Tramita na Câmara Municipal do Rio de Janeiro um projeto de lei que, motivado por tentar resolver problemas com imóveis preservados na cidade pode constituir uma carta branca urbanística, com significativos impactos em alguns bairros da Cidade. É o PLC 136, que “estabelece condições especiais de incentivo para reconversão de imóveis protegidos (…)”.
Alguns fatos merecem ser divulgados para que se registre como mudanças culturais são difíceis de serem implantadas, especialmente no comportamento dos dirigentes políticos, independentemente de suas correntes políticas, seus discursos, sua simpatia ou antipatia.
O PLC nº 136, assim como a aprovada Lei do Reviver Centro, ou a famigerada Lei dos “Puxadinhos”, todos são projetos de lei que alteram as regras urbanísticas da Cidade e que guardam uma característica comum: nenhum deles foi submetido a audiências públicas em seu processo de elaboração.
E mais, a lei do Reviver Centro e a dos “Puxadinhos” não foram nem sujeitas – em seus textos consolidados e em seus estudos técnicos – ao prévio debate e à oitiva do Conselho de Política Urbana do Município (COMPUR). Já o PLC nº 136, este foi apresentado no COMPUR, preliminarmente, na reunião de agosto de 2009. Nesta reunião, foi deliberado que haveria mais duas reuniões para ajustar dúvidas sobre o texto*. Mas, em 6 de outubro de 2009, o então prefeito Marcelo Crivella atropelou a deliberação do referido Conselho e mandou o projeto para a Câmara de Vereadores. É este projeto do Crivella que é usado agora, pelo prefeito Paes, através de um substitutivo reencaminhado à Câmara em 15 de junho; o atual prefeito aproveitou o mal comportamento de seu antecessor, a quem tanto critica, para coonestar com a falta de audiências públicas e oitiva ao COMPUR.
A falta de estudos técnicos, a falta de oitiva ao COMPUR e a ausência de audiências públicas têm sido a base de inúmeras decisões de inconstitucionalidade de leis urbanísticas nos Tribunais brasileiros. A última decisão, neste sentido no âmbito da Cidade do Rio foi a própria lei dos “Puxadinhos” que, por liminar, foi suspensa por não cumprir com estes pré-requisitos no processo de elaboração, antes de ser enviada à Câmara.
Suspensas pelo Judiciário, estas leis trazem uma enorme instabilidade à pretendida segurança jurídica no urbanismo da Cidade, segurança esta tão proclamada nos discursos de desenvolvimento econômico da Cidade.
A segunda perplexidade que é trazida, tanto pela Lei do Reviver Centro, quanto pelo “aproveitado” PLC 136, é o fato de se insistir em tramitar ambos os projetos antes de se finalizar o processo de revisão do novo Plano Diretor da Cidade! Ora, o novo Plano Diretor (PD), cujo texto preliminar foi publicado no último dia 27 de julho, para ser legítimo e válido ainda deverá ser objeto de ampla discussão com a sociedade, antes de ser enviado à Câmara de Vereadores. Portanto, este novo Plano Diretor poderá mudar instrumentos e propostas que são tratados tanto pela Lei do Reviver Centro, como pelo PLC 136! Ou não? E aí, como ficaria a estabilidade dos projetos privados que começaram a ser desenvolvidos com base nestas normas?
A nova gestão da cidade é mais confiante em sua habilidade político-discursiva do que a que a antecedeu. Mas é bom atentar que os tempos são outros: menos eufóricos, e com uma população mais consciente de seus direitos políticos para além do voto, e instituições mais vigilantes.
Sim, é difícil a mudança na cultura do comportamento político. Mas, tudo se aprende, um dia…