Sonia: Por que o MPF ajuizou ação civil contra o Memorial do Holocausto?

Sonia Rabello diz que a construção do Memorial do Holocausto desrespeita as regras de preservação do Patrimônio Cultural do Rio, do Brasil e Mundial

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Fotos: Marcos de Paula/Prefeitura do Rio

A resposta é simples: a sua construção desrespeita as regras de preservação do Patrimônio Cultural do Rio de Janeiro, do Brasil e do Patrimônio Mundial, e também regras municipais de urbanismo.

Vejamos :

Tudo começou nos idos de 2018, quando a Câmara Municipal do Rio aprovou mais uma daquelas suas leis especiais, cujas regras urbanísticas são destinadas a um único terreno, e para um só destinatário. Tudo a) sem a participação popular em seu processo de elaboração, b) sem estudo técnico de urbanismo, c) sem estudo de impacto de vizinhança, d) sem oitiva do COMPUR (Conselho Municipal de Política Urbana).  Só estes aspectos já ferem o princípio do planejamento urbano igualitário, e diretrizes do Estatuto da Cidade.

Além dessas ilegalidades, a lei municipal, para viabilizar a proposta do grupo interessado: e) conferiu a construção e cessão, por 30 anos, de área pública de uso comum do povo – em parque público denominado Ytzhak Rabin – à uma Associação privada, composta de 8 (oito) membros, f) sem que o terreno formasse um lote, g) sem licitação (foi tida como inexigível!), h) sem desafetação da área como logradouro público !

Estas irregularidades foram as que a AMAB (Associação de Moradores e Amigos de Botafogo), e outras instituições como o ICOMOS-BR (Conselho Internacional de Monumentos e Sítios da Unesco), apresentaram ao Ministério Público Estadual, para efeitos de inquérito civil, e eventual proposição de ação civil pública no âmbito estadual; contudo, até o momento, não se teve qualquer retorno destas denúncias.

Mas, não foram essas as irregularidades que justificaram a ação civil pública (ACP) proposta pelo Ministério Público Federal (veja a petição inicial aqui).  Foram outras. Na ACP ora proposta pelo MPF junto à Justiça Federal, o fundamento foi basicamente:

1. o grave desrespeito e inobservância, pelo IPHAN, ao permitir a edificação, em área protegida por critérios estabelecidos por comissão específica, em 1974, e “constante do estudo técnico integrante do processo de tombamento do IPHAN 869-T-73”. (Link)

2. o grave desrespeito e inobservância de critérios de edificação em área protegida pela área de amortecimento, de paisagem cultural inserida no Patrimônio Mundial do Rio.

Eles já sabiam da discussão sobre as ilegalidades…

Alguém pode argumentar: coitados daqueles que já construíram aquela edificação em área pública de proteção cultural! Gastaram tanto dinheiro e agora pode ser que venham a ter que demolir …

Eles já sabiam e assumiram todos os riscos, acreditando, como sempre, na máxima da sobrevivência das ilegalidades: no final, é só pedir perdão e seguir em frente, pois não vai dar em nada, ou ficará para as “calendas gregas”, na Justiça.

Desde 2018, o ICOMOS, a AMAB e a FAM-Rio oficiaram ao IPHAN, ao Ministério Público Federal, ao Ministério Público Estadual, ao Tribunal de Contas do Município, denunciando publicamente as irregularidades.

Em fevereiro de 2019, o Ministério Público Federal instaurou inquérito civil, e propôs também uma ação de produção antecipada de provas; chamou, ainda, a associação beneficiada com a cessão do espaço público para conversar e tentar um acordo. Mas, nada adiantou ou andou; tocaram a obra, a despeito de tudo e todos.  Então, assumiram os riscos, todos eles, inclusive o de ter que, ao final, demolir o malfeito, e reconstituir o Parque Público como bem de uso comum do povo, que ainda o é, apesar da total descaracterização feita pelos interessados.

Será que chegaremos a um final compatível com o cumprimento das leis?

Esta, ou a próxima geração irá conferir esta resposta. Mas, fica o aviso para os bons entendedores, e a lição: no Rio, a sociedade civil, mais vigilante, não quer mais descumprimentos de sua legislação urbanística e de proteção cultural e ambiental. Que as regras se apliquem a todos, sem exceção!

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5 COMENTÁRIOS

  1. Absurdo!!! Revitalizaram um espaço abandonado pelo poder público, e de repente surge a iniciativa privada e resolve cuidar e modernizar o local, aí aparece os surfista de manchetes para aparecer… Tenho nojo do nosso país…

  2. Matéria muito bem fundamentada. Se existe regra, ela tem que ser cumprida por todos. Sem exceção. Afinal, o chicote que bate em Chico, também pega no Francisco, Manoel e Joaquim. Sem desculpas e muito menos mimimi.

  3. Uma pena que ainda temos de conviver com certos regramentos que mantém ambientes em péssimo estado, assim como para casos bem mais graves fechamos os olhos da conivência.

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