Nossa cidade, Rio de Janeiro, possui sua história alicerçada na fé e no esforço de um povo na construção de uma sociedade sobre os valores da fé cristã. Se ainda formamos uma cidade excludente, violenta e pagã, é porque ainda estamos longe do apogeu como civilização. Temos um longo percurso a percorrer, mantendo a fé nas sementes que foram plantadas pelas gerações que nos antecederam.
É muito interessante o livro do jornalista Thiago Ribeiro, que apresenta um histórico da cidade, construída em torno de edificações religiosas e da fé do povo carioca. A obra “Uma cidade arquitetada na Fé”, apresenta uma reflexão de como os valores cristãos estão profundamente internalizados no jeito do carioca interagir com o ambiente construído. Mostra como as instituições se consolidam a partir de princípios do evangelho, como a solidariedade, o serviço aos necessitados, a evangelização e a tolerância e inclusão dos gentios e estrangeiros. A cidade do Rio sempre manteve os braços abertos aos viajantes, turistas e todos os povos que aqui buscam abrigo.
Vamos aprofundar em quatro pontos que são oportunos:
Primeiramente, quando pensamos em uma edificação de Igreja, Templo ou de um Santuário, é importante retornarmos aos princípios fundamentais da arquitetura, enquanto arte e técnica: A triáde Vitruviana. Vitrúvio, um arquiteto e filosofo do sec. I aC., é considerado o autor do tratado mais influente e antigo sobre arquitetura, intitulado “De Architectura” (Sobre a Arquitetura).
Nesta obra, ele estabeleceu os três princípios fundamentais que uma boa construção, no geral, deve possuir: (1) Firmitas (Solidez/Resistência), (2) Utilitas (Utilidade/Funcionalidade) e (3) Venustas (Beleza/Estética). E mais recente, podemos incluir a Eficiência Energética e Ambiental como um quarto pilar, capaz de qualificar qualquer construção. Especificamente para as igrejas e templos, devemos ter como referência que é uma obra voltada para exultar e glorificar ao Divino ao mesmo tempo em que agrega as pessoas em torno a crença coletiva e expressão da religiosidade.
Neste sentido é muito importante a beleza, a harmonia e proporção, o equilíbrio. As igrejas devem possuir o simbolismo da transcendência, elementos como vitrais, o altar, a nave, um direcionamento do olhar que nos leva para o céu e que nos remeta à um lugar de paz. Da mesma forma o belo não é apenas uma sensação estética, mas um caminho que conduz o fiel numa trajetória de busca do Altíssimo e do grande Amor Divino que nos orienta para o bem e a perfeição. É fundamental compreender que a arquitetura religiosa evoluiu ao longo do tempo, refletindo não apenas as mudanças nas práticas e crenças, mas também os avanços tecnológicos, culturais e artísticos de cada época. Por exemplo, nas civilizações mais antigas, o lugar de destaque das festas era sempre um templo ou uma praça onde a comunidade se reunia para oferecer sacrifícios aos deuses, celebrar a colheita, a caça e a saúde. Povos antigos como gregos, romanos, astecas e hindus ergueram templos fabulosos que ainda hoje podem ser visitados. A Igreja Cristã, em diferentes épocas também ergueu igrejas e catedrais que oferecem o melhor da arte e da arquitetura de seu tempo, em estilos como medieval, gótico, barroco e clássico, com edifícios grandiosos, torres, arcadas e abóbadas de nervuras e vitrais coloridos, simbolizando a aspiração de elevar-se aos céus. Um grande exemplo é o complexo do Vaticano, da Igreja de São Pedro e toda a arte que leva o visitante a um impacto de beleza e conversão. A partir do século XX, a arquitetura religiosa incorporou novos materiais como o concreto armado, permitindo formas mais ousadas e expressivas. Exemplos notáveis incluem a Catedral de Brasília de Oscar Niemeyer, a basílica de Aparecida, nossa catedral metropolitana do Rio, o Santuário Dom Bosco e a Igreja da Luz de Tadao Ando e também a Igreja da Sagrada Familia em Barcelona. Entender essa progressão histórica é importante, quando percebemos que em cada tempo há uma forma da arquitetura glorificar à Deus em um contexto de estéticas de época. Não podemos ser anacrônicos e nos apegarmos apenas aos tempos antigos e negar o belo da arte sacra contemporânea e de comunicar às pessoas de cada tempo o convite para entrar no espaço religioso, considerando os simbolismos e desafios de cada geração.
