As imagens são assustadoras e correram a internet, os aplicativos de mensagem. Uma voz masculina narra um passeio por um solo rachado, totalmente seco. Ao fundo um pequeno avião aterrissa e não deixa dúvidas: estamos vendo a área que há seis meses era um enorme lago no Parque Natural Municipal Bosque da Barra, na Zona Oeste do Rio. O cenário, desolador, remete às grandes catástrofes ambientais que pipocam mundo afora. Dessa vez, 27 jacarés-de-papo-amarelo estão entre as espécies impactadas.
O sumiço do lago principal do Bosque – e a secura, ainda que não total, dos outros 5 – tem origem em meados de julho. Na ocasião, a gestão da unidade, vinculada à prefeitura, reparou que uma obra da concessionária Iguá Saneamento, em terreno que ladeia o da unidade de conservação, poderia ter a ver com o fenômeno. Logo ficou evidente a conexão: a Iguá estava realmente rebaixando o lençol freático para as intervenções de ampliação de sua Estação de Tratamento de Esgotos Sanitários. Os belos lagos foram sumindo, sumindo… Até que o alerta foi ligado.
Deu um rebuliço danado, pois ninguém sabia de onde vinha essa autorização específica. O órgão licenciador, o Instituto Estadual do Ambiente (Inea), afirmou que jamais autorizou rebaixamento de lençol freático – captação, condução e despejo das águas existentes no subsolo, permitindo a execução de serviços. A Secretaria Municipal do Ambiente e Clima solicitou o fim do bombeamento. Ao que consta, foi atendida. Mas por um breve período. O problema persistiu, mas pouca gente deu bola – as eleições estavam chegando.
Em 6 de setembro, a Agenersa, agência reguladora de saneamento do Estado do Rio, verificou falhas nas obras e funcionamento da Estação de Tratamento de Esgotos da Barra da Tijuca, operada pela concessionária Iguá. A planta é colada ao Bosque da Barra. Atenção ao que diz Frederico Menezes, gerente de Projetos da Câmara de Saneamento da Agenersa:
“Encerramos a visita técnica à Estação de Tratamento de Esgoto Barra da Tijuca, mas sem o projeto executivo e a licença ambiental em mãos, o principal apontamento que fizemos in loco é a ETE ser totalmente desviada (by-pass) e não estar fazendo o devido tratamento, além das elevatórias recalcarem direto para o emissário submarino, sem passar pela elevatória final da estação, situação que aumenta o risco de extravasamentos. Em nosso entendimento técnico, a reforma deveria acontecer por etapas para não desativar tudo simultaneamente. Faremos em conjunto com a equipe da agência, o ofício que será encaminhado, posteriormente à Iguá. Nesse documento também iremos solicitar a licença de obra e o cronograma”.
O inacreditável jogo de empurra, o pouco caso diante do problema tem uma origem: a falta de gestão ambiental no Rio de Janeiro. É imperativo que Prefeitura, Inea e Agenersa cheguem a um bom termo para que uma solução ocorra o quanto antes. Causa espanto a morosidade de ação. Está evidente que houve no mínimo imprudência da concessionária. A Iguá fez um rebaixamento de lençol freático sem comunicar ao Inea? A solução virá em quanto tempo? Quais os danos irreversíveis? Por que a Agenersa nada fez? São muitas as perguntas ainda não respondidas.
Com 54,398 hectares e inserido num local de grande visibilidade – quilômetro seis da Avenida das Américas, na confluência desse eixo com a Avenida Ayrton Senna – o Bosque da Barra foi criado há 41 anos para recuperar e preservar uma série de atributos ambientais de uma região com forte expansão imobiliária. Abriga restingas, brejos, alagadiços com riquezas imensas. O grave episódio não deixa dúvidas: nossas áreas verdes precisam de mais gestão pública, transparência. E concessão sem controle e com regulação fraca é senha para mais dissabores e prejuízos incalculáveis.