agravante do crime ambiental aos domingos

Para Nathalia Alvitos, quando o assunto é sacanagem, a humanidade é de vanguarda.

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Foto de cottonbro studio/Pexels

Que os animais são muito mais agradáveis para se conviver do que os seres humanos, não é novidade. Sabendo que a humanidade não vale o investimento da confiança, as Leis foram construídas. Os Códigos, sejam penais ou civis ou qualquer outra coisa, são uma tentativa de fazer com que as pessoas não tenham a liberdade de mandar as outras se danarem das maneiras mais variadas possíveis e saírem sem consequências. No entanto, como somos racionais e criativos, esses livros têm que ser constantemente atualizados. Afinal, quando o assunto é sacanagem, a humanidade é de vanguarda.

Hamurábi sacou a falta de controle de qualidade inerente ao ser humano já no século XVIII antes de Cristo. Como resultado da observação, fabricou o famoso Código de Hamurábi, um dos primeiros conjuntos de leis elaborado a partir da ideia de que a retaliação deveria sempre ser proporcional ao crime cometido. Seguindo essa lógica, o Rei da Babilônia se intitulou como o Rei da Justiça e determinou, por exemplo, que se um arquiteto fizesse uma casa que caísse, ferindo o dono, o arquiteto deveria ser morto. Interessante observar que o Brasil de 2018 tenha sido um déjà vu de tantos séculos, porque o que brotou de gente tentando determinar quem vive e quem morre foi cansativo.

Discussões infindáveis surgem se formos tentar desdobrar essa História maravilhosa que é a tentativa de tornar o ser humano controlável. Porém, eu pensava que esse tema só era discutido em torno da adequação das consequências, da intensidade do crime, da vulnerabilidade da vítima e outros detalhes que de forma inegável interferem no ato criminoso. Mas, para alimentar minha já débil sanidade, surge o legislador brasileiro. E, desta vez, ele age num artigo de uma norma ainda vigente que determina os agravantes.

Estou citando uma lei que versa sobre Crimes Ambientais. Como falei lá no início, sou uma defensora dos animais, já que reconheço a superioridade deles. Também defendo as florestas porque valha-me Deus acabar com o pouco que restou em nome do avanço de uma civilização tosca. Portanto, se houver algum pedido de manifestação para apoiar esse tipo de norma para trancafiar desalmados que maltratam quem não tem chance de defesa, contem comigo. Só que lendo essa Lei, me deparei com um agravante interessante. Lá no meio de um monte de letras miúdas está escrito que uma das circunstâncias que agravam o crime é o fato dele ter sido cometido em um domingo ou em um feriado. Não entendi. O som do grilo numa noite calma se estabeleceu por alguns dias na minha cabeça. Como gosto de um agito, estou escrevendo para tentar fechar esse silêncio torturante.

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Cortar uma árvore… não, vou piorar: cortar muitas árvores numa área de preservação ambiental permanente, tirando a casinha de várias aves à beira da extinção, matando seus filhotinhos indefesos no ninho enquanto a mamãe ave chora assistindo a queda de seus herdeiros, e em seguida colocar fogo, provocando uma matança da fauna e da flora, além de um empobrecimento do solo que nunca mais será verde, é pior aos domingos? Ainda não consigo responder.

Li que uma justificativa para essa peculiaridade da Lei é a escala de folga dos fiscais, então, o ser humano precisa ver outro ser humano uniformizado para não cortar árvores, aprisionar ou matar um animal? Gente! Mais gente nas florestas, por favor! Vamos ignorar que há tecnologia, satélite e drones, vamos valorizar a patrulha e a sua folga merecida. Vamos desencorajar os crimes cometidos no sétimo dia, porque até o Criador descansou nesse dia! Não é admissível uma afronta dessa categoria! Precisamos de mais gente! Tô agitada, preocupada! Tenho que parar para ver se aquela queimada criminosa que deixou vários bichinhos sem lar foi feita num dia de descanso, porque se foi, aaah! Vou escrever uma bela carta para ajudar o STF a aumentar a pena desses cretinos que ousam agir na folga da patrulha!

Este é um artigo de Opinião e não reflete, necessariamente, a opinião do DIÁRIO DO RIO.

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