Um segundo aspecto fundamental que precisamos discutir e considerando a tríade vitruviana (agora quadra) é da durabilidade, eficiência e utilização das edificações enquanto espaços para reunião, celebrações e congraçamento do povo. É importante a preservação do patrimônio histórico. Mas de nada adianta esta motivação para que se conservem os edifícios, se as intempéries, cupins, maresia e o próprio uso acabam por destruir estes prédios. Portanto no que tange aos templos e igrejas do Rio é importante estar atentos aos órgãos como IPHAN, prefeitura e atender aos normativos técnicos.
E também é preciso entender que cada comunidade tem autonomia para promover as melhorias e conservação necessária, considerando que as igrejas são comunidades vivas e dinâmicas e não museus. Cada paróquia possui suas demandas de espaço, segurança dos fiéis e conforto ambiental, para que ali possam ser ministrados os sacramentos; celebradas as missas, casamentos e batizados. Infelizmente no âmbito paroquial, se percebe as mesmas situações que em quaisquer ajuntamentos humanos. Há fofocas, intrigas, maledicências e todo tipo de tumulto, inclusive falas desprovidas de fundamentos técnicos. É preciso respeitar as autoridades civis e religiosas quando estas conduzem melhorias nas edificações, visando o conforto e segurança dos fiéis, a beleza das edificações e sua finalidade pastoral. Vimos recente em uma paróquia próxima ao centro, exageros de alguns fiéis, talvez levados por redes sociais, em acusações superficiais, talvez por desconhecerem questões técnicas e históricas. E desde sempre que a Igreja lida com estes conflitos e confusões, e apesar disto a Igreja avança abrindo portas para o povo e os conduzindo para conversão.
O terceiro aspecto retoma a importância da manutenção e qualificação das igrejas históricas do Rio, em um projeto que visa contemplar um roteiro de peregrinação carioca, que está sendo desenvolvido pela ADCE RIO com apoio do pool turístico e com entidades ligadas ao aspecto cultural e histórico da cidade. Em breve vamos divulgar mais detalhes desta construção coletiva que apresenta uma grande oportunidade para atrair ao Rio para o turismo religioso. A proposta prevê a caminhada com 14 paradas, tal qual a Via Sacra, serão 12 igrejas icônicas que contam a história da cidade, como a Igreja da Lapa dos Mercadores, Igreja do Carmo, Candelária, Antiga Sé, Mosteiro de São Bento, Catedral Metropolitana, entre outras, além de dois santuários: do Cristo Redentor e da Penha. Neste trajeto cada peregrino receberá um carimbo em um “passaporte” e ao final de todo o percurso receberá uma insígnia e até quem sabe alguma indulgência que possa ser concedida aos caminhantes. Essa ideia está sendo consolidada e em breve traremos novidades.
Como quarto e último ponto, vamos destacar a importância da igreja de portas abertas. Deve ser local de acolhimento, fraternidade e inclusão. As igrejas são, historicamente, locais de acolhida de pessoas, em caso de enchentes, como vimos no Rio Grande do Sul; ou espaços para acolher feridos nas guerras, doentes nas epidemias e perseguidos políticos. O Papa Francisco usa o termo “Igreja em Saída” para indicar uma ação missionária aberta a todos, indistintamente, a fim de testemunhar o amor de Deus pela humanidade e atrair todos os povos a salvação. Neste sentido nos surpreende uma ordem de traficantes no Rio de Janeiro, para fechar igrejas em algumas comunidades, próximo ao Complexo de Israel (que simbólico, justamente o local de origem da igreja cristã), região de Brás de Pina, como noticiado no DIÁRIO DO RIO. Durante a pandemia, também vimos autoridades proibindo o acesso as igrejas com rompantes tirânicos, contra as evidências e conhecimentos da medicina e saúde. Voltando ao ponto anterior, desde sempre que a igreja é perseguida por imperadores e poderosos, por infiéis e mais recente por ideologias marxistas.
E quanto mais discriminada e combatida a Igreja, maiores as conversões e a fidelidade dos autênticos cristãos, que seguem firmes na caminhada de fé. Muitas vezes são perseguidos até morte, como tantos mártires e santos. Vale então a firmeza diante de tantos conflitos e distúrbios, para cuidar dos templos, das edificações e do patrimônio. Mas acima de tudo de oferecer portas abertas a todo povo que busca a Deus.