No último dia 21 começou o verão, a estação mais amada pelos cariocas e turistas da nossa cidade. Conhecido pelas altas temperaturas, ele trouxe consigo uma frente fria que não demorou a dar lugar ao sol. Assim, logo nos primeiros dias de 2023, os termômetros registraram calor superior aos 35ºC, o que passou a preocupar muita gente. Enquanto para alguns o verão é sinônimo de férias e praia, para boa parte da população ele representa possível perigo e risco de danos pela inação do Poder Público.
É simples saber o porquê. As altas temperaturas intensificam a evapotranspiração e a formação de nuvens, que devolvem a umidade à superfície em forma de chuva, geralmente em grande volume. É uma relação de causa e efeito simples, já bem conhecida pelas grandes cidades mas que segue fazendo estragos.
O adensamento populacional dos bairros cariocas, com crescimento desordenado e sem planejamento, piora o cenário. O avanço significativo da expansão imobiliária sobre as paisagens naturais e os corpos hídricos, sobretudo na Zona Oeste, pioram o efeito devastador. Com boa parte dos nossos rios totalmente canalizados, sem mata ciliar, assoreados e/ou sofrendo com o grande acúmulo de lixo, as águas das chuvas não têm para onde escoar. É por isso que tão frequentemente os noticiários estampam o choro e lamento de famílias inteiras que perdem tudo para as enchentes.
Em resposta às tragédias anunciadas, a Prefeitura apresentou o Plano Verão, que prevê uma série de medidas preventivas para “resolver problemas estruturais da cidade, um esforço para minimizar os impactos das chuvas mais fortes”. Segundo o próprio prefeito Eduardo Paes, ele abarca a realização de 235 obras para a contenção de encostas, a dragagem de rios e a limpeza de ralos em toda a cidade, entre outras medidas, que totalizam o investimento de R$ 1,2 bilhão. A quantia é infinitamente maior do que a destinada a esse fim pela gestão Crivella, período em que a Geo-Rio e a Rio Águas agonizaram. Assim, o atual governo encontrou quadro ainda mais catastrófico e carente de respostas urgentes quando assumiu.
Paes destacou que a maioria das intervenções programadas para este verão acontecerão na Zona Oeste, que receberá cerca de 112 obras. Isto representa 49,15% do total do previsto pelo plano para a cidade, o que é justo pela extensão territorial e número de habitantes que aqui moram. É também nesta região que encontramos o maior índice de vulnerabilidade social causada pelas enchentes. Exemplo disto é o loteamento Jardim Maravilha, localizado no bairro de Guaratiba, que todo ano sofre com os alagamentos. Ali, em área de várzea equivalente à Copacabana, vivem mais de 30 mil pessoas.
Já para o restante da cidade, o prefeito anunciou o seguinte número de ações: 81 na Zona Norte (35,04%), 31 na Zona Sul (14,95%) e 11 (0,85%) no Centro. Entretanto, ao investigar a localização daquilo que foi anunciado e executado pelo Poder Executivo para o Plano Verão 2022/2023, identificamos uma desigualdade no andamento dessas intervenções.
Embora a Zona Oeste lidere o percentual de obras anunciadas, ela foi a mais negligenciada na agilidade dos trabalhos na comparação com as demais regiões.
No mapa acima, divulgado em novembro de 2022 pelo Escritório de Dados da Prefeitura do Rio de Janeiro, percebe-se que a maioria das intervenções entregues ou com previsão de conclusão até o final de 2022 estavam localizadas na Zona Norte, Zona Sul e Centro. Enquanto isso, a Zona Oeste, principalmente na Área de Planejamento 5 (que possui os bairros mais populosos), apresenta previsões de entrega somente para final de 2023, isso sem falar nas obras que ainda estão em fase licitatória. Sendo assim, o Plano Verão para esta área da cidade é, na verdade, para 2024. Isso significa mais um ano em que as famílias que aqui moram continuarão aflitas a cada previsão de chuva.
Por este motivo, nosso mandato está organizando o Diagnóstico dos Rios da Zona Oeste, a ser divulgado ainda neste primeiro semestre de 2023. Nele, averiguamos o andamento das obras e a atual situação dos corpos hídricos a partir de visitas efetuadas ao longo do mês de dezembro. Fomos a cerca de 40 deles espalhados pela AP4 e AP5, orientados pelo documento da Rio Águas “Rio de Janeiro: um manual dos rios, canais e corpos hídricos da cidade do Rio de Janeiro”, de 2020. Tal publicação apresenta a listagem dos rios da cidade de acordo com suas três macrorregiões drenantes. Nosso dossiê procura, além de investigar os pontos de alagamento, apontar as reformas estruturais necessárias e acompanhar de perto todo o desenrolar das obras para cobrar a Prefeitura.
Ao descortinar o Plano Verão 2022/2023, conseguimos apresentar a real situação da desigualdade na cidade, por vezes maquiada por números extravagantes que induzem ao erro. Se a Zona Oeste é a que mais necessita de obras de urgência, porque os trabalhos por aqui avançam a passos de tartaruga? Não há lógica nisso, principalmente quando tais ações miram a minimização dos impactos das chuvas deste verão. A verdade é que, com isso, por mais um ano, a região mais populosa do Rio ficará à mercê das prováveis enchentes. Precisamos de um planejamento estratégico, eficaz e de aplicação imediata, que não esteja condicionado a alguns meses do ano, para garantir de vez a segurança, o patrimônio e a qualidade de vida dos moradores.