Este é um artigo de Opinião e não reflete, necessariamente, a opinião do DIÁRIO DO RIO.
Os políticos não medem esforços para garantir o seu quinhão. Na última segunda-feira, deputados e senadores ratificaram o poder ilimitado do relator-geral do Orçamento para distribuir sozinho cerca de R$ 17 bilhões em 2022 por meio das emendas de relator. É dinheiro público escorrendo pelo ralo sem qualquer critério, controle ou transparência.
E o pior é que esses recursos, que seriam destinados aos ministérios para a elaboração de políticas públicas, vão parar nas mãos de políticos mais preocupados em defender os seus próprios interesses do que os da população. Lamentavelmente, vão continuar servindo como moeda de troca em votações e para agradar a base eleitoral, isso quando não servirem também para alimentar esquemas de corrupção
As emendas de relator foram criadas em 2019 com o objetivo de corrigir erros e omissões de ordem técnica ou legal do projeto de lei orçamentária anual votado no Congresso Nacional. Com a garantia do anonimato dos políticos favorecidos, o seu objetivo foi logo desvirtuado e passaram a ser usadas para a criação do orçamento secreto, quando há a indicação, dentro do orçamento, da destinação de verbas pelos parlamentares, porém de forma oculta. Os recursos acabaram irrigando obras públicas nos redutos eleitorais dos parlamentares em troca de apoio político na votação de projetos no Congresso. É o toma lá dá cá na política.
Inúmeras reportagens publicadas na imprensa mostraram como os políticos haviam aperfeiçoado o sistema de corrupção no país. Ao contrário do escândalo Petrobras / Odebrecht, o dinheiro cai no bolso dos corruptos a partir de licitações de baixo valor, envolvendo estatais locais, prefeituras e secretarias do governo, sem levantar qualquer suspeita. E ainda sem sujar as mãos do alto escalão do governo, uma vez que a transação é feita entre parlamentares e os governos locais.
A Codevasf (Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba) é o exemplo do que acontece com a falta de transparência na distribuição de recursos públicos. A empresa pública, que tem como sua principal fonte de recursos as emendas parlamentares, foi acusada de irregularidades em repasses federais para municípios por indicação de parlamentares e compra de implementos agrícolas com indícios de superfaturamento.
Em novembro, o Supremo Tribunal Federal (STF) considerou o orçamento secreto inconstitucional e interrompeu o seu pagamento, determinando que fosse dada ampla publicidade às indicações dos parlamentares, o que foi recusado prontamente esta semana em votação no Congresso. Os ministros do STF consideraram que o orçamento secreto fere os princípios da transparência e da impessoalidade, uma vez que as emendas de relator são negociadas com os demais parlamentares e sua destinação final não é tornada pública.
A recusa em divulgar os nomes dos políticos e entidades favorecidos pelas emendas de relator tem uma explicação. Seria “nitroglicerina pura” capaz de desencadear uma grande crise, uma vez que exporia de forma nua e crua quem fez os acordos e quanto cada um recebeu pela negociata.
Além de ilegal, esse modelo é péssimo para o Brasil, pois a falta de transparência só favorece a corrupção e o toma lá dá cá na política. Os deputados e senadores, que participam da definição do orçamento junto com o Executivo, devem na verdade fiscalizar o emprego desses recursos para garantir seu uso correto. Sou contra a distribuição feita pelos parlamentares, sendo ainda pior e mais grave quando isso não é feito de forma equânime, sem qualquer possibilidade de fiscalização. E infelizmente, o que mais temos visto no país é o mau uso do dinheiro do contribuinte.
Esse tipo de pauta é grave e tudo que a população não precisa. É de interesse único e exclusivo dos políticos, além de abrir muito mais brecha para a corrupção. É uma sinalização péssima para a sociedade de que as pessoas que deveriam estar preocupadas com o povo, estão na verdade preocupadas com seus interesses. Precisamos combater práticas como essa a todo momento, pois quando menos esperamos, elas aparecem. Dar transparência, zelar pelo que é público, permitir que o cidadão saiba para onde vai o dinheiro dos impostos, não deveria ser um compromisso e sim uma condição básica na política.