A mortalidade materna fluminense praticamente dobrou, no comparativo da mortalidade materna (RMM) de 2018 com a do biênio 2020/2021, período da crise sanitária internacional. Os dados são da pesquisa “Desigualdades nos Indicadores de Saúde da Mulher e da Criança no Estado do Rio de Janeiro”, coordenada pela doutora em saúde pública Sandra Fonseca, da Universidade Federal Fluminense (UFF).
Segundo a sondagem, em 2018, foram registrados 61,7 óbitos para cada 100 mil nascidos vivos. No período pandêmico, esse número subiu para mais de 130 óbitos por 100 mil nascidos vivos. As mães pretas, ainda segundo o estudo, foram as que apresentaram RMM de 220 no biênio 2020/2021. Pela metodologia da pesquisa, a mortalidade materna diz respeito a todo o período gestacional, do momento do parto até o puerpério, que engloba os 42 dias após o parto, e engloba os abortos sofridos pelas mulheres.
No artigo “Tendência da Mortalidade Materna no Estado do Rio de Janeiro”, que acompanhou o período de 2006 a 2018 e foi publicado em 2022, foram registrados aproximadamente 60 a 70 óbitos de mulheres para cada 100 mil nascidos vivos. Na ocasião, os indicadores mostravam uma queda “lenta” na mortalidade materna, segundo pesquisadora da UFF, que disse à Agência Brasil que o objetivo brasileiro é reduzir a mortalidade materna para pelo menos 30 por 100 mil, em 2030. Mas os números fluminenses continuam altos. Entre 2006 e 2018, a mortalidade materna variou de 76,6 óbitos para cada 100 mil nascidos vivos (2006) e para 61,7 em 100 mil nascidos vivos (2018).
“Na velocidade que vinha caindo, a gente não chegaria a 2030 com esse valor (30 por 100 mil). A ideia da Organização Mundial da Saúde (OMS) era que melhorasse a saúde da mulher e da criança para vários indicadores até 2030 e depois reavaliar as metas. Para piorar esse cenário, ocorreu a pandemia e a covid-19 comprometeu de forma mais grave idosos e também gestantes”, disse Sandra Fonseca ao veículo, destacando que em todos os estudos realizados, a hipertensão arterial foi a causa principal das mortes das mães, excetuando no biênio 2020 e 2021, em que a covid-19 foi a maior causa, inclusive as mulheres pretas.
“Isso não melhorou durante a pandemia. Todo mundo aumentou. Mulheres brancas também morreram mais, bem como as pardas, mas as mulheres pretas morreram mais ainda. Elas continuaram com indicador lá em cima. Chegou a 226 mortes por 100 mil. Isso é muito elevado”, destacou a médica, acrescentando que ao analisar apenas os óbitos de mães brancas, a média ficou em 140 por 100 mil nascidos vivos.
À Agência Brasil, a médica e pesquisadora destacou a importância da realização do pré-natal qualificado, além de parto e puerpério adequados, especialmente para as mães pretas.
“No estado do Rio de Janeiro, se a gente comparar mulheres brancas, pardas e pretas, as mulheres pretas fazem menos consultas. O ideal é fazer, pelo menos, sete consultas ou mais durante o pré-natal”, observou a coordenadora do estudo, segundo o qual 80% das mulheres brancas conseguem fazer sete ou mais consultas. Para as mulheres pretas e pardas, o número de consultas não chega a 70%.
“É uma desigualdade. Se elas não estão conseguindo fazer um número adequado de consultas, isso já vai deixando elas sob um risco maior. Porque é durante o pré-natal que você identifica algumas doenças, como hipertensão, e pode tratar. Se você não tem o acesso e o acompanhamento pré-natal, corre maior risco”, explicou a médica, que tem identificado tais desigualdades no atendimento pré-natal fluminense ao longo do tempo.
No primeiro artigo da pesquisa, referente à Baixada Litorânea ou Região dos Lagos, também foi identificada uma baixa adesão ao pré-natal. “Está melhorando ao longo dos anos, mas devagar, e essa desigualdade estava lá: as mulheres pretas fazem menos consultas (no pré-natal)”.
A reversão de tal qual quadro, de acordo com Sandra Fonseca, especialmente no recorte da desigualdade racial está no fortalecimento do atendimento no Sistema Único de Saúde (SUS).
“A gente precisa aumentar o investimento em saúde, ter equipes capacitadas para o pré-natal, usar estratégias de saúde para que a mulher realmente tenha o acesso e o número de consultas adequado. E que ela consiga realizar os exames necessários para garantir que o pré-natal identifique os riscos e trate o que aparecer; se ela tiver uma hipertensão, uma infecção, que o pré-natal já possa fazer essa intervenção”, ressaltou a estudiosa.
No momento, os pesquisadores da UFF realizam estudos na Baixada Fluminense e na Região Metropolitana fluminense em relação ao pré-natal. Ao dados também têm validado a tendência geral relacionada às desigualdades raciais. Em novembro, os resultados preliminares da pesquisa serão apresentados no Congresso de Epidemiologia.
Para realizar a pesquisa, os estudiosos da Universidade Federal Fluminense usaram os dados do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) e do Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (SINASC), ambos do Ministério da Saúde (MIS).
Com informações da Agência Brasil.