Encontra-se na pauta desta semana na Câmara de Vereadores, o Projeto de Lei Complementar nº 43/2021 (de autoria do Poder Executivo), que visa regulamentar o “licenciamento” automático e autodeclarado para atividades econômicas de baixo risco na cidade.
Mas, o que é atividade econômica de baixo risco?
Pelo projeto, cabe exclusivamente à pessoa do Prefeito dizer, por decreto, o que é ou não atividade econômica de baixo risco!
Será que isto é cabível? Ou esta maneira de resolver o assunto na lei é uma forma rápida, mas altamente cega ou preguiçosa, “chutando a bola” para uma futura decisão pessoal do Chefe do Executivo Municipal, atual ou futuro?
De fato, se a lei não determina qualquer parâmetro qualitativo prévio que enquadre a decisão do Prefeito, a lei é um cheque em branco ao alcaide para que ele modifique, em maior ou menor grau, o próprio zoneamento de uso da Cidade! E a lei sequer impõe um procedimento administrativo de consulta aos órgãos ambientais e/ou urbanísticos e seus Conselhos, como vinculativos da decisão do gestor ! Fica exclusivamente ao seu arbítrio!
O segundo aspecto que se impõe ao aperfeiçoamento do PLC nº 43/2021 é a necessária divulgação, no site da Prefeitura, das informações decorrentes das “licenças” autodeclaradas.
Já sabemos que a Prefeitura do Rio não é um exemplo de transparência para o cidadão. Mas, no caso deste projeto, esta transparência é fundamental, já que a proposta da lei fala em uma fiscalização a posteriori, e que dependerá de um grande controle social dos vizinhos e dos cidadãos em geral.
Cabe relembrar aqui de duas leis federais que dispõem sobre a necessária construção destas informações públicas: a Lei federal 14.129/2021, que dispõe sobre Governo Digital, e a Lei 12.965/2014, que dispõe sobre “princípios, garantias, direitos e deveres do uso da internet no Brasil”.
A primeira não é mandatória para o Município, mas já que o Governo do Rio está pretendendo “regulamentar” uma outra lei federal (Lei nº 13.874) – também não mandatória – convém que ele siga todos os parâmetros federais de garantias de direitos de todos os cidadãos, sejam eles empreendedores ou não empreendedores.
Diz o art. 3º da lei 14.129:
São princípios e diretrizes do Governo Digital e da eficiência pública:
I – a desburocratização, a modernização, o fortalecimento e a simplificação da relação do poder público com a sociedade, mediante serviços digitais, acessíveis inclusive por dispositivos móveis;
II – a disponibilização em plataforma única do acesso às informações e aos serviços públicos, observadas as restrições legalmente previstas e sem prejuízo, quando indispensável, da prestação de caráter presencial;
III – a possibilidade aos cidadãos, às pessoas jurídicas e aos outros entes públicos de demandar e de acessar serviços públicos por meio digital, sem necessidade de solicitação presencial;
IV – a transparência na execução dos serviços públicos e o monitoramento da qualidade desses serviços;
V – o incentivo à participação social no controle e na fiscalização da administração pública;
VI – o dever do gestor público de prestar contas diretamente à população sobre a gestão dos recursos públicos; (…)
Por outro lado, a lei federal 12.965/2014 no seu art.24 diz:
Art. 24. Constituem diretrizes para a atuação da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios no desenvolvimento da internet no Brasil:
I – estabelecimento de mecanismos de governança multiparticipativa, transparente, colaborativa e democrática, com a participação do governo, do setor empresarial, da sociedade civil e da comunidade acadêmica; (…)
IV – promoção da interoperabilidade entre sistemas e terminais diversos, inclusive entre os diferentes âmbitos federativos e diversos setores da sociedade; (…)
VI – publicidade e disseminação de dados e informações públicos, de forma aberta e estruturada;
Portanto, se por um lado o projeto de lei em questão pode facilitar a vida de muitos cidadãos, livrando-os das garras da burocracia, por outro, a lei não só deve garantir parâmetros qualitativos mínimos ao critério de “baixo risco”, como também dar amplo acesso aos cidadãos de todo o processo digital de autolicenciamento, pois, ainda que digital e automático, o processo administrativo de autolicenciamento continua sendo público e formal, do qual se deve poder extrair as devidas consequências de responsabilidade urbanística na cidade.
Ao tramitar o PLC nº 43/2021, a Câmara deve atentar para que as boas intenções do projeto de lei não o transformem em um engano urbanístico, traído pela suposta eficiência advinda do procedimento “rápido e mal-feito”.
Este é um artigo de Opinião e não reflete, necessariamente, a opinião do DIÁRIO DO RIO.