Para matar a saudade do Carnaval e manter a esperança viva, vamos relembrar desfiles históricos das 12 escolas do Grupo Especial, que impactaram a Marquês de Sapucaí.
Paraíso do Tuiuti – “Meu Deus, meu Deus, está extinta a escravidão?”
Quem não lembra do refrão do samba enredo:
“Meu Deus! Meu Deus!
Se eu chorar, não leve a mal
Pela luz do candeeiro
Liberte o cativeiro social”
Em 2018, o Paraíso do Tuiuti fazia o seu segundo desfile no Grupo Especial e surpreendeu ao levar para avenida uma crítica social emocionante que lhe garantiu o vice-campeonato, a melhor colocação da agremiação entre as grandes. A escola de São Cristóvão gerou comoção em todo país ao recontar a história da escravidão no Brasil e fazer crítica ao racismo e às dificuldades dos trabalhadores brasileiros nos tempos autuais. O carnavalesco Jack Vasconcelos, responsável pelo enredo, também levou para avenida um ala em que os operários seguravam uma carteira de trabalho como escudo em tom crítico à reforma trabalhista. Fechando o desfile a escola levava em seu último carro alegórico o inesquecível “Presidente Vampiro”, que representava o presidente, à época, Michel Temer.
Acadêmicos do Grande Rio – “No mundo da lua”
O ano era 1993 e a Grande Rio retornava ao Grupo Especial e levava para avenida um dos melhores sambas daquele ano.
“Ô luar, ô luar (ô luar)
Vem pratear a nossa rua (bis)
A semente da fartura semear
Virar o mundo de bumbum pra lua”
Criado pelo carnavalesco Alexandre Louzada, o enredo falava das lendas, das expressões e dos mitos da Lua. A escola de Caxias mostrou em seu desfile questões astrológicas como a relação da lua com a magia e até as bases da nossa cultura, quando os tupis-guaranis cultuavam Jaci, foram retratados na avenida. A lua enquanto musa dos românticos foi outro aspecto apresentado pela Grande Rio. Mas a escola também teve referência política, a representação dos “lunáticos” foi inspirada no escândalo político que derrubou o presidente Fernando Collor.
Unidos do Viradouro – “E A Magia da Sorte Chegou.”
Era início da década de 90 e a Viradouro começava a despontar no Grupo Especial. Mesmo sem ser conhecida pelo grande público, a vermelho e branco literalmente encantava a Sapucaí, que cantava seu samba.
“O Sol brilhará,
Surge a estrela guia
E sobre a proteção da Lua (bis)
Canta Viradouro
Que a sorte é sua”
Max Lopes era o carnavalesco da escola em 1992, que tinha como enredo a história dos ciganos e pretendia fazer uma verdadeira festa cigana na Avenida. O desfile emblemático, em que a escola ao final era aclamada como campeã, foi comprometido por um incêndio em sua quinta alegoria. O carro da Sibéria era composto por cachorros da raça huskys siberianos, uma das alegorias mais bonitas que a escola levava para avenida e a preferida do carnavalesco da vermelho e branco de Niterói. Devido ao acidente, a agremiação perdeu 13 pontos na apuração, o que lhe rendeu o 9º lugar na colocação geral. Além de um marco para a escola, foi a partir deste momento, que as demais agremiações passaram a adotar procedimentos rigorosos de segurança contra incêndio.
Unidos da Tijuca – É segredo
No ano de 2010 a Unidos da Tijuca parou a Sapucaí com o enredo “É Segredo”.
“É segredo, não conto a ninguém
Sou Tijuca, vou além
O seu olhar, vou iludir
A tentação é descobrir”
Elaborado pelo carnavalesco Paulo Barros, “É Segredo” levou a Tijuca ao campeonato naquele ano, após 74 anos sem títulos no Grupo Especial. O enredo contou a história dos mistérios da humanidade e levou vários segredos e efeitos especiais para a avenida. Um desses segredos era o da comissão de frente, que impactou a Sapucaí ao fazer um truque em que os componentes trocavam de figuro em pouquíssimos segundos usando técnicas de ilusionismo. O segredo das minas do Rei Salomão, do cavalo de Tróia e o desaparecimento da Arca Sagrada que, guardava os dez mandamentos também foram levados à avenida pela agremiação.
