Publicamos aqui no DIÁRIO DO RIO que já tem gente planejando um carnaval para quando o Coronavírus passar. Goste ou não da ideia tem gente levando a sério e festejar depois de passar por momentos difíceis é algo muito como ao ser humano. Inclusive, algo muito semelhante já aconteceu no Rio de Janeiro. Em 1919.
A Gripe Espanhola matou, no mundo, entre 50 e 100 milhões de pessoas – os números não são precisos por conta da época. No Rio de janeiro foram, segundo o Instituto Butantan, 12.700 de óbitos.
Como o pico de casos no Brasil foi no final de 1918, quando o problema foi controlado, já no início do ano seguinte, o Carnaval foi um acontecimento histórico.
“Uma outra cidade ia nascer”, escreveu Nelson Rodrigues: “Toda a nossa íntima estrutura fora tocada, alterada e, eu diria mesmo, substituída. Éramos outros seres e que nem bem conheciam as próprias potencialidades. (…) A espanhola trouxera no ventre costumes jamais sonhados. E, então, o sujeito passou a fazer coisas, a pensar coisas, a sentir coisas inéditas e, mesmo, demoníacas”.
Após o medo de morrer de Gripe Espanhola, as pessoas foram para a rua com tudo. Nas festas de rua ou nas festas de clubes, todos bebiam e cantavam como se não houvesse amanhã.
As ruas foram, novamente, tomadas por pessoas felizes, sem medo. O comércio reabriu. Era festa em todo canto. Música em qualquer lugar. Até quem não gostava pulou carnaval naquele ano.
A caipirinha surgiu nessa época. Os médicos, além de canja de galinha, indicavam limão e canela. Em pouco tempo, a cachaça era usada para potencializar os efeitos. O remédio, usado para conter a Gripe, virou febre no Carnaval do ano seguinte.
Assis Valente escreveu a famosa música à época, que traduz bem o sentimento geral do povo: “Pensei que o mundo ia se acabar/ E sem demora fui tratando de aproveitar/ Beijei na boca de quem não devia/ Peguei na mão de quem não conhecia/ Dancei um samba em traje de maiô/ E o tal mundo não se acabou… / Ih! Vai ter barulho e vai ter confusão/ Porque o mundo não se acabou”.
São muitos os livros sobre o tema. “O Carnaval, a peste e a ‘espanhola”, do Ricardo Augusto dos Santos, pesquisador da Casa de Oswaldo Cruz, é um dos mais aclamados.
Estudiosos do Carnaval carioca garantem que nunca houve um carnaval como aquele de 1919.
“O comportamento do homem e da mulher até princípios de 1919 era medieval, feudal ou que outro nome tenha. Psicologicamente, ainda não ocorrera para nós a abertura dos portos. A mulher que ia ao ginecologista sentia-se, ela própria, uma adúltera. E tudo explodiu no sábado de Carnaval. Vejam bem: — até sexta-feira, isto aqui era o Rio de Machado de Assis; e, na manhã seguinte, virou o Rio de Benjamin Costallat”. Nelson Rodrigues, famoso pelos hipérboles, nesse caso estava falando em tom comum. Geral.
Foi o Carnaval mais louco da história. Será que vem mais por aí?
Eu vi um comentário engraçado hoje dizendo que no final da Peste Negra na Idade Média, as pessoas e cidadãos comemoraram e celebraram o fim da epidemia com orgias