Wagner Victer – Francisco Horta: uma lenda viva próxima dos seus 90 anos

Colunista do DIÁRIO DO RIO fala sobre o advogado e ex-presidente do Fluminense

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Francisco Horta e Wagner Victer - Foto: Arquivo Pessoal

A excepcional vitória na Libertadores da América fez retornar a baila uma discussão em algumas redes que participo a polêmica de quem teria sido o maior Presidente da história do Fluminense.

Concordo com o atual Presidente do Fluminense que o maior Presidente do Fluminense foi o Oscar Cox por uma razão muito simples: criou o nosso Clube! Óbvio que outros podem legitimamente considerar Arnaldo Guinle por nossa sede e estádio! Ou até os meus queridos e saudosos Manoel Schwartz, Tri Campeão Carioca e Campeão Brasileiro ou David Fischell que, como Don Quixote, soube enfrentar moinhos e nos ter elevado a partir ponto mais baixo do poço.

Não há a mínima dúvida nessa avaliação dos critérios a considerar: A linha inteligente é avaliar dentro da conjuntura do momento e as características pessoais que marcam um Presidente, onde nesse sentido obviamente não se conta somente conquistar um grande título, por maior que esse seja.

Um bom Presidente é algo para se ter como uma referência eterna! Se requer estatura e ter elevado a imagem, e inflado a autoestima a níveis inimagináveis! É também ser íntegro, acima de suspeitas e ilaçoes e só assim poder ser lembrado! Ser um eterno não se faz só por ter orgulhado a torcida, mas por ter nos elevado a um panteão!

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O que aconteceu em 2023 certamente foi fantástico e absurdamente acima de qualquer expectativa esportiva minha e de muitos Tricolores. O atual Presidente Mário Bittencourt está de parabéns em relação a conquista e seu nome certamente está na história.

Porém, nessas discussões relativizar essa conquista como a chave para o mais alto posto seria até um desrespeito a nossa grandiosa história e até a outros feitos em épocas não potencializadas pela globalização das redes sociais como na Copa Rio de 1952, que até hoje buscamos seu reconhecimento como um Campeonato Mundial e até a Taça Olímpica atestando nossa grandiosidade.

Sobre o Presidente Horta, sou suspeito para falar dele, pois o considero muito acima dessa comparação e até hors concours pois é uma lenda viva e o maior dirigente esportivo do século XX e até do XXI (não surgirá outro igual neste século). Ou seja, por ter o acompanhado de perto o considero não o maior do Flu mas o maior de todos!

Algumas pessoas que não vivenciaram essa época, e também pelo fato de não terem redes sociais e nem o Google , não tem a dimensão do que foi Francisco Horta para o Fluminense e ficam limitados a achar que o bicampeonato carioca de 1975 e 1976 seria algo muito pequeno diante da dimensão que é hoje. Não compreendem aliás que os grandes campeonatos que existiam no Brasil eram de fato os campeonatos regionais. O próprio campeonato brasileiro do Vasco, em 1974, foi comemorado de maneira muito tênue e sequer era o foco.

Os clubes não se dedicavam para esses campeonatos nacionais . O Campeonato Brasileiro, era uma competição de segunda parte e o próprio título que tivemos no Brasileiro de 1970 (Roberto Gomes Pedrosa) sequer teve a comemoração que fizemos no Campeonato Carioca de 1971 sobre o Botafogo.

No tocante à campeonatos sul-americanos, eles praticamente não existiam. A Copa Libertadores era totalmente considerada de segundo plano e não tinha relevância . As competições que realmente importavam eram as dos campeonatos regionais, basta ver o massacre das torcidas que aconteceu pela quantidade de anos que o Corinthians e o Botafogo ficaram sem ser campeões estaduais.

Esquecem os ”analistas” atuais ao arrepio da história que as grandes competições internacionais, como Campeonatos Mundiais de clubes , eram os torneios internacionais intercontinentais onde somente os maiores clubes do mundo eram convidados a participar, ou seja, eram de fato os campeonatos mundiais à época , e nesses, obviamente, o Fluminense era a grande referência brasileira para o mundo e o Clube convidado!

Não basta falar que com Horta o Fluminense ganhou o Tereza Herrera na Espanha jogando com os maiores clubes do mundo ! Venceu a competição de Paris onde temos a clássica foto de Carlos Alberto Torres segurando o troféu em forma de Torre Eiffel e o próprio torneio de Viña del Mar.

As pessoas não se recordam a dimensão internacional do Fluminense era tão grande na época de Horta que pela primeira vez na história a bandeira da França foi retirada da parte mais alta da Torre Eiffel e foi colocada a bandeira do Fluminense.

