Ediel Ribeiro: Beco das Garrafas

Colunista do DIÁRIO DO RIO fala sobre o lendário Beco das Garrafas, um dos espaços mais boêmios do Rio

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A procura de boa música, e, fugindo do tempo feio que fazia no Rio de Janeiro, fomos, eu e a Sheila ao Beco das Garrafas, berço da Bossa Nova, em Copacabana.

Foi bom voltar ali, “onde tudo começou”. Eu não vivi o auge do ‘Beco’. Passei a frequentar o local a partir de 2014, quando o espaço foi revitalizado e reinaugurado depois de passar mais de três décadas fechado.

Voltamos lá para – entre uma e outra caipirinha de tangerina (deliciosa!) – assistir ao show da cantora Sheila Sá e do músico e compositor Marvio Ciribelli e relembrar as histórias e o passado glorioso da Bossa Nova e do Samba-Jazz.

Reduto da Bossa Nova, nos anos 60, o Beco das Garrafas, localizado numa travessa sem saída, no número 37 da rua Duvivier, ainda hoje é o local ideal para os amantes da Bossa Nova e da boa música.

O nome – hoje tombado pela Prefeitura do Rio – foi dado pelo cronista e romancista carioca Sérgio Porto, o Stanislaw Ponte Preta, que junto com Antônio Maria e Vinícius de Moraes, era frequentador assíduo do Beco.

Inicialmente, Sérgio chamou o local de ‘Beco das Garrafadas’, devido à prática dos moradores de jogar garrafas para acabar com o barulho que os boêmios que frequentavam os bares faziam.

Meca da boemia carioca e local de encontro dos músicos da Bossa Nova – movimento musical urbano surgido em 1957 – na época, no local existiam quatro boates, ‘Ma Griffe’, ‘Little Club’, ‘Bacará’ e ‘Bottle’s’, chamados popularmente de “fumaceiros” por serem locais pequenos e fechados, onde a fumaça dos cigarros se propagavam por todo o ambiente.

Entre 1955 e 1958, os irmãos italianos Alberico e Giovanni Campana compraram as boates ‘Little Club’, ‘Bottle´s’ e ‘Ma Griffe’ e passaram a apostar em jovens talentos da música. Em sua maioria, músicos amadores.

No começo, apenas a ‘Ma Griffe’ teve o passado ligado à prostituição. O cenário mudou quando Alberico Campana trouxe do restaurante ‘Au Bon Gourmet’ o grupo ‘Bossa Três’, formado pelo pianista Luís Carlos Vinhas , o baterista Edison “Maluco” Machado e o baixista Tião Neto, para tocar no Little Club.

Com a chegada do ‘Bossa Três’, logo o Beco mudou de cara e começou a atrair boa parte dos talentos da noite carioca. No local se apresentaram grandes nomes da noite do Rio, entre eles a cantora Dolores Duran, de carreira curta e meteórica. Foi no no ‘Little Club’, no ano de 1959, que Dolores fez sua última apresentação, antes de morrer no dia seguinte.

O status do Beco começou a mudar quando a dupla de produtores Miele e Ronaldo Bôscoli apresentaram lá seus “pocket-shows” – pequenas produções onde os dois eram responsáveis por tudo, desde a direção, a iluminação e o som. Os espetáculos eram adaptados para as dimensões do ‘Little Club’, apresentando atrações, como a estreante Elis Regina, em 1961. O primeiro show produzido no Beco das Garrafas pela dupla Miele e Bôscoli foi com o músico Sérgio Mendes.

Grandes nomes do show business americano também já se apresentaram no Beco das Garrafas. Na época, no Hotel Copacabana Palace, vizinho do Beco, funcionava um cassino onde nomes como Ella Fitzgerald, Edith Piaf e Billie Holiday, entre outros, se apresentavam. No final do show, lá pelas 3h da manhã, os artistas saiam do Copacabana Palace e iam para as boates do Beco, onde acabavam dando a famosa ‘canja’.

Ali, também se apresentaram Sergio Mendes, Raul de Souza, Luiz Eça, Luís Carlos Vinhas, Baden Powell, Durval Ferreira, Tião Neto, Manuel Gusmão, Bebeto Castilho, Dom Um Romão, Airto Moreira, Wilson das Neves, Chico Batera, Ronaldo Bôscoli e Miele, entre outros músicos.

Entre os cantores, Elis Regina, Sylvia Telles e Marisa Gata Mansa, Dóris Monteiro, Claudette Soares, Alaíde Costa, Leny Andrade, Wilson Simonal, Elza Soares e Alcione e Jorge Ben Jor.

Leny Andrade (então com 17 anos) , quando estreou no Beco, passava mais tempo no banheiro da boate do que no palco. “O comissário do Juizado de Menores queria me prender de qualquer jeito, mas nunca conseguiu me pegar”, dizia.

O auge do Beco das Garrafas foi entre os anos 50 e 60. Quando Elis Regina fez no ‘Little Club’, em 1964, sua última temporada, boa parte das estrelas já haviam migrado para as grandes casas de shows e para os programas de televisão.

Quase quatro décadas depois, a cantora e produtora Amanda Bravo – filha do lendário Durval Ferreira, compositor, produtor e

autor de clássicos da bossa nova como “Batida Diferente” – e o empresário Sérgio De Martino, com o patrocínio de uma cervejaria, reabriram a casa, em setembro de 2014, com uma programação composta por bandas e artistas do novo cenário da música brasileira.

Vida longa ao Beco das Garrafas!

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Jornalista, cartunista, poeta e escritor carioca. É colunista dos jornais O Dia (RJ) e O Folha de Minas (MG) e Diário do Rio (RJ) Autor do livro “Parem as Máquinas! - histórias de cartunistas e seus botecos”. Co-autor (junto com Sheila Ferreira) dos romances "Sonhos são Azuis" e “Entre Sonhos e Girassóis”. É também autor da tira de humor ácido "Patty & Fatty", publicadas nos jornais "Expresso" (RJ) e "O Municipal" (RJ), desde 2003, e criador e editor dos jornais de humor "Cartoon" e "Hic!"

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