Roberto Anderson: Que venham os ônibus elétricos!

Não são poucos os desafios para a implantação de sistemas de ônibus elétricos nas cidades. Os investimentos iniciais são altos, já que o custo unitário desses veículos pode ser três vezes maior do que o de um ônibus convencional

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Nesse carnaval, e nos anteriores, o metrô do Rio funcionou seguidamente, dia e noite. É quando acontece uma das situações mais interessantes da cidade, que é entrar nos trens e ver pessoas alegres e fantasiadas. Nos horários de desfiles na Sapucaí, a coisa fica ainda mais interessante, porque as fantasias são grandes e elaboradas, num maravilhoso contraste com a maior seriedade do dia a dia. No entanto, para chegar a uma estação do metrô o passageiro sofreu, porque os ônibus quase desapareceram das ruas nesses dias. A falta de respeito de cada dia com o usuário é elevada à máxima potência durante a folia.

O sumiço de linhas de ônibus ocorrido no Rio de Janeiro durante a pandemia até hoje não foi completamente revertido. Mas mesmo aquelas linhas restabelecidas continuam a contar com poucos veículos, provocando longas esperas em pontos de ônibus analógicos, em que não é possível saber quando o próximo ônibus virá. Não é assim nas cidades dos países mais desenvolvidos, e nem tampouco em diversas cidades do Brasil, onde a qualidade da mobilidade urbana é um dos seus principais pontos positivos.

Se ter um sistema de ônibus que funcione de forma razoável, e com conforto, é algo ainda distante para os cariocas, muito mais distante é ter um sistema voltado para a sustentabilidade ambiental. Além de barulhentos, com uma frota não completamente dotada de ar-condicionado, nossos ônibus são de motores a diesel, ou seja, poluentes, emissores de gases do efeito estufa. Considerando as metas brasileiras, referentes ao Acordo de Paris, de zerar a emissão líquida de gases do efeito estufa até 2050, é fundamental o engajamento da cidade na eletrificação da sua frota de ônibus urbanos. Cada ônibus elétrico nas ruas representa uma redução aproximada de 100 toneladas de CO2 na atmosfera por ano.

De acordo com a plataforma E-bus, que monitora o uso de ônibus elétricos na América Latina, atualmente o Brasil conta com apenas 444 ônibus com esta característica. Na América Latina já são 5.084 os ônibus movidos a eletricidade, o que inclui trólebus e mistos. Os países latino-americanos que lideram essa estatística são o Chile, com 2.043 ônibus elétricos, e a Colômbia, com 1.590. A cidade de São Paulo conta com 269 ônibus elétricos, a maior frota entre as cidades brasileiras. No final de 2023, a capital paulista conseguiu a aprovação pelo BNDES de R$ 2,5 bilhões, destinados à compra de até 1,3 mil veículos, o que representaria 10% da sua frota atual.

No Estado do Rio de Janeiro, apenas Volta Redonda aparece no cômputo do E-bus, com ínfimos três ônibus. Segundo essa plataforma, a cidade do Rio de Janeiro não conta com nenhum ônibus elétrico. E não há sinais de busca por eletrificação da frota carioca. Desde que começou a reformar o sistema BRT, sucateado na administração Crivella, a Prefeitura, segundo a SMTR, adquiriu 713 ônibus, dos quais 427 já estão operando, substituindo os antigos azuis. Eles são modelo Padron, com motor traseiro e tecnologia Euro 6, menos poluente. Mais recentemente, o prefeito anunciou a compra de mais 150 ônibus para suprir as linhas desaparecidas na cidade. Mas em nenhuma dessas compras há ônibus elétricos.

A cidade pode estar perdendo uma grande oportunidade, já que o BNDES, através do Fundo Clima, conta com R$ 10 bilhões em caixa para financiamentos desses veículos, com juros subsidiados e prazos de quitação mais longos do que os de mercado. Outra fonte de financiamento é o PAC Seleções, que destinará R$ 3 bilhões para a renovação das frotas das prefeituras. O governo federal vem também elaborando medidas para impulsionar a produção nacional de ônibus elétricos.

