Mercado financeiro não é gente, mas reage como se fosse. Tem humor (em geral mau), fica nervoso, vive de altos e baixos. É elitista: não quer saber das pessoas pobres, da fome e da miséria.
O mercado parece residir nos imponentes prédios das bolsas de valores do mundo inteiro, mas mora mesmo é no pregão da especulação.
É um tanto parasita: nessa etapa do capitalismo financeirizado, não produz nada de material, mas se alimenta dos títulos e “ações” (isto é, papéis) das grandes empresas transnacionais.
O mercado não é um ser humano, mas tem células que alimentam enormes ganhos para quem nele investe. É movido a ganância, em seu afã de lucros. Volta e meia, revela seus segredos para alguns privilegiados e faz gente (aí sim) ganhar rios de dinheiro da noite para o dia. Alguns outros, desavisados, perdem.
O mercado tenta enquadrar governos, indicar ministros, seduzir parlamentares de todos os partidos (o partido do mercado é o do lucro máximo).
O presidente eleito Lula indagou em Brasília ontem (10), corretamente, “por que a gente tem meta de inflação, mas não tem meta de crescimento?”. Ao contestar o dogma da “tal estabilidade fiscal”, perguntou e respondeu: “sabe qual é a regra de ouro? Garantir que nenhuma criança vá dormir sem um copo de leite e acorde sem ter um pão com manteiga para comer todo dia. E questionou: “Por que o povo pobre não está na planilha da discussão da macroeconomia?”.
Lula, que é gente e tem uma história de vida de admirável superação, chorou ao falar da volta da fome ao país e de sua missão prioritária de combatê-la.
Já o mercado não chora: é frio, calculista e, muitas vezes, cruel. Bastou uma simples fala sincera e de agudo sentido social do presidente eleito para o dólar subir 4%. Teve gente que se refestelou. Lula reclamou: “o mercado fica nervoso à toa”. E emendou: “engraçado que o mercado não ficou nervoso nos quatros anos de Bolsonaro…”.
Nesse planeta do colapso climático e ambiental, e de tanta desigualdade social, é preciso caminhar para um novo modelo econômico mundial, onde falar de medidas contra a pobreza não sirva de motivação para o grande Capital especular ainda mais.
Os “paraísos fiscais” são o inferno da maioria da população pobre do mundo e têm que acabar. Os nababos que vivem no luxo de seus ganhos financeiros não podem barrar políticas sociais urgentes e necessárias.
*Chico Alencar é professor, vereador (PSOL) e deputado federal eleito pelo Rio de Janeiro