Fernanda Galvão: Invisibilidade como regra

Galvão comenta sobre o ocorrido durante prova de Enem com um aluno no Espectro Autista, submetido ao deboche dos fiscais e responsáveis

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O ano de 2022 está quase acabando. Duas décadas já avançamos século XXI adentro, mas ainda engatinhamos quando pensamos em representatividade e respeito às diferenças. E não, não falo sobre questões raciais, de sexualidade ou gênero. Mas é preciso falar sobre capacitismo e preconceito contra pessoas com deficiência, em particular com os inscritos no Transtorno do Espectro Autista.

Recentemente, acompanhei o caso de um jovem de 18 anos, portador da Síndrome de Asperger, que foi prestar o Enem. Estudou o ano todo para se preparar, quer fazer Medicina. Sempre foi excelente aluno, mas como não estudou na rede pública, não tem direito a cota, apenas tem direito a fazer a prova em uma sala em separado, além de uma hora a mais de prova. 

Tudo teria corrido como o previsto, não fosse o preconceito.

Ao longo da prova, o aluno foi submetido ao deboche dos fiscais e dos responsáveis pelo local da avaliação. Além de conversas, risos e outras intervenções, o desrespeito foi tal que sequer lhe foi informado o avanço do tempo da prova, pois o fiscal responsável estava tão entretido na conversa com os outros fiscais que esqueceu de marcar o tempo na lousa.

Barulho, risadas, piadas são inconcebíveis em um ambiente de provas e concursos – mas aparentemente são aceitáveis se quem está ali preenchendo as questões é uma pessoa com Asperger. Concentração para a prova? Desnecessário, pelo visto.

O aluno saiu da prova em crise nervosa e de ansiedade. E é isso.

De nada adianta promovermos ações como Abril Azul, de conscientização para o TEA, ou qualquer outro “mês colorido”, se a sociedade segue segregadora, capacitista, preconceituosa. Quando pessoas em funções públicas se deixam governar pelos próprios preconceitos e ignoram noções mínimas de civilidade. O aluno sabe, qualquer pessoa com deficiência aprende desde cedo, a sociedade os vê como incapazes ou menores. Prova mais clara disso vemos durante as transmissões das Paralimpíadas, fora dos canais nobres de televisão e relegadas ao menor espaço possível nos veículos de comunicação. O mercado não se interessa porque a população não está nem aí.

A mãe do menino protocolou uma queixa formal junto ao Inep, mesmo sabendo o quão inócua seria esta ação. Mas seguiu com o seu papel de mãe. Bom seria se seguíssemos com o nosso papel de sociedade, de respeitar a todos porque este é o correto. Mas pelo visto ainda não estamos nem próximos disso.

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