A cidade de Niterói, que desde 2021 conta com uma Secretaria Municipal do Clima, a primeira do país, já testou modelos de ônibus elétricos das empresas BYD e HIGER, para possível adoção no sistema de transportes coletivos. Um dos grandes desafios para a adoção desses veículos é o correto equacionamento do carregamento das baterias, de forma a mantê-los funcionando nos períodos necessários. A prefeitura de Niterói solicitou à COPPE um estudo de viabilidade, que mostrou que o sistema pode ser viável, com um menor custo de manutenção do que os ônibus convencionais, e com uma energia mais barata do que o diesel. A médio prazo o sistema poderia até ser superavitário.

Envolvendo uma escala bem maior, o sistema de transporte público de Berlim, operado pela empresa estatal BVG, vem realizando a troca de sua frota convencional por ônibus elétricos, já contando com 200 unidades desses veículos, a maior frota da Alemanha. O projeto envolve a troca de 1600 veículos em alguns anos, assim como a criação de uma completa infraestrutura para a sua recarga e manutenção. Algumas áreas da cidade começam a contar também com miniônibus elétricos, sem motoristas, capazes de conduzir os passageiros aos destinos desejados.

Não são poucos os desafios para a implantação de sistemas de ônibus elétricos nas cidades. Os investimentos iniciais são altos, já que o custo unitário desses veículos pode ser três vezes maior do que o de um ônibus convencional. Mas com custos de manutenção menores e os benefícios ao clima e ao meio ambiente, é uma alternativa que deve ser encarada. É preciso sair da inércia, e dar início a um projeto de eletrificação da frota de ônibus urbanos do Rio. Uma melhor qualidade de vida hoje e no futuro são razões mais do que suficientes. E os cariocas teriam mais um excelente meio de transporte para andar fantasiados no carnaval.

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Roberto Anderson é professor da PUC-Rio, tendo também ministrado aulas na UFRJ e na Universidade Santa Úrsula. Formou-se em arquitetura e urbanismo pela UFRJ, onde também se doutorou em urbanismo. Trabalhou no setor público boa parte de sua carreira. Atuou na Fundrem, na Secretaria de Estado de Planejamento, na Subprefeitura do Centro, no PDBG, e no Instituto Estadual do Patrimônio Cultural - Inepac, onde chegou à sua direção-geral.

6 COMENTÁRIOS

  1. Diminuiria muito os gastos com combustíveis e haveria um ganho extraordinário de tempo dos BRTs se fosse colocado em funcionamento o sistema de sinais inteligentes, que abririam com a aproximação dos mesmos. E sem prejuízo para o trânsito em geral, muito pelo contrário, uma vez que na maior parte do tempo o sinal fica aberto para nenhum BRT passar.

  2. São Paulo é líder dos ônibus elétricos? Sim. Mas SP tem padrões melhores em toda a frota há anos. Piso baixo, motor traseiro, ar condicionado e tudo isso com bastante subsídio. A prefeitura do Rio desde 2010 fez uma licitação porca que deu errado, o Paes gastou bilhões para revitalizar o BRT e ficou sem lastro pra bancar eletrificação. Temos que nos concentrar em 2028, quando vence a licitação atual e a prefeitura deverá licitar o sistema novamente. Quem sabe não seja a oportunidade perfeita pra Mobi Rio assumir tudo? Ou que pelo menos faça um edital elevando o padrão do sistema na cidade.

    • São Paulo saqueia bilhões do petróleo e gás do Rio. Sem a grana do Rio o “motor do Brasil” não consegue desenvolver nada.
      A paulistada tira bilhões do Rio para o desenvolvimento deles e o que faz o Carioca?
      Elogia os algozes.

  3. Foi questionado ao prefeito Eduardo Paes sobre a eletrificação da frota, inclusive seria assim no corredor Transoeste de Campo Grande até Santa Cruz, mas ele voltou atrás alegando conflito de interesses, já que ele ocupou o cargo importante na BYD.

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