Milicianos e traficantes ’administram’ de forma diferente os mercados imobiliários de favelas, dizem especialistas

Na Rocinha, pelo menos 37% dos imóveis são alugados, enquanto na Muzema são 50%. Imóveis continuam sendo construídos irregularmente, ao arrepio da lei, para serem absorvidos por um crescente mercado imobiliário paralelo

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Favela toma a vista do Rio de Janeiro | Foto: Rafa Pereira - Diário do Rio

O que antes parecia ser exclusividade da milícia, parece ter se passado a se expandir para comunidades de domínio do tráfico: a exploração de imóveis irregulares com objetivo de aluguel para população carente, assim como a construção para revenda de imóveis construídos de forma clandestina e ilegal. Pelas flexibilidades ditas sociais, o mercado imobiliário nas favelas se tornou atraente não só para o uso de imóveis pela população pobre, mas como investimento.

Embora pareça que o tráfico tenha ganho mais uma atividade para explorar, o geógrafo Victor Barone afirma que, diferente de comunidades dominadas pela milícia, apontada como vetor imobiliário de áreas região de Jacarepaguá como Muzema e Rio das Pedras, nas favelas em regiões turísticas com potencial imobiliário, não pareceria haver nenhum tipo de organização para a produção em série de imóveis.

Na lógica da produção capitalista do espaço, é evidente que, se tiver condições financeiras, um morador de uma favela com potencial imobiliário construirá um puxadinho e colocará para alugar. O que você faria? “, questiona.

O mercado imobiliário nas favelas é uma realidade ignorada há tempos, propositalmente ou não. O último Censo divulgado é de 2010, mas outro do último ano deve trazer a realidade deste quadro. Até então, enquanto não saem resultados mais atuais, no Sistema de Assentamentos de Baixa Renda (SABREN), do Instituto Pereira Passos, autarquia municipal, é possível perceber que a ocupação dos domicílios em favelas de regiões turísticas como Rocinha e Vidigal possuem dinâmicas imobiliárias próprias, o que demonstra claramente que pelo menos 37% dos domicílios da Rocinha e 21% dos domicílios do Vidigal são alugados.

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No entanto, em favelas dominadas pela milícia, como Rio das Pedras e Muzema, esse percentual é de 57% e 50% respectivamente. Já em favelas que não possuem forte apelo turístico e não são dominadas por milícia, como é o caso da Vila Aliança, em Bangu, esse percentual é apenas de 7%. Vale notar que a maioria das favelas em pontos turísticos estão também muito próximas das zonas mais ricas da cidade, facilitando a ida e volta para o trabalho.

Barone ainda comenta que há quem critique aqueles que moram em favelas por opção. Uma família com renda de R$ 5 mil, compromete 20% ou menos com habitação, se for morar na Rocinha. No mercado formal, essa mesma família, comprometeria 40% da sua renda com habitação além de encarar diariamente duas horas de trânsito até o trabalho. Importante lembrar que os moradores das favelas não têm despesas com luz, água, IPTU e taxa de incêndio, por exemplo.

Precisamos desmistificar algumas ideias ainda muito presentes no imaginário popular como a de que o morador da favela é um ladrão de terras organizado. O favelado é antes de mais nada um cidadão que quer morar perto do seu local de trabalho e ter acesso à saúde, cultura e oportunidades. Não devemos tratá-lo como um especulador imobiliário. As milícias, sim, devem ser tratadas dessa forma”, ressalta o geógrafo.  

É sabido que um único proprietário tem centenas de imóveis na Rocinha. Ficou famoso o vídeo de uma espécie de corretor mostrando casas que estão sendo construídas lá neste momento, para serem vendidas ou alugadas. As fronteiras verdes são ignoradas. Estes empresários informais que pagam zero pelo terreno, usam mão de obra quase escrava, e não recebem nenhum tipo de fiscalização assim como não obedecem a nenhuma postura municipal, são criminosos e deveriam ser combatidos tanto quanto os milicianos”, afirma o empresário Cláudio André de Castro, que atua no setor imobiliário, mostrando uma visão diferente de Barone.

Vídeo: Reprodução/redes sociais

Uma das soluções apontadas pelo especialista seria o POUSO On-line, ou seja, Postos de Orientação Urbanística e Social. Segundo Barone, postos físicos jamais terão engenheiros e arquitetos suficientes para atender a todas as favelas da cidade, mas se a Prefeitura fizer a transformação digital do POUSO, o projeto pode ter um alcance e adesão jamais visto. A ideia incluiria os comunicadores das comunidades para o projeto e estratégias para abordar, de forma diferenciada, favelas com potencial imobiliário turístico; dominadas pela milícia; favelas que ocupam ou estão ao longo de viadutos e vias importantes; entre outros tantos tipos. 

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Formada em Comunicação Social desde 2004, com bacharelado em jornalismo, tem extensão de Jornalismo e Políticas Públicas pela UFRJ. É apaixonada por política e economia, coleciona experiências que vão desde jornais populares às editorias de mercado. Além de gastar sola de sapato também com muita carioquice.
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