O filho, já embriagado pelas duras palavras do pai, relutava em aceitar a tese de que somos uma nação apenas na época de Copa do Mundo. Fato triste, mas verdadeiro!
“Vamos em frente”, disse o pai ainda sufocado pelo abraço acolhedor do filho, que o envolvia com a bandeira do Brasil. “O sufixo “eiro”, de brasileiro, é denotativo de uma profissão, e não de uma nação. Veja: padeiro, carpinteiro, jardineiro, pedreiro, são algumas delas. Ao contrário, o sufixo de nação é “ano” e “ês”: americano, inglês”!
O pai queria que o filho entendesse por que nós, brasileiros, não temos amor à pátria no sentido de fazer uma nação! O brasileiro não recebeu de seus antecessores o sentido de um orgulho a seu pertencimento. Ele não é portador de uma herança saudável capaz de sustentar o vigor de uma autoestima a partir da qual ele pudesse se orgulhar de ser brasileiro. Caso contrário, o cidadão teria muito orgulho de ser brasileiro, independentemente da época de uma Copa do Mundo!
“Em uma nação, o cidadão ama o seu país. Isso é fato! Além de gozar, de usufruir das oportunidades que ela oferece, ele honra os seus valores soberanos e dignifica sua pátria. O sentido de nação leva em conta a implicação e a responsabilidade que cada um tem para com ela: usufruir dando, ao mesmo tempo, algo de si, contribuindo para que esta se mantenha de cabeça erguida. Aqui, em nosso país, não vemos isso. Vivemos sob o estigma de uma degradação moral e ética. O brasileiro não ama o seu país, não cuida das suas insígnias, tem vergonha de ser brasileiro, não se orgulha da sua origem”.
“O que temos é um país que se oferece a uma exploração sem limites, sem o devido retorno. Quantas centenas de milhares de pessoas vieram para cá ser brasileiro, ganhar muito dinheiro com nossas terras, nossas pedras, rios, florestas… nossa gente! Milhões e milhões, ao longo de séculos, usando o Brasil como profissão, e não como nação. Qual a lei que rege uma cidadania? Poder usufruir, não sem o retorno de algo construtivo. O brasileiro se faz destituir em seus valores próprios de nação”.
As palavras do pai ardiam no peito daquele filho adolescente pleno de ideais. Perplexo, ávido pelos ensinamentos, o filho pedia mais. Esse menino, desde criança, aprendeu a gostar das palavras. As palavras eram sinônimos de poder: vigorosas, elas podiam mover montanhas!
O pai queria transmitir alguma coisa sólida para o filho. O seu desejo era tocar nos problemas estruturais do nosso país. Não temos a humildade de aprender com os nossos erros; sequer conseguimos reconhecê-los. O que temos é uma compulsão ao erro. O caminho mais fértil que o pai encontrou foi falar da importância da humilhação. A partir do sentido da humilhação imposta pela seleção alemã ele sabia que poderia chegar a algum lugar.
Esse pai, que não perdia o tempo das coisas, sabia da magia e exuberância do tempo, da sua crueldade: o tempo dá oportunidades, mas não espera. O Brasil perde o seu precioso tempo, e isso é algo muito doentio! Há um gigante que precisa despertar.
“A humilhação”, disse o pai, “é fundamental falarmos sobre esse ponto; ela é importante, pois tem algo a nos ensinar. Não devemos nos furtar a avançar sobre esse fator. O brasileiro não consegue aprender com a humilhação. Aliás, ele se recusa a ela, ele nega. Há um falso orgulho que tem por função encobrir os seus efeitos. Um país que não se dá a oportunidade de tirar ensinamentos com uma humilhação caminha para o fracasso. A Alemanha, essa grande nação que conhecemos hoje, foi terrivelmente humilhada no passado. Humilhada em todos os sentidos da sua história. Mas ela não se furtou, não virou as costas, acolheu na carne a dor impingida por ela. Isso se deu na época da Primeira e da Segunda Guerra Mundial. Mas eles souberam retirar, daí, um grande ensinamento”.