Em 19 de setembro comemora-se, no Brasil, o Dia Nacional do Teatro, instituído pela Lei 13442/2017, que tinha como objetivo tornar as atividades teatrais cada vez mais acessíveis e inclusivas para todo tipo de público.
Desde 1961, por iniciativa do Instituto Internacional do Teatro, se comemorava o Dia Mundial. Considerando que as atividades teatrais são manifestações artísticas que remontam à aurora do homem, foram milênios até receber a merecida homenagem, que os gregos dedicavam a Dioniso.
No Brasil, o teatro convencional surgiu no século XVI, produzido pelos padres Jesuítas como ação de catequese e demonstração de fé junto aos povos nativos, sem uma edificação destinada exclusivamente para apresentação dos autos e peças, a maioria escrita pelos próprios religiosos.
A partir da chegada da Família Real, em 1808, houve uma grande transformação da vida urbana, quando algumas edificações construídas para finalidades específicas começaram a ser valorizadas.
Já existiam alguns teatros na colônia, como a Casa da Ópera, em Vila Rica (depois Ouro Preto). No Rio de Janeiro, alguns edifícios precários eram utilizados para encenação de peças curtas, com pouco interesse da população, mas foi D. João quem assinou um decreto incentivando a criação de teatros para atender aos “patrícios” instalados na antiga capital do Vice-Reino.
Uma das primeiras peças que revelavam o universo nacional foi “O Poeta e a Inquisição”, de Gonçalves de Magalhães, protagonizada pelo ator João Caetano, em 1838.
João Caetano é considerado o “pai do teatro brasileiro”, trabalhando como ator, produtor, incentivador, recebendo inclusive um dos mais importantes edifícios teatrais para administrar: o Real Teatro São Pedro, no mesmo local onde foi construído, no século XX, o teatro que recebeu seu nome e ainda se encontra em funcionamento, na Praça Tiradentes, objeto de matéria deste jornal.
A cidade do Rio de Janeiro, a partir do final do século XIX, com a valorização da vida urbana como atividade de lazer, passou a incentivar a construção de edifícios teatrais. No entanto, sem a luz elétrica, utilizando a iluminação de velas ou lanternas, ocorriam muitos acidentes e incêndios, alguns deles com vítimas.
Com a melhoria do abastecimento, gradativamente a energia atingia os estabelecimentos de lazer, como sorveterias, confeitarias, teatros e os cinemas, que começaram na última década dos oitocentos.
Muitos foram os teatros construídos na cidade, alguns deles de grande qualidade artística e funcional, como o Teatro Municipal, inaugurado em 1909, inspirado no Opera de Paris.
Em 1942, o pintor Eliseu Visconti, autor do pano de boca do Municipal, doou à municipalidade estudos desenvolvidos por ele para a decoração daquele teatro. Surgia a ideia do Museu dos Teatros, criado efetivamente em 1949, instalado no Salão Assírio no térreo do Teatro Municipal, permanecendo ali até 1976.
Em 1977 foi transferido, incialmente em caráter provisório, para um novo endereço, na Rua São João Batista 103/105, que recebeu um projeto de adaptação de duas casas geminadas, com fachadas ecléticas, unificadas para receber o acervo, composto de pinturas, desenhos, figurinos, programas e outros itens relacionados à atividade teatral.
Ao longo do século XX, surgiram outros teatros, para públicos e representações diversificadas, principalmente a partir da década de 1950, se expandindo para outras regiões da cidade, ampliando o acesso da população.
Entre os principais exemplos destaca-se o Teatro Armando Gonzaga, localizado em Marechal Hermes, subúrbio da Central, projetado pelo arquiteto Affonso Eduardo Reidy, notável profissional, representante da arquitetura moderna brasileira, com a participação de outros expoentes como o paisagista Burle Marx.
Reidy foi autor, entre outras obras, do Museu de Arte Moderna-RJ, dos conjuntos do Pedregulho e Marquês de São Vicente, integrante da equipe multidisciplinar responsável pelo Aterro do Flamengo e grande estudioso das novas tendências arquitetônicas que revolucionaram o século XX.
O Teatro Armando Gonzaga está localizado à Av. General Oswaldo Cordeiro de Farias, próximo à igreja de Nossa Senhora das Graças, a cerca de 700 m da estação ferroviária.
Com cerca de trezentos lugares, foi inaugurado em abril de 1954, durante a gestão municipal de Dulcídio do Espírito Santo Cardoso, inspirado em uma lei sugerida por Paschoal Carlos Magno para levar a cultura aos subúrbios cariocas. A denominação homenageava o jornalista e teatrólogo Armando Gonzaga, falecido no ano anterior.
Funcionário da prefeitura, Reidy defendia a importância social do arquiteto e da arquitetura com instrumento de educação, por isso deveria apresentar projetos de qualidade igualitária, para quaisquer classes sociais, com ênfase na educação, esporte e cultura, como ocorrera no Conjunto do Pedregulho, de sua autoria em conjunto com a engenheira Carmem Portinho.
O projeto para esse teatro reúne um criterioso partido arquitetônico onde forma e função dialogam com clareza e objetividade. Além disso, a obra recebe contribuição de dois notáveis artistas, presentes em outros marcos construídos da modernidade. O edifício conta com painéis do artista plástico Paulo Werneck e um pano de boca desenhado por Burle Marx, também responsável pelo paisagismo original do entorno da edificação.
A planta adota uma separação clara de setores, distribuídos de modo a permitir um fluxo sem cruzamentos de público, funcionários e atores.
A volumetria facilita a iluminação e ventilação de alguns setores, além de contribuir para uma solução acústica adequada, valorizando a disposição de palco e plateia, considerando-se as condições disponíveis naquela ocasião.
A utilização do concreto armado nas lajes inclinadas em sentidos opostos, separa visualmente as funções dos blocos, numa ousada concepção plástica que se popularizou em muitos exemplares da arquitetura moderna brasileira. O acesso principal é marcado por uma laje grande e delgada, apoiada em pilaretes, que protegem a bilheteria.
Reidy desenvolveu um projeto que procurava contemplar o programa de necessidades inserido em uma obra com notável qualidade estética, contando com a colaboração de outros artistas que participaram da consolidação da arquitetura moderna no Brasil
A obra foi tombada pelo INEPAC em junho de 1989, protegendo um marco arquitetônico, artístico e cultural, representativo de um momento único quando a arquitetura brasileira era uma referência internacional.