Mesmo com a pandemia de Covid-19, o mercado imobiliário carioca vem passando por um bom momento. Uma das maiores tendências do setor no Rio é o retrofit, que, em linhas gerais, é o processo de modernização, ou seja, a compra, reforma e revenda ou uso diferente de imóveis que já existiam antes. Isso tem acontecido em diversos empreendimentos, em especial na região central da cidade.
O retrofit pode ser definido como uma solução para quando os imóveis ficam “ultrapassados”, pois possibilita modernizar e fazer as mudanças necessárias sem a necessidade de reconstruí-lo. Aproveita-se a estrutura do imóvel, sua arquitetura externa original, e muitas vezes esta é um grande atrativo. Para Josué Madeira, diretor da Enjoy Imóveis, essa é uma opção para ocupar regiões já muito adensadas e que precisam se adaptar aos novos tempos.
“Essa é uma alternativa para a ocupação de algumas regiões, como por exemplo o Centro do Rio. Atualmente houve uma queda no número de escritórios, então transformar esses imóveis em residência parece ser o caminho mais natural e plausível. O retrofit por si só é uma realidade para quando os empreendimentos ficam ultrapassados e a melhor alternativa é trazê-los mais para a atualidade”, ele disse.
Ele cita ainda que esta é uma grande tendência, pois como o Rio de Janeiro é uma cidade antiga, é uma questão de tempo até esse processo começar a acontecer até mesmo em imóveis de outras regiões, como Glória, Botafogo, Flamengo e Copacabana.
De acordo com Adames Torres, diretor comercial da Sérgio Castro Imóveis, o Rio de Janeiro tem muitos imóveis muito antigos em regiões que têm grande procura e muitos interessados, e, por não existirem mais tantos espaços vagos ou terrenos para construção de novos empreendimentos, surge a demanda do retrofit. Além disso, a arquitetura dos primeiros 50 anos do século XX é muito desejável e tem grandes admiradores.
“Essa nova tendência surgiu por isso, o retrofit nada mais é que imóveis antigos que se adaptam à atualidade, sem perder suas características principais. O retrofit veio para colocar o antigo em forma, trazer a arquitetura antiga para os dias de hoje, e tornar alcançável o sonho de se ter um imóvel no local dos sonhos, utilizando-o conforme a necessidade do momento. Não preciso ir muito longe, a restauração que fizemos em nossa Filial de Laranjeiras, um antigo palacete residencial, é um pequeno retrofit.”
No Rio de Janeiro, alguns grandes empreendimentos já passaram e outros estão passando por esse processo. O grande e emblemático Hotel Glória, que é tombado pelo Patrimônio Histórico e completa 100 anos em 2022, foi comprado pelo grupo Opportunity e está passando por um processo de transformação em um empreendimento residencial de ponta. O edifício Hilton Santos, que pertencia ao Clube do Flamengo, na Avenida Rui Barbosa, é outro exemplo; está sendo convertido em unidades residenciais pela construtora Cyrela.
Outro imóvel que está passando por esse processo é o antigo Hotel Paysandú, que está sendo transformado em residencial pela construtora Piimo Empreendimentos Imobiliários, que aproveitou a beleza de sua fachada em estilo Art Déco. “O velho hotel está sendo dividido em diversos apartamentos pequenos, tipo studio, e é um exemplo de união entre o melhor do passado e o que mais se deseja no presente. A arquitetura histórica é um atrativo, e os apartamentos menores são uma tendência atual. É o melhor do casamento entre o antigo e o novo“, diz Adames Torres, da Sergio Castro.
O diretor comercial da Valente Empreendimentos, Gustavo Valente, já fez parte de alguns projetos de retrofits pelo Rio. Em entrevista ao DIÁRIO DO RIO, ele citou o “Ipanema Corporate”, que foi finalizado no início deste ano. Segundo ele, metade do empreendimento já está alugado. Ele contou ainda sobre o próximo projeto retrofit sendo conduzido por sua empresa, que será na Glória, no prédio onde, antigamente, ficava localizada a Rádio Globo, na Praia do Russell. Será mais um caso de comercial a ser transformado em residencial.
“A gente está trabalhando para criar ano que vem, em 2021, mais esse retrofit no mercado. Acreditamos bastante nessa tendência aqui no Rio de Janeiro, porque é um jeito de adaptar esses prédios para o novo mercado que vêm surgindo”, diz ele, sobre o prédio, que terá um impressionante terraço ajardinado com vista para a baía de Guanabara.
Ele falou ainda sobre como foi a experiência de trabalhar com retrofit. Segundo o empresário, no prédio de Ipanema, o processo foi muito interessante e instigante. “Os resultados foram muito elogiados por utilizarmos a estética original do prédio mesclando-a com o que se espera de um prédio do século XXI” A construtora fez isso mantendo parte da arquitetura, sem descaracterizar o prédio como um todo. “A experiência tem sido bem legal, tanto do ponto de vista estético, quanto na usabilidade do dia a dia”, contou.
Gustavo ainda reforçou que o retrofit é uma tendência tanto para imóveis comerciais quanto residenciais. Ele acredita ainda que o Centro vai passar por uma grande mudança nos próximos anos e que a pandemia pode ter acelerado este processo por conta do esvaziamento do Centro do Rio. Segundo ele, “o retrofit vai ser um grande fator de mudança no mercado imobiliário do Rio de Janeiro”, levando em conta que a região central já é hiper-construída, supõe que a saída será mesmo pela via das transformações de uso.
O primeiro retrofit que foi grandemente noticiado no Rio, foi no próprio Centro: o neoclássico Edifício Amarelinho, na Cinelândia, que nos anos 1990 estava totalmente degradado e foi transformado num prédio comercial de ponta – para a época. Desde então, alguns outros prédios passaram pelo processo, mas só nos últimos anos se vislumbrou a necessidade de se converter espaços comerciais ultrapassados em apartamentos residenciais na região central.
Hoje, 10 entre 10 especialistas em mercado imobiliário acreditam que o uso misto e a conversão de edifícios comerciais mais antigos em residenciais trará mais vida para aqueles locais que não têm mais espaço para a construção de edifícios novos, e que, por estarem próximos a todos os modais de transporte e cercados de infraestrutura, se tornaram tão desejáveis como moradia. O Centro deve receber muitos destes projetos nos próximos anos. O Edifício A Noite, na Praça Mauá, deve ser um dos próximos. “É certo que, quando finalmente vendido, será transformado em residencial“, sentencia Adames.
Nem todos os retrofits são residenciais. Um caso de grande destaque foi a venda das casas que formam o conjunto arquitetônico do Largo do Boticário para a Rede Accor de Hotéis (dona das marcas Sofitel, Ibis e Fairmont), em 2018. Os imóveis do Cosme Velho estão sendo restaurados detalhadamente pela empresa hoteleira, que pretende abrir um hotel no local nos próximos anos. “A conversão dos imóveis residenciais em unidades hoteleiras eram uma necessidade da cidade, pois aquele local não se prestava mais à moradia, mas era altamente convidativo para atividades comerciais“, disse Cláudio Castro, responsável pela venda dos imóveis à Accor. “A cidade é viva, muda, desmuda, evolui.” , ensina o titular da Sergio Castro Imóveis.