Roberto Anderson: Bike, fogos, fumaça

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Durante a semana foi aquela avalanche de desejos de bom Ano Novo. Mais intensa do que a da semana que antecedeu o Natal. Responder a todos é de praxe. Assim como, enviar esses mesmos votos aos amigos. É bom saber que tanta gente lhe deseja bons momentos no futuro. Depois, chega o dia 31, com poucos planos. O tempo se anuncia sem chuva, o que é uma felicidade para os milhares de turistas e moradores da cidade que desejam ver os fogos nas praias.

Os fogos de Copacabana já foram vistos de vários ângulos: da praia, da pedra do Arpoador e do alto das Laranjeiras. Até mesmo literalmente de baixo, quando eram acesos na areia, as explosões e configurações acontecendo acima de nossas cabeças, e as cinzas e faíscas caindo sobre as roupas brancas da multidão. Nunca, ainda, de uma janela da avenida Atlântica. Mas, rever os fogos é sempre uma boa alternativa para celebrar a chegada de um novo ano.

Imprevidente ou relaxado, sem bilhete de metrô, há que buscar alternativas para a chegada a Copa. Ônibus passam lotados de passageiros vestidos de branco. Parecem felizes, cantam e batem na lataria e no teto, naquele jeito carioca, meio selvagem, de expressar contentamento. A expectativa de todos é a de estar numa festa que a televisão diz ser imperdível. Fotos da festa serão enviadas para o mundo, e cariocas e turistas, pobres ou ricos, são parte do cenário. Mas, ônibus lotados estão fora de cogitação.

Multidões caminham em direção a Copacabana na noite de Ano Novo. Pequenos grupos trazendo flores e bebidas podem ser vistos nas ruas dos bairros vizinhos, todos seguindo na mesma direção. À medida que Copacabana vai ficando próxima, esses grupos já são rios de gente. São cada vez mais pessoas, até se afunilarem nas barreiras de revista policial, que passaram a existir nos últimos anos.

Resta a fiel bicicleta, velha de guerra, de grande serventia nos deslocamentos pela cidade congestionada. A pedalada tem início em ruas desertas pelo feriado e desemboca nas ruas já tingidas por mais pessoas de branco. Já perto da meia-noite, o Túnel Novo é tomado por uma multidão alegre, em que grupos cantam suas músicas preferidas e se agitam com a reverberação de seus gritos e assovios no teto curvo. A sensação é a de ser parte da galera. É bonito, é bom estar na multidão quando ainda não há aperto.

Nos momentos que antecedem a queima de fogos, cada espaço da avenida Atlântica e da praia está tomado por pessoas vindas de todos os cantos da cidade, do país e do mundo. A excitação é evidente e, em pouco tempo, todos estão concentrados nas areias para ver os fogos. No fim, viu-se pouco, já que uma densa fumaça se formou, espalhando-se depois pelos bairros vizinhos. Um clima de fog londrino produzido pelos fogos de Copacabana.

Já no Leme o clima é de calma quermesse. Um pai corre empurrando o carrinho do filho só para vê-lo gargalhar e pedir “de novo”. Um homem come tranquilamente a sua coxa de galinha, trazida no precioso farnel preparado pela esposa. Uma senhora, sentada na calçada, canta os animados louvores vindos do palco de música gospel montado na praia em frente.

A chegada da música evangélica ao réveillon da praia de Copacabana é a curiosa novidade. É bom lembrar que o evento nasceu da tradição dos terreiros virem para as praias fazer suas oferendas a Iemanjá. Os moradores aproveitavam para tomar um passe e deixar flores no mar. Com a queima de fogos, os terreiros foram procurar praias mais tranquilas e Iemanjá ficou meio esquecida no evento de nome francês.

Nessa celebração de Ano Novo, no palco onde logo Anitta, com seu poderoso bumbum, iria fazer o quadradinho, até Caetano Veloso resolveu cantar um louvor. Uma música meio sem graça, após as mais lindas canções tropicalistas. Sem a presença no palco de Maria Bethânia, que permanece fiel a Nossa Senhora da Purificação e aos seus orixás. Salve Bethânia, salve o Caetano tropicalista, salve 2025!

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Roberto Anderson é professor da PUC-Rio, tendo também ministrado aulas na UFRJ e na Universidade Santa Úrsula. Formou-se em arquitetura e urbanismo pela UFRJ, onde também se doutorou em urbanismo. Trabalhou no setor público boa parte de sua carreira. Atuou na Fundrem, na Secretaria de Estado de Planejamento, na Subprefeitura do Centro, no PDBG, e no Instituto Estadual do Patrimônio Cultural - Inepac, onde chegou à sua direção-geral.

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