Nós já fomos capital de dois impérios, capital de um país, e hoje somos capital de um estado. Com isso, ganhamos um imenso legado imobiliário. Imóveis de épocas distintas convivem lado a lado pela cidade. Muitos abandonados, outros subutilizados. Muitos também foram tombados, por sua qualidade artística ou por fazerem parte de nossa história e cultura. Muitos ainda mantêm seu esplendor, outros são apenas vestígios de épocas passadas, abandonados, à espera de ruir.
Numa cidade carente por novas habitação e com poucos espaços livres, a regulamentação das intervenções de reconversão, ou retrofit, como são chamadas, é urgente e necessária para incentivar a reocupação do grande estoque edificado ocioso existente na cidade do Rio de Janeiro.
Retrofitar pode ser uma solução para imóveis considerados ultrapassados ou fora do mercado, pois permite modernizar e fazer as alterações necessárias sem a necessidade de reconstruir. Mantém-se o mais importante – a estrutura do imóvel, sua arquitetura externa original, muitas vezes seu grande atrativo.
Quando se trata da reabilitação de centros urbanos é preciso avançar por diversas frentes: os espaços públicos, o patrimônio cultural, a viabilização de usos múltiplos, que garantam diversidade e vitalidade ao cotidiano e, de forma essencial, a reocupação de vazios urbanos.
O Rio tem muitos prédios abandonados, hotéis falidos, muitos bens históricos que são um problema tanto para a cidade quanto para as famílias proprietárias. E não é só, muitos prédios comerciais que poderiam ter seus escritórios transformados em apartamentos, em uma cidade com escassez de terrenos seriam uma ótima alternativa.
O Projeto de Lei Complementar 136, de 2019, tem a função de lançar as regras que se deve observar para esse novo uso, em imóveis tombados, preservados, e na transformação de residências unifamiliares para multifamiliares. Com o novo uso, essas edificações ganham a possibilidade de se reintegrar à vida e à dinâmica urbana contemporâneas.
Mesmo sem sua efetiva implantação, o mercado vai se reinventando e descobrindo novas formas de recuperar edifícios já construídos, diversos exemplos de reconversão já podem ser vistos pela cidade. O Cassino da Urca, inaugurado na década de 1930, que já foi um hotel e sede da TV Tupi, quando passaram por lá nomes como Carmem Miranda e Chacrinha, já recebeu o Instituto Europeu de Design e agora passará por intervenção para receber uma Escola Eleva.
Em Botafogo, o antigo casarão da clínica do cirurgião plástico Ivo Pitanguy será a área de lazer de um empreendimento de dois blocos com 39 apartamentos. No Flamengo, um hotel art déco fechado há quatro anos e em péssimas condições de conservação, o que complica bastante a tarefa de recuperar a fachada, foi retrofitado para abrigar 48 unidades de apartamentos. O telhado destruído vai virar um rooftop contemporâneo, assinado pelo escritório Burle Marx.
Visitando alguns desses projetos e conversando com os responsáveis por eles, pudemos observar de perto como as intervenções respeitam as características importantes das edificações históricas, ao mesmo tempo em que as adaptam ao novo uso. Os projetos são realizados com o acompanhamento e supervisão do IRPH (Instituto Rio Patrimônio da Humanidade), cujo trabalho foi bastante elogiado.
O Projeto de Lei Complementar 136 vai estabelecer regras para que mais intervenções como estas possam ocorrer, continuando a ser acompanhadas pelos órgãos de tutela, mas sem a necessidade de se passarem leis específicas a cada nova proposta de alteração de uso (o que atualmente é recorrente e foi necessário, por exemplo, para aprovar intervenção no Largo do Boticário, no Cosme Velho, que estava há décadas sem uso). Acreditamos que para que ele se torne viável, é interessante oferecer alguns incentivos para adaptação da edificação antiga para o novo uso, como foi feito no Programa Reviver Centro, por exemplo. É um assunto que deve ser abordado tanto na nova Lei de Uso e Ocupação do Solo, quanto no Plano Diretor, cuja minuta propõe uma macrozona de controle da ocupação onde elenca a reconversão de imóveis como forma prioritária de intervenção. Como torná-la prioridade sem estudar bons incentivos?
Nossa intenção é dar mais rapidez ao processo e favorecer a reocupação desses imóveis! Estamos elaborando emendas para deixá-lo ainda melhor.