Quem é fã da HBO sabe muito bem que o David Simon é um cara que não fica de bobeira.
No final dos anos 80, e no começo dos anos 90, Simon trabalhou como um repórter criminalista por 15 anos na violenta cidade de Baltimore.
Como líder do sindicato dos repórteres do jornal, ele acabou se frustrando com os seus chefes quando o seu jornal foi comprado por uma empresa. Ele ficou irritado e decidiu escrever um livro. E poucas coisas motivam tanto o ser humano quanto o ódio.
Esse livro, que resumia os 15 anos de Simon como jornalista policial, serviu de base para “A Escuta” – uma série que, muita gente até hoje, considera a melhor de todos os tempos. Simon, que produziu e escreveu todas as temporadas da série, depois não largou o osso desse negócio de contar histórias pras telinhas.
Alguns anos depois, fez “TREME” a impactante série sobre o caos que se estabeleceu em Nova Orleans, depois do furacão Katrina; e depois “SHOW ME A HERO” – uma minissérie sobre um prefeito tentando conter uma crise, em uma cidade no estado de Nova Iorque, no final dos anos 70.
Quando se trata de série de televisão, o David Simon é tipo uma lenda vida – e o seu mais novo projeto “The Deuce” está chegando na sua terceira, e última, temporada.
O seriado se passa na Nova Iorque, no final dos anos 70 e acompanha a famigerada “era dourada” da pornografia americana.
Não precisa nem dizer que o universo que Simon e o seu cocriador fizeram é sujo, cruel, e milimetricamente bem pesquisado.
A série conta a história de como as mais variadas pessoas do submundo do crime, acabaram se associando, de alguma forma ou outra, a indústria pornográfica para tentar mudar de vida.
A série começa em 1971 com os irmãos gêmeos Frankie e Vince Martino operando um bar no Times Square, que é um “point” da máfia local – o tal “The Deuce” do titulo.
E muitos dos personagens principais da série acabam frequentando esse bar, que lentamente vai se adaptando aos tempos. A Candy, uma prostituta que rapidamente percebe o potencial empresarial da nova indústria pornográfica – é uma dessas personagens.
A série sempre foi imaginada como uma saga em três partes pelos seus criadores. A primeira temporada se passa em 1971,72; a segunda pega os personagens um pouco lá na frente, em 1977; e a terceira dá um pulo legal no tempo, e começa em 1984.
Nova Iorque continua tão suja como nunca. E, agora, talvez as coisas estão ainda piores – a era dourada da pornografia está chegando ao fim. O cinema está se democratizando com o advento das câmeras de vídeo e fitas VHS – e com a pornografia essa mudança acontece ainda mais rápido.
E pelo fato que nós andamos tanto tempo pra frente, nós abrimos essa temporada com o mundo inteiro chocado e assustado com o vírus da AIDS. Outro fator que complica a bastante vida dos nossos pornógrafos preferidos.
É interessante ver os personagens lidando com as mudanças rápidas da indústria causadas por novas tecnologias. Hoje em dia, com o streaming mostrando todo o seu poder e pessoas vendo filmes inteiros em seus celulares, existe um sentimento parecido no ar. E é claro que o David Simon está consciente disso.
Logo no primeiro episódio, Candy ainda está procurando diferenciar os seus filmes da pornografia normal, tentando fazer o que ela mesmo chama de “fem erótica”.
Para se inspirar, vai ver um filme do Akira Kurosawa com o seu sócio colaborador, o Harvey. Depois do filme eles comentam entre si – “puxa…mesmo com poucos recursos, o Kurosawa conseguia fazer tanta coisa!”
É, meus amigos, achava que porque era uma série sobre pornógrafos não ia ter cultura? Mais que cultura, com “The Deuce”, David Simon fez um de seus trabalhos mais humanos e acessíveis. Ao contar a história desses personagens, ele acaba também contando um pouco da história da América. Naquele padrão David Simon. É isso aí. O Canal Like dá a dica e você curte. Não deixe de conferir.