Guilherme Fonseca: Envelhecimento da população desafia cidades

Para o urbanista Guilherme Fonseca, envelhecimento da população brasileira impõe reflexões e intervenções em diversas áreas da administração pública

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Foto: Karolina Grabowska - Pixabay

O envelhecimento da população brasileira impõe reflexões e intervenções em diversas áreas da administração pública, sobretudo nos grandes centros urbanos.

 Na política habitacional é necessário considerar a acessibilidade e o desenho universal como princípios básicos de projeto. O déficit habitacional no país é outro desafio que, para ser enfrentado de forma efetiva, requer o estabelecimento de uma política de Estado que assegure a continuidade das ações, sem as habituais interrupções que programas de governo sofrem no início de cada nova legislatura.

 Além do déficit habitacional, deve-se considerar a demanda. As características das pessoas beneficiadas pela política habitacional tendem a exigir cada vez mais espaços acessíveis. A acessibilidade não deve ser entendida como uma exceção, mas como regra. A legislação federal trata deste tema por meio do Estatuto da Pessoa com Deficiência, lei federal de 13.146 de 6 de julho de 2015.

 O projeto de lei 6950/17, em tramitação na Câmara dos Deputados, pretende tornar obrigatória a adoção do Desenho Universal em todos os programas habitacionais públicos.

A lei 13.146/2015 define como Desenho Universal a “concepção de produtos, ambientes, programas e serviços a serem usados por todas as pessoas, sem necessidade de adaptação ou de projeto específico, incluindo os recursos de tecnologia assistiva”.

Na justificativa do projeto de lei as autoras, a atual deputada pelo Paraná, Leandre Dal Ponte e a senadora Mara Gabrilli, à época deputada federal por São Paulo, destacam que, no Brasil, mais de 45 milhões de pessoas têm algum tipo de deficiência. Esse número representa 23,9% da população, com base no Censo do IBGE de 2010. A população idosa será de 40,5 milhões de pessoas ou 18,7% da população, considerando a taxa de crescimento anual de 3,78%.

 Em relação ao aumento de custos para aplicação do Desenho Universal, a justificativa também traz informações sobre o estudo do arquiteto americano Edward Steinfeld, professor de Arquitetura e diretor do Centro de Design Inclusivo (IDEA Center), que desenvolveu o estudo dos custos da aplicação. O estudo concluiu que a construção executada nos padrões do Desenho Universal, terá aumento insignificante nos custos da acessibilidade, porém, a reforma para adaptação e adequação pode representar 20% do custo global.

 O acréscimo no custo da implantação da acessibilidade desde o projeto representa 0,5% a 3% na construção de casas; em construção de edifícios de habitação coletiva, de 0,5% a 1%; na construção de centros comerciais, restaurantes e estacionamentos, 0,11%; salas de aula 0,13%; e construção de shoppings, 0,006%.

 Quando se trata de política habitacional, considera-se, além do déficit, a demanda, que tem a ver com o estoque de moradias financiadas ou não com recursos públicos. Considerando que a mobilidade reduzida pode ser adquirida ao longo da vida, os investimentos públicos em moradias acessíveis permitem que o investimento público atenda grupos sociais por gerações.

 De acordo com o IBGE, o índice de envelhecimento da população aponta para mudanças. Em 2008, para cada grupo de 100 crianças de 0 a 14 anos existiam 24,7 idosos de 65 anos ou mais; em 2050, o quadro muda e para cada 100 crianças de 0 a 14 anos existirão 172,7 idosos.

 Uma publicação do jornal da Universidade de São Paulo (USP) constatou que 97,8% dos idosos na cidade de São Paulo não conseguem caminhar a 4,3 km/h, velocidade exigida pelo padrão da Companhia de Engenharia de Tráfego de São Paulo (CET-SP), para os semáforos da cidade. Em média, a velocidade alcançada pelos voluntários com mais de 60 anos que participaram da pesquisa foi de 2,7 km/h.

 Outro dado relevante é o do custo social de acidentes sofridos por pedestres em calçadas – de aproximadamente R$ 2 bilhões. O consultor de mobilidade Philip Anthony Gold fez um cálculo estimado num estudo, em parceria com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA). Entre 2002 e 2003, nove em cada mil moradores de aglomerações urbanas sofreram quedas como pedestres.  O custo médio do resgate é estimado em R$ 2.656,00. A metrópole de São Paulo tinha 19 milhões de habitantes em 2003. Desta forma, chega-se a previsão de que 171 mil pessoas tenham sofrido quedas como pedestres. O custo do resgate e tratamento, considerando os 12 meses, gerou um gasto de aproximadamente R$ 500 milhões. Completando o cálculo, é aplicado um fator de multiplicação de 4,52 para acrescentar a perda de produção e reabilitação. A má conservação das calçadas das cidades brasileiras afeta todas as faixas etárias, mas o risco de quedas para idosos, naturalmente, é bem maior.

 Já temos um passivo urbano gigantesco tensionado pela cultura de gestão da máquina pública; do processo legislativo em matérias que impactam diretamente as cidades; da responsabilidade do Judiciário em fazer cumprir as leis; além dos problemas setoriais nas áreas de habitação, mobilidade, ambiente e saneamento, que muitas vezes são agravados porque a técnica é atropelada pela política com “p” minúsculo.

 A reflexão sobre este tema é para estudantes, gestores e servidores públicos, arquitetos, urbanistas e engenheiros. A partir dessa reflexão e da implementação de programas, sem dúvida haverá um futuro melhor para os habitantes dos centros urbanos brasileiros.

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