O Fluminense era tão representativo que o Bayern de Munich em 1975, após a Alemanha ser campeã do mundo em 74, e mesmo sendo a base, com 8 jogadores, da seleção da Alemanha, pegaram um avião para fazer um jogo com o Fluminense no Maracanã, onde foram humilhados e isso seria impensável nos tempos de hoje ate para um time mediano da Europa. Basta falar que grandes jogadores, como o Cruyff, pediam para jogar amistosos no Fluminense e até outras empresa fantásticas como a Adidas vieram para o Brasil pelo Fluminense. Horta foi genial iniciar a questão do patrocínio nas camisas de clubes alias fazendo gratuitamente a divulgacao do programa de alfabetizacao no Brasil (MOBRAL).

Grandes artistas do mundo usavam a camisa do Fluminense de forma espontânea. Foi célebre os shows que os Rolling Stones, no auge da sua fama, faziam com seus integrantes vestidos com a camisa do Flu . Mesmo não tendo a propagação das redes sociais, como as camisas do Fluminense eram utilizadas por grandes artistas no mundo e surgiam em filmes internacionais. Ou seja, naquela época já era moda no mundo vestir a camisa do Flu que não era visto meramente um Clube que foi disputar uma competição mas uma referencia para o mundo.

Muitas pessoas não conseguem compreender o que foi a dimensão do Fluminense para o mundo feito por Francisco Horta. Coisa que aconteceu com poucos clubes no mundo e que só acontece atualmente pelos que são financiados com grandes quantias de recursos de Sheiks Arabes ou estranhos empresarios Russos.

O Fluminense na epoca da Maquina foi tão grandioso que tivemos no nosso time 10 jogadores da seleção brasileira e mais um jogador da seleção Argentina que era o Doval. Chegávamos a ter jogadores da seleção brasileira no banco do Fluminense e isso é algo impensável,para os dias atuais , pois, hoje, quando um grande clube tem 2 ou 3 jogadores na seleção é considerado um clube diferenciado internacionalmente.

O Clube que em 1977 alguns pessimistas diziam ser o fim da Máquina, era um time que tinha 7 jogadores da seleção brasileira e entre eles os dois melhores jogadores do Brasil, que eram o Rivelino e Marinho Chagas.

Horta, antes de tudo, é um gênio. Não só pela criação de expressões que cruzam e cruzarão uma eternidade como ”Saudações Tricolores”, ”Vencer ou Vencer”, mas principalmente pela criação da Máquina Tricolor, que é a melhor equipe que um clube de futebol já criou no planeta, com Rivelino, Paulo Cesar e cia, e que encantou o mundo pela forma de jogar, não pelos resultados, mas pela plástica que passava em todos os apaixonados pelo futebol. A figura de Horta era tão forte que no auge da ditadura militar teve a coragem de enquadrar em uma histórica entrevista ao Jornal do Brasil saudoso Márcio Guedes enquadrando aqueles que queriam mandar no futebol e sob o discurso que aos Generais cabiam mandar em seus Quartéis permitiu transitar o futebol nacional e isso comprometeu sua carreira de Magistrado pois o impediram , em represália, de assumir uma carreira de Desembargador mesmo sendo um Juiz de Direito brilhante.

A participação de Horta aos 89 anos na Missa na Paróquia São José, celebrada pelo Padre Omar Raposo, quando foi ovacionado de pé como um ”Anjo Tricolor” que nos trazia a esperada vitória na Libertadores foi de arrepiar. O seu lento caminhar e a figura pequena lembrava um cena não produzida pela Lucas Film do Mestre Yoda sendo aplaudido por todos Mestres Jedis da Galáxia.

Por ocasião dessa data que se aproxima dos seus 90 anos , quero apresentar um pouco mais da trajetória de vida do genial Francisco Horta para aqueles que só o conhecem como o Grande Mago do Fluminense, mas que tive o orgulho de entrevistar quando registrou seu depoimento para a posteridade e imortalidade no Museu da Imagem e do Som (MIS) por quase cinco horas, com depoimentos, muitos com histórias fantásticas e sempre engraçadas.

Sua trajetoria é longa e plural e vimos também um pouco de Horta por meio de um resumo que obtive nos arquivos da ALERJ, onde ele também foi Deputado Estadual, se destacando na Defesa dos Direitos Humanos.

Francisco Luiz Cavalcanti da Cunha Horta nasceu no dia 23 de setembro de 1934 na Casa de Saúde São José no Rio de Janeiro, filho do Médico Francisco Alves da Cunha Horta e da professora Marilda Barbosa Cavalcanti da Cunha Horta, irmã do consagrado apresentador de televisão Flávio Cavalcanti e da professora e depois política Sandra Cavalcanti.

