O edifício que abriga o Instituto de Filosofia e Ciências Sociais (IFCS) da UFRJ faz parte do patrimônio da Universidade, assim como tantas outras edificações distribuídas pelo Estado do Rio de Janeiro, algumas delas também tombadas como Patrimônio Cultural.
Continuando sua campanha subliminar para as eleições de 2024, a prefeitura do Rio de Janeiro apresentou, no dia 29 de abril de 2024, uma proposta para implantação do autódromo de Guaratiba para a Câmara Comunitária da Barra da Tijuca, conforme noticiado pela imprensa. Existe a possibilidade de votação do projeto em junho.
Na última semana de maio, o prefeito, através de suas redes sociais, comunicou a participação municipal na restauração das fachadas e instalações elétricas do edifício onde funciona o Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da UFRJ, localizado no Largo de São Francisco sob o título “A Prefeitura do Rio vai restaurar o IFCS”.
O conjunto, patrimônio da UFRJ, conta com tombamento federal (1962) e estadual (1989). Segundo a legislação vigente, a Universidade é responsável para promover obras necessárias para sua preservação, assim como em outros edifícios, tombados ou não, que integram seu patrimônio.
Em alguns casos, como tem sido amplamente noticiado, alguns imóveis apresentam risco imediato para segurança de seus usuários, incluindo desabamento de paredes e marquises, vazamentos, falta de prevenção contra incêndios, ferragens à mostra, sem sequer considerarmos o valor cultural de cada bem.
Tais problemas vêm se agravando nas últimas décadas. Tal afirmativa é resultado de observação direta e vivência no campus da Ilha do Fundão desde 1974, quando ali entrei como aluno do curso de Arquitetura, permanecendo posteriormente como docente até 2017.
Nesse caso, não se trata de mera opinião, pois era responsável pelas disciplinas de Arquitetura no Brasil e Conservação e Restauração de Bens Culturais, que integram as Diretrizes Curriculares do Curso de Arquitetura e Urbanismo, mesmo contra a vontade de muitos colonizados que consideram irrelevante tal obrigatoriedade, procurando diluir seus conteúdos em programas de outras disciplinas.
Em greves anteriores, me prontifiquei para acompanhar repórteres numa visita por alguns edifícios do campus, justificando o motivo das paralisações. Naquela ocasião, ouvi que tal visita “não estava na pauta”. Estamos diante dos efeitos acumulados de anos de descaso e abandono.
A situação atual demanda a necessidade imediata de verbas públicas para manutenção básica do patrimônio edificado, proporcionando condições mínimas para continuidade das atividades realizadas em seus diversos imóveis, alguns deles tombados como patrimônio cultural: o antigo Hospício Pedro II, na Urca; o Hospital Escola São Francisco de Assis, no Centro; o Museu Nacional, na Quinta da Boa Vista, que necessita muito mais do que a recuperação do edifício principal, mas também de instalações dignas para abrigar alunos, técnicos e professores; o edifício do IFCS, atual alvo de propaganda eleitoral municipal, com chancela da administração superior da Universidade.
Se o Governo Federal dispõe de significativas verbas para emendas parlamentares, certamente algumas delas poderão ser destinadas para edifícios públicos federais no estado do Rio de Janeiro, principalmente aqueles destinados à Saúde e Educação, incluindo também um quinhão da polpuda verba destinada à campanha eleitoral de 2024. Tais verbas poderão ser, inclusive, aplicadas de forma relevante como auxílio ao povo gaúcho, nesse grave momento de sua história como contribuição voluntária parlamentar, abdicando de parte destes recursos destinados às suas próprias campanhas.
Retornando à oferta municipal em relação ao IFCS, a Carta de Veneza indica, em seu art. 9º, que “A restauração é uma operação que deve ter caráter excepcional”. Esse tipo de intervenção necessita de amplo detalhamento das condições do objeto, incluindo análise de sua estrutura vertical e horizontal, instalações elétricas com aumento de capacidade de carga, instalações hidráulicas e para novas tecnologias de informação, acessibilidade, estado de conservação do acervo e mobiliário.
É indispensável uma avaliação das condições da cobertura e o mapeamento criterioso de danos de toda a edificação para definição de cronograma e orçamento, se for considerado estável em relação à estrutura.
A fachada e o volume atuais da edificação foram muito modificados ao longo do tempo e dos diversos usos pelos quais passou a construção, desde a Academia Militar, passando pela Escola Politécnica, até a implantação do IFCS em suas dependências, necessitando de uma avaliação interdisciplinar para tomada de decisões projetuais.
O arquiteto e urbanista Rapha Pinheiro, graduado pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU), mestre em Mídias Criativas pela Escola de Comunicação (ECO), documentou as mudanças do prédio em quadrinhos, material que pode ser consultado em https://conexao.ufrj.br/2022/06/role-ufrj-4-instituto-de-filosofia-e-ciencias-sociais-ifcs/
Certamente seus usuários se importam muito mais com a resolução de sérios problemas de funcionamento cotidiano do edifício, incluindo a salubridade e segurança dos frequentadores, do que uma “restauração de fachada”, intervenção proposta pela prefeitura, mais aparente aos olhos do público em geral, com responsabilidades transferidas, enquanto tantos outros edifícios da universidade se encontram em situação crítica, ameaçando a integridade física da comunidade.