Estação Primeira de Mangueira – “100 anos de liberdade – realidade ou ilusão?”
O ano de 1988 foi marcado pela nova constituição, após o termino da ditadura militar e pelo centenário da abolição da escravidão. É neste cenário, que a Mangueira questiona, na voz de Jamelão, a suposta liberdade dos negros brasileiros.
“SENHOR… (ah senhor!)
Veja a luta do bem contra o Mal
que tanto sangue derramou
contra o preconceito racial
O Negro samba
o negro joga capoeira
ele é o Rei da Verde e Rosa da Mangueira”
A tarefa de abordar a temática da abolição da escravidão coube ao carnavalesco Júlio Matos. Em linha critica a Mangueira levou para avenida “100 anos de liberdade – realidade ou ilusão?”, enredo que convidava a reflexão em meio a comemoração do marco histórico do 13 de maio: seria realidade ou mera ilusão? A verde e rosa foi além do óbvio e fez um desfile voltado para a abordagem do racismo na sociedade brasileira. O sincretismo religioso, a que os negros foram submetidos para poderem cultuar os Orixás, foi outro destaque do emocionante. Mesmo sendo reconhecido como um dos desfiles mais marcantes de 1988, a Mangueira obteve a 2º colocação no carnaval carioca.
Mocidade Independente de Padre Miguel – “Vira virou, a Mocidade chegou”
Em um desfile inovador para época, a Mocidade entra na avenida em 1990 cantando o inesquecível samba:
“Ah vira virou, vira virou
A Mocidade chegou, chegou
Virando nas viradas dessa vida
Um elo, uma canção de amor, olha vira virou, virou”
O enredo dos carnavalescos Renato Lage e Lílian Rabello marca o início de grandes vitórias para verde e branco de Padre Miguel. Naquele ano, a agremiação conquistou a primeira colocação contando sua própria história, nascida em 1955 de um time de futebol (Independente Futebol Clube). O abre-alas da escola impressionou pelo estilo abre-alas high tech e ainda levava a estrela, símbolo da Mocidade, em prateado e cercada por néon e luzes verdes. Ao final do desfile, a escola prestou homenagem a personalidades importante da sua trajetória, como Mestre André, os carnavalescos Arlindo Rodrigues e Fernando Pinto, e o intérprete Ney Vianna.
Acadêmicos do Salgueiro – “Tambor”
Quando o Salgueiro entrou na avenida em 2009, como diz a letra do samba, arrepiou:
“Vem no tambor da Academia
Que a Furiosa bateria vai te arrepiar!
Repique, tamborim, surdo, caixa e pandeiro
Salve o Mestre do Salgueiro”
O enredo desenvolvido pelo carnavalesco Renato Lage partiu de dentro da bateria. O tambor, instrumento musical conhecido e venerado no mundo do samba, levou para vermelho e branco do Andaraí o título do carnaval de 2009. Aspectos místicos e religiosos do instrumento foram contados no desfile. Ritmos brasileiros como maracatu, forró e xaxado também fizeram parte do tambor salgueirense. Em homenagem carregada de emoção, a última alegoria da agremiação reverenciava os mestres de bateria das escolas de samba, em especial Mestre Louro, que havia falecido no ano anterior.
Beija-flor de Nilópolis – “Ratos e Urubus, larguem a minha fantasia”
Impossivel falar da Beija-flor e não mencionar o desfile revolucionário de 1989 de samba vibrante:
“Firme… Belo perfil!
Alegria e manifestação
Eis a Beija-flor tão linda
Derramando na avenida
Frutos de uma imaginação
Leba – laro – ô ô ô ô
Ebó lebará – laiá – laiá – ô
Reluziu”
O saudoso e emblemático carnavalesco Joãozinho Trinta fez história com a Beija-flor e o com aclamado enredo “Ratos e Urubus, larguem a minha fantasia”. A imagem do Cristo Redentor mendigo, que seria o abre-alas da escola, foi proibida pela justiça a pedido da igreja. A alegoria foi então adaptada para o desfile: coberta por um plástico preto e uma faixa em forma de protesto. Em contraste, o desfile levava para avenida mendigos luxuosos e carros ricos construídos com materiais baratos. Apesar de impactante, a Beija-flor não venceu aquele carnaval. A escola de Nilópolis foi a segunda colocada, mas até hoje o desfile de 1989 da azul e branco é reconhecido como um dos maiores da era do Sambódromo.
