Saneamento tem gênero?

No Brasil, 16 milhões de mulheres não têm acesso à água tratada e 38% vivem em locais sem coleta de esgoto #publieditorial

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Marília Januária (Foto crédito André Albuquerque)

Dos morros cariocas para os bailes de carnaval, a história da passista Maria Mercedes Chaves, a Maria Lata d’água, ganhou o Brasil após desfilar na Marquês de Sapucaí com uma lata de 20 litros de água na cabeça. A musa inspiradora da famosa canção, “Lata d’água na cabeça”, foi responsável por romantizar a falta de saneamento básico e atrelar por décadas as mulheres ao dever de cuidar da casa.

Não é normal que um gênero seja o mais atingido pela falta de universalização de um serviço, que como o nome já diz, é básico. Contudo, são as mulheres quem mais sofrem com isso, segundo dados do Trata Brasil (instituto que atua no avanço do saneamento básico e na proteção dos recursos hídricos do país) divulgados em 2022.

É Maria, mas poderia ser Juliana, Eunice, Rudi, Marilene, Sandra, Aline, Elaine, Monica, Ana Lucia e outras quase 16 milhões de mulheres brasileiras sem acesso à água tratada. Elas são as mais prejudicadas pela falta de saneamento, onde 38% não têm coleta de esgoto em casa. O acesso reduziria em 64% as doenças ginecológicas e aumentaria a renda em 30%. Tirar as latas d’água dessas e de muitas outras mulheres é promover a igualdade de gênero.

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“São as mulheres que têm o maior contato com a água, seja para os afazeres domésticos ou o cuidado com os filhos. A maioria dos lares é conduzida por elas, que são as maiores prejudicadas com a falta de saneamento, que acarreta doenças de veiculação hídrica, maior incidência de faltas à escola e ao trabalho. Águas do Rio tem muitas dessas pessoas mapeadas em programas, como o “Afluentes”, que lida diretamente com as lideranças comunitárias, e o “Vem Com a Gente”, que atua no avanço do saneamento, recuperando as estruturas existentes de água, regularização de cadastro e inclusão na tarifa social, quando aplicável), e busca essas mulheres para que elas participem do que está sendo feito para construirmos o futuro”, ressalta Letícia Tavares, gerente executiva de Resíduos Sólidos da Aegea, grupo ao qual a Águas do Rio pertence.

Moradora de Japeri, na Baixada Fluminense, Marília Januária é uma das milhares de mulheres que receberam água tratada encanada pela primeira vez em 2023. Antes, ela tinha que puxar água com uma bomba do rio para abastecer sua casa. Agora que não tem mais essa preocupação pode, após viajar duas horas e 20 minutos do trabalho para casa, tomar um banho relaxante e ter seu merecido descanso ao fim do dia.

No último ano, nessa região da Baixada, cerca de 30 mil pessoas foram beneficiadas com melhorias no Booster (sistema de bombeamento) Engenheiro Pedreira. “Antes era uma correria, tinha que ir até o rio, botar bomba, tirar, botar a borracha, que soltava… Graças a Deus eu não tenho mais essa preocupação, agora tem água à vontade, maravilha!”, conta Marília Januária.

A falta de água encanada atrapalha muito o dia a dia dos cidadãos, em especial mulheres e crianças, que são mais acometidas por doenças de veiculação hídrica, vindo até a óbito, de acordo com estudo feito pelo Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada). Além disso, segundo um levantamento do Instituto Água Sustentável, a educação das crianças é ainda mais prejudicada e cerca de 443 milhões de dias escolares são perdidos todos os anos por doenças relacionadas à água.

Para Letícia Tavares, é preciso incorporar a perspectiva de gênero no abastecimento de água e serviço de esgoto de forma a entender como a população feminina é, especificamente, afetada por essas questões.

“As mulheres são as grandes atingidas pela falta de saneamento, mas não só elas. A família toda é impactada. E com o surgimento dos problemas de saúde, por exemplo, a economia também sofre impacto. No final, todo o ecossistema é prejudicado”, alerta Letícia.

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