Roberto Anderson: Montevidéu

O Uruguai é meio espremido entre o Brasil e a Argentina. Ao se perguntar a alguém de lá sobre a história do país, que foi cobiçado pelos dois grandes vizinhos, ouvirá que lhe tiraram o Rio Grande do Sul

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O Uruguai é meio espremido entre o Brasil e a Argentina. Ao se perguntar a alguém de lá sobre a história do país, que foi cobiçado pelos dois grandes vizinhos, ouvirá que lhe tiraram o Rio Grande do Sul. Colônia do Sacramento foi portuguesa, enquanto Montevidéu se manteve como baluarte espanhol. 

Montevidéu é uma cidade acolhedora, com uma arquitetura riquíssima. Os edifícios art-déco estão por toda parte e têm composições muito interessantes. Vale a pena andar pelas suas ruas olhando para o alto, observando as torres de diferentes formatos e os ornatos nas partes altas desses edifícios. São igualmente surpreendentes as composições de fachadas, especialmente aquelas assimétricas. 

Há também uma enorme quantidade de casas térreas, coladas nas divisas e alinhadas ao passeio, com fachadas ecléticas. Balcões com serralherias trabalhadas estão sempre presentes nessas edificações, ao alcance das mãos. Nas calçadas, estão as centenárias árvores de pau-ferro, no inverno desfolhadas. E há a Cidade Velha, com suas ruas de pedestres e miríades de vendedores de artesanato, livros usados e quinquilharias. 

As lojas, em liquidação, ainda assim parecem vazias. Efeito tardio da pandemia? Pelas ruas não é comum se ver pessoas ostentando riqueza. A impressão é de uma imensa classe média, talvez algo empobrecida. Há também pobreza mais severa, com pessoas dormindo nas calçadas em noites frias, mas em menor quantidade do que se observa nas grandes cidades brasileiras. Com relação a essas, Montevidéu é bem mais segura.

Já era um hábito antigo o de alguns moradores saírem às ruas com uma garrafa de água quente debaixo do braço e a cuia de mate na mão. E muitos ainda o fazem. Volta e meia se servem da água para seguir tomando a querida bebida. Isso os deixa com apenas uma mão livre para abrir portas, pagar coisas ou cumprimentar alguém. Mas, com o advento dos celulares, aqueles que não abandonam o seu mate ficam numa situação complicada, com ambas as mãos ocupadas. É uma situação verdadeiramente curiosa trazida pela combinação de modernidade e tradição.

O Uruguai teve importantes pintores modernos, como Torres Garcia, Rafael Barradas e Petrona Vieira. Torres Garcia teve seu nome tristemente ligado ao Brasil. Em 1978, o incêndio do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro consumiu boa parte de sua obra, que lá se encontrava exposta. Foi um desastre na vida cultural carioca, mas um desastre ainda maior para a produção do artista. Até recentemente ainda se restauravam as poucas peças que restaram do incêndio. Vale muito a visita ao excelente museu dedicado ao artista na Cidade Velha. Nós, os brasileiros, devemos visitá-lo não só pela qualidade do que lá está exposto, mas também como um ato de contrição por nossa incúria.

Montevidéu é uma cidade que tem muitos atrativos, praças bem cuidadas, moradores atenciosos e um trânsito comportado. No entanto, ainda não atrai um número tão grande de turistas. Nesse aspecto, lembra a Lisboa de muito tempo atrás, um pouco cinza e vazia. Hoje Lisboa é uma cidade jovem e vibrante, que atrai a juventude europeia e de outros continentes. Será esse um possível destino para a capital do Uruguai? 

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entrar grupo whatsapp Roberto Anderson: Montevidéu
Roberto Anderson é professor da PUC-Rio, tendo também ministrado aulas na UFRJ e na Universidade Santa Úrsula. Formou-se em arquitetura e urbanismo pela UFRJ, onde também se doutorou em urbanismo. Trabalhou no setor público boa parte de sua carreira. Atuou na Fundrem, na Secretaria de Estado de Planejamento, na Subprefeitura do Centro, no PDBG, e no Instituto Estadual do Patrimônio Cultural - Inepac, onde chegou à sua direção-geral.

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