Foi um sucesso de mídia a publicação da lei estadual fluminense nº 9692/2022 que “Declara Patrimônio Cultural Material do Estado do Rio de Janeiro a ‘Batata de Marechal Hermes´”. Ao pé da publicação da lei, o nome do deputado que, provavelmente, quererá faturar, junto ao eleitorado daquele bairro, pela autoria da lei. Afinal, estamos às vésperas do período eleitoral e só se fala nisso.
Pode parecer, para o cidadão desavisado, que esta lei sobre patrimônio cultural trará alguma consequência mais relevante, seja para a tradicional batata frita com linguiça e frango da carrocinha do bairro, seja para a própria região. Ledo engano.
Esta lei, tal como a que nos referimos em outro blog no ano passado (15/01/2021), no qual comentamos a declaração, por outras leis estaduais como patrimônio cultural do ERJ tanto da Bíblia, quanto dos trabalhadores ambulantes do sistema ferroviário dos trens, não terá, a exemplo das citadas, qualquer consequência de constituição de direitos ou obrigações, seja para o poder público, seja para os particulares. E por quê?
Porque as três leis apenas declaram estas atividades ou/e objetos como patrimônio cultural do Estado, sem que – ainda bem – tenham feito uso do instituto do tombamento nos seus textos. Portanto, podemos dizer que a nenhum desses três casos se aplica o mais recente entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre efeitos de tombamento provisório feito por ato legislativo (ADI 5670)
Mesmo o fato de as duas primeiras leis (a da Bíblia e a dos ambulantes) terem tido o cuidado de se referirem a estes bens como patrimônio imaterial, e no caso da batata de Marechal Hermes ela ter sido referida como patrimônio material (?), segue a possibilidade de as pessoas poderem seguir comendo, materialmente, este patrimônio! Aliás, o seu consumo é condição necessária à continuidade de sua existência! Será um caso inédito e único poder comer um patrimônio cultural material!
Portanto, os efeitos desta mais recente lei – a da batata de Marechal Hermes como patrimônio cultural – são, como as demais, meramente atributivos de um reconhecimento honorífico. Uma homenagem sem qualquer compromisso de investimento além do papel da publicação.
Enquanto isso, o patrimônio material do bairro, os seus prédios que constituem a área de patrimônio cultural – APAC, e sobre o qual já falamos desde 2018, no nosso blog (“os encantos do bairro…”), seguem sem qualquer atenção, sem projetos de conservação e manutenção!
Será que a declaração da batata mudará a atenção a ser dada ao patrimônio cultural do bairro?
Este é um artigo de Opinião e não reflete, necessariamente, a opinião do DIÁRIO DO RIO.