Ziraldo: entre os dizeres, os fazeres e a Cultura

A historiadora Thatyana Sant'Anna fala sobre Ziraldo e sua ligação com jornalismo, literatura e arte.

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A data de 7 de abril é registrada, em calendário nacional, como dia do jornalista, que possui notória e relevante atribuição, ao longo dos séculos, desde a criação da imprensa, não só para a garantia de acesso à informação, como fonte histórica para a pesquisa e conhecimento dos contextos e cotidianos. A data remete ao infortúnio do assassinato de Giovanni Battista Líbero Badaró, jornalista, que, nascido na Itália, estabeleceu-se no Brasil, em 1826, fundando o jornal Observador Constitucional, que, em suas pautas e colunas, denunciava abusos de autoridades, nos tempos imperiais brasileiros de D. Pedro I.

O dia do jornalista significa profícuo momento para não permitir esquecer e invocar reflexões sobre a nobre função destes profissionais e colaboradores da imprensa que possuem lugar eloquente para a informação, conhecimento, entretenimento e se consagra como força motriz vitalícia não só para os dizeres, mas também para os não esqueceres. Tal qual, Peter Burke compreende a função do historiador como “lembrar a sociedade daquilo que ela quer esquecer”, o jornalista representa o grão de areia na concha que, por vezes, pode trazer incômodos, mas conflui para a majestosa e bela pérola que corrobora para a compreensão e permite legado aos fatos que propiciam futuras histórias do passado.

O papel importante da imprensa, ora, atualmente, expandida, em seu espaço comunicador, ao império do virtual, foi reconhecida por D. Pedro II em sua função, o qual oportunizou o alargamento da liberdade dos jornalistas e da imprensa no Brasil imperial sob sua condução. José Murilo de Carvalho, imponente historiador brasileiro, registrou que observadores desta terra e do velho continente acompanhavam, com estranheza, a liberdade dos jornais e da imprensa no Império brasileiro à época de D. Pedro II.

Em 6 de abril, Brasil se despediu de Ziraldo Alves Pinto, que entre riscos e escritos contribuiu para imprensa, para a literatura, para a arte viva de desenhos e personagens, como o menino maluquinho, influenciando produções diversas que ficam como exuberante legado de relevância para a cultura e imprensa.

Os feitos singulares de Ziraldo ganharam as páginas das revistas A Cigarra e O Cruzeiro e caminharam para a notável contribuição no Jornal do Brasil, em 1963. As revistas em quadrinhos, com a Turma do Pererê, marcaram a produção cultural brasileira, enquanto a primeira revista em quadrinhos ilustrada colorida e produzida por um único autor. Suas obras, conjugando feitos e feitios, reuniram diferentes gêneros literários, da imprensa às charges, consagrando-se na literatura infantil brasileira, chegando a produções no cinema e na televisão.

Ziraldo, entre a grafia irreverente, comprometida, convergindo nos rios de cultura, águas doces e salobras, agraciando a cultura brasileira, entre humor e polêmica, com a arte que chega a distintos públicos e faixas etárias.

A imprensa foi agraciada com a contribuição de Ziraldo e outros cartunistas em um tabloide semanal, O Pasquim. As publicações do tabloide duraram poucos anos, no contexto da ditadura militar no Brasil e sua perseguição aos escritos contrários da época. As páginas do tabloide estão preservadas no acervo da Biblioteca nacional, sendo possível acessar digitalmente, no compromisso não só com a preservação arquivística, mas com a pesquisa e com o conhecimento. A institucionalização, nesta época histórica em terras brasileiras, do Ato Institucional Nº 5, em seu violento e presunçoso ato auspicioso ao calar letras contrárias, levou à prisão de Ziraldo, como de muitos jornalistas e artistas.

O Pasquim Ziraldo: entre os dizeres, os fazeres e a Cultura
Reprodução

Ziraldo, reconhecido e premiado literato brasileiro, premiado nacionalmente e internacionalmente, deixa seu legado glorioso que foi cantado e teatralizado no carnaval, grande festa carioca, pela Escola de Samba Tradição, composto por Darlan Alves, Emerson Sam, Rodrigo Jacopett e Zé Gomes, instituindo novo verbo, o “Ziraldar”:

Nesta noite de magia, a alegria está no ar
Meu condor vai pra folia
Abre o livro e faz sonhar
No universo encantado vem comigo viajar
No pulsar da batucada vamos todos “ziraldar”
Da infância em Caratinga
Trouxe a arte como herança
Desenhando fez a vida
Ter a cara de criança
Do gibi para o cinema chega ao mundo virtual
“Comequieto” esse mineiro…é orgulho nacional

O “comequieto” fazia analogia a sua naturalidade mineira, como famoso dito popular associado aos mineiros, que permite alusão àquele que discreto no agir, prossegue em sobriedade e conquista em mistério. Sem o compromisso legítimo ao termo, vale o registro de que esse vocábulo já fez analogia à calçados dos mais antigos na História e muito conhecidos como alpargatas, pois com solado fino, e pouco válidos aos nobres, servia de pisante a muitos sujeitos históricos de pouco status e recursos. Entre os substantivos do pisante alpargatas, atualmente entra na concepção da estética que seduz a muitos transeuntes, já fora associada à semântica da palavra que alguns registros se referem ao fato de fazerem pouco barulho.

À dimensão dos sons, a Imprensa e Ziraldo, fazendo uso da intrépida sagacidade do “comequieto” e logo deixaram suas vozes e artes gritarem e permitirem o eco longevo da liberdade das palavras e das expressões artísticas em suas compromissadas, divertidas e meritosas feituras. O Diário do Rio de Cultura emerge para ecoar as vozes da Imprensa, da História e da Cultura.

Um brinde incessante aos jornalistas e à imprensa, em seu fundamental compromisso para a compreensão da realidade, neste e em tempos de outrora, e ao eternizado Ziraldo, que surpreende ao transitar por distintas e multifacetadas trilhas da escrita e das artes, ensinando a fluidez dos caminhos em liberdade para a comunicação e ação criativa.

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