Governo Federal anuncia que vai “acabar” com laudêmios e foros à União. Será?

Segundo especialistas, na verdade o que se quer é vender o domínio direto, que nesses imóveis pertence à União, a quem já tem o dominio útil, através da “remição digital”. Tudo começará por Copacabana e Leme.

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Vista aérea da Praia do Leme, Zona Sul do Rio - Foto: Reprodução

Nesta quinta-feira, 10/06, o Ministério da Economia anunciou o “cancelamento” da cobrança do laudêmio e outras taxas patrimoniais para proprietários ou compradores de imóveis que ficam em terrenos que pertencem à União, em regiões que são popularmente chamadas de “área de marinha”.

A Secretaria de Coordenação e Governança do Patrimônio da União (SPU), do Ministério da Economia, vai lançar a remição de foro digital em julho deste ano e regulamentará a Proposta de Manifestação de Aquisição (PMA) até outubro de 2021.

De acordo com o Governo Federal, a medida impactará cerca de 600 mil imóveis inscritos em regime de aforamento e ocupação em todo o país. A ação integra o Programa SPU+, que visa a ativar a economia por meio da contabilização de R$ 110 bilhões em imóveis da União até 2022.

“Esse projeto da remição de foro será iniciado no Rio de Janeiro, nos bairros de Copacabana e Leme. A cidade do Rio foi escolhida por fatores históricos, sociais, econômicos, turísticos e culturais. Em todo o Brasil, mais de um milhão de pessoas devem ser beneficiadas”, afirmou o secretário de Coordenação e Governança do Patrimônio da União, Mauro Filho.

Mas na prática, nada vai acabar e nem ser cancelado, ao menos de graça. “Pra ficar fácil pro leigo entender: o governo federal simplesmente quer vender a partezinha do imóvel foreiro que pertence à União para o particular dono do imóvel. Assim, quem quiser que seu imóvel deixe de pagar foro e laudêmio vai ter que pagar por aquele ’pedacinho’ do imóvel que é da União. Em termos juridicos, o particular tem o Domínio Útil e a União tem o Domínio Direto. E, na prática, quer simplesmente vender o Domínio Direto pro Titular do Domínio Útil. Resta saber se este quer comprar!”, tenha explicar Wilton Alves, especialista da administradora Sergio Castro Imóveis, que administra centenas de imóveis nesta situação.

Os ocupantes regulares de imóveis, que atualmente pagam taxa anual pela utilização do espaço, também poderão adquirir a propriedade. Nesse caso, o terreno é 100% da União e os ocupantes poderão manifestar o interesse na compra do terreno por meio da Proposta de Manifestação de Aquisição, medida que será regulamentada pela SPU e impactará cerca de 300 mil ativos em todo o país.

A decisão do Governo Federal está longe de ter a ver com o ambicioso projeto da ex-deputada federal e atual Secretária Municipal Laura Carneiro, que tramita no Congresso Nacional e quer, este sim, cancelar a cobrança considerada anacrônica e sem sentido atual por 10 entre 10 especialistas.

Contexto histórico

A questão de foro e laudêmio tem dois séculos de história. Em 1831, a Coroa estipulou que imóveis em áreas consideradas fundamentais para a defesa nacional contra um possível ataque pelo mar (os chamados terrenos de Marinha) deveriam pagar anualmente taxa de ocupação ou foro (quando o imóvel está sob regime de aforamento, sendo o sujeito passivo o titular do domínio útil), e mais um percentual no caso de venda do imóvel, o laudêmio. Para isso, foi delimitada uma faixa de terra de 33 metros a partir de uma linha imaginária com base na média de marés altas daquele ano (a chamada preamar média).

Mudanças na legislação e nas marés, e também na ocupação irregular e construção de aterros ao longo de praias e lagoas puseram de ponta-cabeça a localização desses terrenos. Com isso, a partir de 2001 milhares de moradores foram surpreendidos com dívidas de foros e laudêmios atrasados de imóveis que, em alguns casos, nem ficam próximo ao mar. A cobrança veio após uma revisão cartográfica realizada entre 1996 e 2000, com base em um decreto lei de 1946 que inclui na demarcação propriedades às margens de rios e lagoas com influência de marés.

Para Wilton Alves, da imobiliária Sergio Castro, a cobrança era uma excrescência. “Algo que nunca foi foreiro passar a sê-lo justamente numa época em que esta taxa é tão questionada é um golpe duro na segurança jurídica e foi um caos no mercado imobiliário da região”.

A partir daí, sem estudo mais aprofundado, a empresa contratada para refazer o traçado incluiu milhares de moradias fora do contexto, como as do entorno das lagoas de Piratininga e Itaipu. A lista dos que passariam a receber a cobrança foi publicada por edital no Diário Oficial da União, mas a maioria só ficou sabendo disso na hora de vender o imóvel.

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