O bacalhau do Rancho, o prato assinatura da casa (com bacalhau frito no azeite, brócolis, azeitonas, pimentão e batatas coradas), já estava pela metade no meu prato, quando o Aragão (mâitre d’hôtel lendário, anos e anos de Antiquarius) se aproxima com uma molheira nas mãos: “O senhor aceita um pouco de azeite quente sobre o seu peixe?”. Sim, por favor. Afinal, o óleo reidrata as belas lascas que já se esparramavam sobre a porcelana.
Estou no Rancho Português, casa que nasceu como parada na rodovia Castelo Branco, em São Paulo, para chegar na capital paulista, numa casa imponente, com salões elegantes. No finalzinho de 2014, aterrou no Rio, num imóvel menor e mais charmoso, onde funcionou o Lagoa Charlie, bar cheio de histórias nos anos 1970 e 1980.
A receita até hoje é a mesma da matriz: comida clássica portuguesa feita com primor, ambiente sofisticado com ares portugas e serviço primoroso, a exemplo do cuidado que o Aragão teve comigo e com a minha companhia. Além de uma carta primorosa de vinhos portugueses, separados por região.
Depois de pedir água (que é servida durante toda a refeição, sem que o freguês se preocupe em pedir) e o obrigatório bolinho de bacalhau (leve como poucos), comecei a noite pelo vinho. Afinal, ele seria a minha referência para mergulhar num cardápio robusto, que passeia por todas as regiões da Terrinha. Pincei o Cortes de Cima 2017, um blend fantástico com cinco uvas autóctones (locais) e outras de origem francesa. E lá veio o Jorge, o sommelier (sujeito extrovertido, de fala mansa), com a garrafa nas mãos e um sorrisão no rosto: “Meu Deus, como eu adoro esse vinho”. Então, abriu, provou, revirando os olhos como se confirmasse o que dissera pouco antes. Fica a dica de um belo tinto.
O caminho, enfim, estava aberto para mergulhar na farra do bacalhau: são 7 entradas e 17 (!) pratos para compartilhar. Tem de tudo: a brás, ao lagareiro, Gomes de Sá, Narciso, Zé do Pipo… Em Portugal diz-se que há uma receita para cada dia do ano. A minha escolha você já sabe qual foi, mas, antes dela, lá fui eu com as minhas subversões. Pedi ao Aragão uma pequena porção de arroz de pato (no menu ele é prato principal, servido para duas pessoas), como entrada.
Há dois motivos para isso: primeiro, o Cortes de Cima 2017, com corpo e cheio de boca, pedia algo caldoso, que igualmente enchesse o paladar. Depois, porque o arroz de pato daqui é um dos pratos que mais gosto entre tantos no Rio, pedida inevitável quando venho ao Rancho. Isto porque ele feito à francesinha, com caldo rico, sem faltar nem sobrar, coberto com pequenas rodelas de paio defumado. Tão bom quanto esse só no Fialho, também um dos meus portugueses favoritos. O “probleminha” e que ele está em Évora, no Alentejo, a mais de sete mil quilômetros daqui.
Vai na minha que você vai na boa.
Serviço
Rancho Português –Rua Maria Quitéria 136, Ipanema
Tel.: (21) 2287-0335
De segunda à sábado, das 12h às 23h. Domingo, das 12h às 20h.