Os dias nublados, atípicos para essa época, deram uma trégua. A temperatura, que andava estranhamente baixa para os meses de dezembro e janeiro, começou a subir dia a dia. As nuvens se dissiparam e, vindo do Sul, anuncia-se não mais uma frente fria, mas uma onda de calor intenso. O verão chegou.
É certo que ele já vinha dando as caras na sua forma mais destrutiva, as enchentes que assolaram a Bahia e Minas Gerais. Famílias, que o presidente não quis ver, ficaram desabrigadas. Para ele, as amenidades do verão chegaram bem antes, com jet-skis e churrascadas.
Se o verão chegou, é hora de sair porta afora, mesmo com Ômicron por todo lado, esse rabo da pandemia que insiste em não se acabar. Aglomerações não são indicadas, mas quem resiste ao convite do mar, a uma praia que se estende até o por do sol? Atividade gratuita, a não ser pelo custo das passagens, barreira acrescida pela falta de conforto nos ônibus e trens insuficientes, e pelo olhar enviesado dos locais aos que vêm de longe. O charme da bermuda e chinelo, ou do top e canga, só é reconhecido se o usuário não demonstrar suas origens suburbanas.
Se é verão, quem pode se manda para as milhares de praias de nossa costa. Há de tudo. Cercadas por paredões de edifícios, como Copacabana e Balneário Camboriú, com uma retaguarda de coqueirais, com vegetação de restinga e mata Atlantica, em ilhas, ou no fim de trilhas que desafiam os banhistas.
O amor às praias é monetizado, e se transforma em loteamentos à beira-mar, que ameaçam a beleza que se vende. Governantes enxergam aí oportunidades de crescimento econômico e liberam construções em territórios virgens, às vezes até alterando legislações de proteção. A palavra mágica Resort abre as portas dos licenciamentos. Investidores espanhóis, que já destruíram o litoral daquele país, são considerados homens de visão, e convidados a fazer o mesmo por aqui.
Itamambuca, em Ubatuba, é um lugar paradisíaco. Da praia não se vê construções, somente o verde da vegetação de restinga após a areia e as encostas verdes ao fundo. Mas entre o verde junto à praia e a Rio-Santos há arruamentos barrentos, algumas pousadas, restaurantes e casas disperdas em lotes não muito grandes. Algumas dessas casas são de arquitetura comum em balneários, mas outras se destacam por serem o resultado de projetos de orgulhosos escritórios de arquitetura, mesclando estruturas metálicas e vidro. O bom desse lugar é que a maior parte do que parece ser lotes se encontra ainda tomada por espessa vegetação nativa. Caminha-se ouvindo grilos, pássaros e sapos. Mas a se considerar o padrão de arrancamento da vegetação nativa nos terrenos já construídos, pode se prever que o destino desse lugar é ser mais um bairro de veraneio à beira mar.
O que fazer para prevenir? Como instrumentalizar prefeituras locais para que pensem formas menos destrutivas de ocupação do solo? Qual a dimensão ideal dos terrenos? Que porcentagem de área permeável deve se deixada nos mesmos? Quantos por cento da vegetação nativa pode ser retirada para a construção das casas? E o que fazer com o inevitável esgoto e lixo produzidos? São perguntas que precisam de respostas urgentes, adequadas a cada local. O litoral brasileiro é lindo, é onde adoramos usufruir o nosso verão. Mas precisa ser cuidado. E protegido. Vamos à praia, que o verão chegou.