Roberto Anderson: O mercado manda

Ao assumir esse seu terceiro mandato, Eduardo Paes esvaziou as secretarias de Meio Ambiente e de Urbanismo das suas funções de licenciamento ambiental e urbanístico

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Imagine-se o presidente Lula convidando Marina Silva para ser a Ministra do Meio Ambiente e, em seguida, lhe informando que o licenciamento ambiental não estaria no seu ministério. Imagine-se o IBAMA, e toda a sua capacidade de fiscalizar desmatamentos, fora do Ministério do Meio Ambiente. Imagine-se que as licenças ambientais fossem emitidas pelo Ministério de Desenvolvimento Econômico. Bastante absurdo e disfuncional, certo? Pois foi isso que o prefeito do Rio fez, não só com a área ambiental, mas também com a área do urbanismo.

Ao assumir esse seu terceiro mandato, Eduardo Paes esvaziou as secretarias de Meio Ambiente e de Urbanismo das suas funções de licenciamento ambiental e urbanístico. O prefeito atendeu aos anseios dos grandes empresários, que sempre reclamam dos limites impostos pelas regulamentações referentes ao uso do solo urbano e à proteção do meio ambiente. Criou, então, uma secretaria especializada em acelerar licenciamentos, sem o constrangimento do que pensam os formuladores daquelas políticas setoriais.

A Secretaria de Meio Ambiente que o prefeito entregou ao PT veio capenga, incapaz de opinar sobre a conveniência de empreendimentos na cidade do ponto de vista ambiental. O mesmo aconteceu com a Secretaria de Urbanismo. Ela ficou incapaz de gerenciar os licenciamentos de edificações na cidade. Não faz o menor sentido que os órgãos específicos da área não tenham ingerência sobre o que acontece lá na ponta.

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Um bom exemplo de como é importante a integração entre o planejamento das políticas urbanas e o licenciamento é o caso do Morro Dois Irmãos, no final do Leblon. Toda a vasta área daquele morro, que se vê das praias de Ipanema e Leblon, era propriedade privada e já contava com uma licença para edificação de um hotel e dois edifícios. O então Secretário Alfredo Sirkis, percebendo o terrível impacto que tal projeto teria na paisagem carioca, propôs ao proprietário a troca de lugar do potencial construtivo do seu terreno. E assim se fez, a metragem quadrada destinada a enfear a paisagem da orla foi acomodada em um terreno na Barra. E o morro foi reflorestado.

Ora, se o Secretário não tivesse ingerência sobre o licenciamento, a única lógica a presidir a análise daquele empreendimento teria sido o frio parâmetro da legislação, que acolhia aquela barbaridade. Do ponto de vista do mercado estava tudo certo, mas a cidade perderia muito.

Nesta gestão do prefeito Paes, os licenciamentos estão na alçada de Chicão Bulhões (Francisco Siemsen Bulhões Carvalho da Fonseca). Ele é advogado, eleito deputado estadual pelo Partido Novo e, até onde se sabe, sem vinculação acadêmica, nem com a área ambiental, nem com a do urbanismo.

A Secretaria Municipal de Urbanismo, apesar de cortada de grande parte de suas funções, inicialmente vinha sendo gerida pelo arquiteto Washington Fajardo, o qual foi depois substituído pelo respeitadíssimo arquiteto Augusto Ivan. No entanto, no último dia 06 de outubro as funções do urbanismo, que ainda se encontravam na secretaria específica, foram transferidas para a secretaria comandada por Chicão Bulhões. Esta secretaria passou então a se chamar Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano e Econômico.

Assim, as questões referentes à formulação das políticas urbanas da cidade, nesta gestão, passam definitivamente a serem vistas pela ótica do desenvolvimento econômico. É o mercado ditando as regras urbanas, como já vem ocorrendo com toda a nova legislação urbana encaminhada à Câmara de Vereadores nos últimos tempos. Paisagem da cidade? Conforto e qualidade dos bairros? Para que, se sempre cabe mais um prédio com apartamentos a serem oferecidos a investidores? Não é só na segurança pública que o Rio não vai bem…

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Roberto Anderson é professor da PUC-Rio, tendo também ministrado aulas na UFRJ e na Universidade Santa Úrsula. Formou-se em arquitetura e urbanismo pela UFRJ, onde também se doutorou em urbanismo. Trabalhou no setor público boa parte de sua carreira. Atuou na Fundrem, na Secretaria de Estado de Planejamento, na Subprefeitura do Centro, no PDBG, e no Instituto Estadual do Patrimônio Cultural - Inepac, onde chegou à sua direção-geral.
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