Desde criança Horta tornou-se frequentador e torcedor destacado do Fluminense. De 1942 a 1953 frequentou os cursos primário, secundário e clássico no tradicional Colégio Mello e Souza.

De 1954 a 1958 cursou a Faculdade Nacional de Direito da antiga Universidade do Brasil (hoje UFRJ), onde conquistou o título acadêmico de bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais, tornando-se advogado brilhante .

Paralelamente aos estudos, sempre foi apaixonado pela música e chegou a formar o conjunto ”Chiquinho e seu Ritmo”, onde era o baterista e que tinha como crooners nada menos que João Gilberto, que depois se tornou famoso e uma lenda como um dos precursores da Bossa Nova, além da cantora Silvinha Teles.

Trabalhou como Advogado no Contencioso da Santa Casa da Misericórdia do Rio de Janeiro, onde seu pai exerceu a Medicina por mais de 30 anos.

Passou no concurso para a magistratura se tornando Juiz e ganhou dos seus colegas advogados da Santa Casa sua primeira toga. (1970 a 1976), continuando rotariano praticante até hoje e, na Associação Comercial do Rio de Janeiro (ACRJ), é sócio (a partir de 1983), Benemérito (1993) e Grande Benemérito (eleito em 2013 e, até hoje, o único não-presidente com esta honraria).

Na entidade fundou em 1984 o Conselho Empresarial de Segurança Pública, Ética e Cidadania, que presidiu de 1987 a 2015. Antes daquele conselho, em 1995, num momento em que a população do Rio de Janeiro vivia atemorizada por uma onda de sequestros, ele idealizou e sugeriu aos empresários da ACRJ, a criação de uma ferramenta importantíssima que existe até hoje chamada Disque Denúncia, viabilizando-a. ferramenta e experiência estas que depois foram exportadas para outros estados e até países. Aliás nessa área é considerado um dos pais da Vara de Execuções Penais ( VEP ) e do trabalho para apenados do sistema carcerário.

Ainda na Associação Comercial (ACRJ), foi Vice-presidente de diversos Presidentes e lá atuou aconselhando e influindo politicamente.

Mas foi na área esportiva que Francisco Horta se tornou conhecido do grande público. Na presidência , asuumida com praticamente 40 anos e idade ,do nosso querido Fluminense (1975 a 1977), onde é pasmem até hoje somente Benemérito, revolucionou o futebol carioca com a montagem da “Máquina Tricolor”, Rivelino, Paulo César Caju e Carlos Alberto Torres à frente, e com a realização do “troca-troca” entre os grandes clubes do Rio, que até foi polêmica entre muitos Tricolores, porém fundamental para salvar o futebol Carioca.

No meio eleitoral e político-partidário foi Deputado estadual eleito através do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) no Rio de Janeiro (1983 a 1987). Foi líder da bancada do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) na Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro /ALERJ (1983 a 1984) e presidente da União Parlamentar Interestadual / UPI (1984 a 1987). Aliás por sua capacidade oratória, leveza , inteligência , bom humor e principalmente de improviso sempre foi visto como um dos maiores tribunos que já tivemos.

Mesmo aos seus quase 90 anos que se aproximam e sem precisar provar mais nada, Francisco Horta continua trabalhando presencialmente ( mesmo no período da Pandemia ) no que considera uma missão de vida e o maior de todos os desafios! Como um tapa daqueles que desafiam o temp assumiu em outubro de 2014 , com 80 anos , o cargo de Provedor da Santa Casa da Misericórdia do Rio de Janeiro, na prática um CEO , para tentar reverter a grave crise desta Instituição de quase 450 anos onde nasceu a Medicina Brasileira com José de Anchieta e cuja história se confunde com as histórias do Rio de Janeiro e do Brasil.

“Vencer ou Vencer” continua sendo o lema da lenda tricolor Francisco Horta. Nessa contagem regressiva dos seus 90 anos , desejo que nosso eterno Horta , maior dirigente esportivo que já tivemos no país, tenha cada vez mais saúde, pois a vida de sucesso dele é eterna como a de toda lenda e de todo gênio que ele é!

Por último não aproveitar a efeméride dos seus 90 anos e os 50 anos da Máquina Tricolor e não conceder essa homenagem, mais que tardia , de ele ser alçado a categoria de Grande Benemérito, seria a perpetuação mesquinha de uma injustiça que os Deuses do Futebol nunca perdoariam .

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