Portela – “ImaginaRIO, 450 Janeiros de Uma Cidade Surreal”
Em 2015 a Portela voltou a experimentar o gosto de vencer o carnaval carioca. Com sede de vitória, a azul e branco entrou na avenida cantando:
“Sou carioca
Sou de Madureira
A Tabajara levanta poeira
Pra essa festa maneira
Meu bem me chamou
Lá vem Portela, malandro
O samba chegou”
Com enredo “ImaginaRIO, 450 Janeiros de Uma Cidade Surreal” do carnavalesco Alexandre Louzada, a Portela prestou homenagem aos 450 anos da cidade que lhe abriga, o Rio de Janeiro. Símbolos do Rio, como as palmeiras do Jardim Botânico, as praias, os Arcos da Lapa e o Maracanã foram retratados no desfile. A marca maior da escola, a águia, transformou-se em um imenso Cristo Redentor na Sapucaí. Os integrantes da comissão de frente eram personagens do Rio, como o vendedor ambulante, o malandro e as damas da Lapa. A azul e branco também foi aclamada pelos efeitos desenvolvidos na avenida, que lhe garantiu a primeira colocação.
São Clemente – “E o Samba Sambou”
A São Clemente fez em 2019 uma reedição do enredo de 1990 da agremiação e divertiu o público na Marques de Sapucaí.
“É fantástico
Virou Hollywood isso aqui (isso aqui)
Luzes, câmeras e som
Mil artistas na Sapucaí”
O enredo “E o Samba Sambou” desenvolvido e reeditado pelo carnavalesco Jorge Silveira fez uma crítica bem-humorada ao próprio mundo do samba. O carro abre-alas da agremiação “É fantástico! Virou Hollywood isso aqui”, sintetizava bem o tipo de abordagem que a escola pretendia realizar. Os camarotes do Sambódromo e corte de verbas da prefeitura para o carnaval também foram criticados. A agremiação ficou em 6º lugar.
Unidos de Vila Isabel – “A Vila Canta o Brasil Celeiro do Mundo – Água no Feijão, que Chegou mais um”
Em 2013 a Vila desfilou no dia do aniversário de um dos seus ícones: Martinho da Vila, que na ocasião completava 75 anos. E foi o samba de Martinho em parceira com Arlindo Cruz, André Diniz, Leonel e Tunico da Vila, que empolgou a Sapucaí.
“Festa no arraiá
É pra lá de bom
Ao som do fole, eu e você
A vila vem plantar
Felicidade no amanhecer”
A Vila fez uma homenagem ao homem do campo. O enredo desenvolvido pela Carnavalesca Rosa Magalhães, “A Vila Canta o Brasil Celeiro do Mundo – Água no Feijão, que Chegou mais um” empolgou desde o início da apresentação da escola. A comissão de frente era formada por componentes em um tripé em forma de caixote, que faziam vários movimentos com um controle remoto. A bateria surpreendeu com as paradinha, em que durante a execução os ritmitas surguiam com elementos cenográficos dando efeito de “arraiá” na Sapucaí. A escola de Marinho ficou em 1º lugar e deu de presente para artista o campeonato do Grupo Especial como presente de aniversário.
Imperatriz Leopoldinense – “Catarina de Médicis na Corte dos Tupinambôs e Tabajères”
Quem nunca ouviu o refrão do samba enredo da Imperatriz de 1994. Com refrão forte, foi um dos melhores daquele ano na voz de Preto Jóia:
“Sou índio, sou forte
Sou filho da sorte, sou natural (bis)
Sou guerreiro
Sou a luz da liberdade, carnaval”
O Enredo de Rosa Magalhães levou o índio como protagonista para avenida. “Catarina de Médicis na Corte dos Tupinambôs e Tabajères” buscou na França do século XVI uma festa oferecida por Henrique II e Catarina de Médici, em que índios brasileiros foram transportados para o país europeu com o objetivo de representarem na festa seus hábitos e costumes. A tradicional comissão de frente da escola de Ramos mais uma vez impressionou pelo luxo e efeito provocado pela evolução, quando abrindo seus leques em verde e dourado. A Imperatriz Leopoldinense foi a campeã do Carnaval de 1994.
2015 a Portela não ganhou o Carnaval, mas sim em 2017