“Meu Corpo Está Aqui” é uma peça teatral que instiga e tira o público da zona de conforto desde o início. O espetáculo provoca, diverte, faz refletir e gera emoções diversas. Consegue desafiar e inspirar a repensar as preconcepções sobre deficiência, sexualidade e identidade.
A princípio, a base da peça são as experiências pessoais de alguns PcDs (pessoas com deficiência). São eles: Bruno Ramos, um surdo não oralizado; Haonê Thinar, uma pessoa amputada; Juliana Caldas, que possui nanismo e Pedro Fernandes, com paralisia cerebral mas cognitivo preservado, em uma cadeira de rodas. Cada um deles traz algo único e distinto. Bruno, por exemplo, tem uma expressividade corporal muito potente. Haonê passa verdade. Juliana entrega uma ótima atuação entre a raiva e erostismo. Pedro tem o momento mais poético do espetáculo. As vivências deles ganham fluência a partir do texto e direção de Julia Spadaccini e Clara Kutner, que transitam pelo ficcional e entregam também uma análise de como a sociedade perpetua uma visão distorcida desses corpos. Um dos exemplos é quando abordam (e explicam) “Branca de Neve e os Sete Anões” e seu dessserviço.
O espetáculo prima por ter muita autenticidade e aborda sem constrangimento ou estereotipos o afeto e a sexualidade em corpos PCDs. Inclusive, uma das conqusitas de “Meu Corpo Está Aqui” é o de levar PCDs para a plateia. Assisti em uma noite de domingo (29/10), e estava lotado, com fila de espera inclusive. Grande parte era de pessoas com algum tipo de deficiência. Contudo, a peça, inclusive, faz pensar, afinal, quem é que não tem alguma deficiência perante a uma sociedade tão cruel e padronizadora? É bom e necessário ver um tema como esse que é raramente explorado dessa forma, sem viajar entre o coitadismo, ou pelo grotesco, ou pela santidade. É sobre humanidade.
Elementar
“Meu Corpo Está Aqui” incorpora elementos de ficção para envolver o público de uma forma reflexiva. Ele destaca as semelhanças que todos compartilhamos, que muitas vezes são obscurecidas pela ignorância e pelo preconceito. Pessoas com deficiência vivem vidas plenas, e esta peça desafia a noção de que precisam ocultar suas histórias, desejos e experiências.
Tudo se eleva e se transmuta na iluminação de Paulo Cesar Medeiros em comunhão com a concepção cênica e indumentária de Beli Araujo. Sob a maestria da direção de movimento de Laura Samy. Nesse ambiente repleto de cores e sensações, a sinergia entre todos esses elementos se funde em uma experiência hipnotizante, a qual transporta o espectador para um mundo onde a positividade e a arte se entrelaçam em um espetáculo inesquecível.
A peça ainda por cima conta com um quinto elemento que merece muitos elogios. Quando fui era Jadson Abraa?o, que interpretava tudo para libras e também de libras para o oral quando necessário. Ele não faz isso mecanicamente, mas sim com uma capacidade expressiva incrível. É um show à parte.
“Meu Corpo Está Aqui” tem apenas 60 minutos. Passa rápido, contudo, ao mesmo tempo, parece mais longo, pela quantidade de coisas que traz. Como tenho bastante sorte ainda presenciei um debate com elenco, as diretoras e Cristiane Muñoz depois da apresentação no dia em que fui.
Em suma, “Meu Corpo Está Aqui” é uma peça teatral ousada que oferece uma visão profundamente comovente da experiência humana e permite trabalhar a ressignificação.
Servic?o
Teatro Gláucio Gill
Praça Cardeal Arcoverde, s/nº, Copacabana, RJ
Próximo a Estação Cardeal Arcoverde do Metrô Rio
Estreia: 07 de outubro de 2023
Temporada: 07 a 30 de outubro de 2023
Sábados e segundas às 20h e domingos às 19h
Ingressos: R$40,00 (inteira) e R$20,00 (meia)
Bilheteria: Segunda a sexta a partir das 16h, sábado e domingo a partir das 14h
Vendas antecipadas online: https://funarj.eleventickets.com
Classificação indicativa: 16 anos
Ficha técnica
Texto: Julia Spadaccini e Clara Kutner
Direção: Clara Kutner e Julia Spadaccini
Elenco: Bruno Ramos, Haonê Thinar, Juliana Caldas e Pedro Fernandes
Direção de Produção e Coordenação Geral do Projeto: Claudia Marques
Diretor Assistente: Michel Blois
Produção: Fabricio Polido
Pesquisa de dramaturgia: Marcia Brasil
Colaboração de texto: Bruno Ramos, Haonê Thinar, Juliana Caldas e Pedro Fernandes
Figurino e Cenografia: Beli Araujo
Iluminação: Paulo Cesar Medeiros
Direção de Movimento: Laura Samy
Música: Luciano Camara
Visagismo: Cora Marinho
Assessoria de Imprensa: Ney Motta
Programação Visual: Felipe Braga
Fotografia: Renato Mangolin
Redes Sociais: Rafael Teixeira
Audiodescrição: Graciela Pozzobom
Intérpretes de Libras: Jadson Abraão e Thamires Alves Ferreira
Realização: Fábrica de Eventos