Nesta quinta-feira, 12/09, foi realizado pelo Museu Nacional, na Quinta da Boa Vista, um evento que concretizou a repatriação do Manto Tupinambá que estava fora do Brasil há mais de 300 anos. Na cerimônia, lideranças indígenas cobram do Governo Federal demarcações de terra.
Além dos tupinambás de Olivença, na Bahia, estiveram presentes no evento o presidente da república Luiz Inácio Lula da Silva, a ministra dos povos indígenas, Sônia Guajajara, e outros representantes dos governos federal, estadual e municipal.
“Recontar a história desse povo através do manto sagrado“, disse Jamopoty, a primeira cacique mulher dos tupinambás de Olivença, filha de Amotara, a indígena que viu o Manto Sagrado Tupinambá em 2000, em decorrência dos 500 anos do Brasil, e desde então passou a mobilizar os povos originários para trazê-lo de volta.
O Manto Tupinambá. Foto: Ricardo Stuckert/Presidência da República
Durante a cerimônia na Quinta da Boa vista, a anciã Yakuy criticou os trâmites de devolução do manto e defendeu que seja alocado oficialmente no território tupinambá, na Bahia. A anciã também se posicionou contra a tese do marco temporal e cobrou mais medidas de demarcação de terras indígenas.
“Nossas reivindicações são: retorno do manto para aldeia mãe Olivença [município no litoral baiano], construindo um museu de arte tupinambá; exigimos o respeito e a garantia dos nossos direitos; autonomia do Ministério dos Povos Indígenas, reestruturação da Funai; anistia e reparação aos povos indígenas e africanos; não ao marco temporal, demarcação já”, disse.
No evento, o presidente Lula declarou que há uma luta política difícil para avançar nos direitos dos povos originários e criticou a tese do marco temporal. Contudo, garantiu que vai conversar com Ricardo Lewandowski, atual ministro da Justiça e Segurança Pública do Brasil, para tratar dessa questão.
Em relação ao manto tupinambá, Lula defendeu que o Museu Nacional seja considerado como um abrigo temporário, e que sejam criadas condições para a transferência do objeto sagrado ao território indígena na Bahia. O presidente também afirmou que o Governo tem colocado as questões indígenas como prioritárias e citou a criação do Ministério dos Povos Indígenas.
A história do Manto Tupinambá
O Manto Tupinambá chegou a Copenhague, na Dinamarca em 1689. Estudos apontam que ele deve ter sido produzido quase um século antes. Ele tem 1,80 metros de altura e milhares de penas vermelhas de pássaros guará, espécie que existia em abundância no Brasil e hoje está restrito à certas localidades do país.
Como muitas outras riquezas originárias das Américas, o Manto Tupinambá circulou no comércio atlântico até ficar na Europa e por lá passar por muitos locais até ficar na Dinamarca. Tratados como objetos exóticos e de coleção, maioria dos mantos chegou ao continente europeu através de saques.
O processo de devolução do Manto foi anunciada em junho de 2023, após quase um ano de negociações entre as instituições do Brasil e da Dinamarca. A peça chegou ao Brasil no dia 11 de julho deste ano.
No ano 2000, foi realizada a Mostra do Redescobrimento, Brasil 500 Anos, no Parque Ibirapuera, em São Paulo. Na ocasião, o Manto Tupinambá foi exposto.
“Quando Amotara viu o manto, em 2000, ela reconheceu ele e ele reconheceu ela. É nosso ancião mais antigo, uma força para nós. Existem outros mantos, mas esse é dos tupinambás de Olivença“, contou a cacique Jamopoty.
Um grande número de tupinambás da cidade de Olivença chegou ao Rio de Janeiro no início desta semana para visitar o Manto e realizar celebrações em torno de seu ancião mais antigo.
Foto 1: Caciques e demais lideranças/ Foto 2: marcha tupinambá no acampamento na Quinta da Boa Vista . Imagens: Felipe Lucena
“O manto é um ancestral vivo e encantado. Para quem não é indígena fica difícil de entender isso. Mas é um parente nosso, um dos mais velhos e ele nos dá força para seguir em frente com nossas lutas e nossa cultura“, declarou o Cacique Acauã.
Vídeo: Felipe Lucena
No Museu Nacional da Dinamarca existem outros quatro mantos além do que foi devolvido ao Brasil. Existem, ainda, mantos tupinambás no Museu das Culturas, em Basileia (na Suíça); no Museu Real de Arte e História, em Bruxelas (na Bélgica); Museu du Quai Branly, em Paris (na França); e na Biblioteca Ambrosiana de Milão (na Itália).