A crise no abastecimento de água no Rio de Janeiro já é realidade. Como noticiamos aqui no DIÁRIO DO RIO, alguns munícipios já sentem a falta de água. Maricá é um deles. Contudo, a situação pode piorar. De acordo com especialistas, a tendência é que a maior parte da população do estado sofra com isso, pois a bacia hidrográfica mais importante para o RJ, a do Paraíba do Sul, que abastece 70% dos fluminenses, está com níveis baixos e deteriorada.
No final do último mês de agosto, o Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ), por meio do Grupo Temático Temporário para Garantia de Segurança Hídrica (GTT Segurança Hídrica/MPRJ), realizou uma reunião com representantes do Comitê de Integração da Bacia Hidrográfica do Rio Paraíba do Sul (CEIVAP), Associação Pró-Gestão das Águas da Bacia Hidrográfica do Rio Paraíba do Sul (AGEVA) e Ministérios Públicos Estaduais e Federal localizados na bacia hidrográfica do Rio Paraíba do Sul. O objetivo foi discutir medidas de segurança hídrica a partir da preservação e restauração das áreas estratégicas e de interesse para a preservação dos mananciais de abastecimento público na região.
Durante o encontro, foi apresentado aos participantes, por representantes do Comitê de Integração da Bacia Hidrográfica do Rio Paraíba do Sul (CEIVAP), o Programa de Investimento em Serviços Ambientais para a Conservação e Recuperação de Mananciais. A bacia do rio Paraíba do Sul abrange 39 municípios no Estado de São Paulo, 53 no Rio de Janeiro e 88 em Minas Gerais, totalizando 180 municípios. Se considerada a transposição do Rio Paraíba do Sul para o Guandu, a população atendida no Rio de Janeiro pela bacia é de mais 12 milhões de pessoas.
Segundo o coordenador do GTT Segurança Hídrica/MPRJ, José Alexandre Maximino: “A ideia é nos aproximarmos dos desenvolvedores e executores dessa política, colocando o MPRJ à disposição para a convergência de esforços e instrumentos relacionados às soluções baseadas na natureza relacionadas à segurança hídrica na região, seja para preservação, proteção contra incêndios ou restauração. Um dos objetivos deste encontro é podermos nos alinhar, conhecendo essas áreas estratégicas de proteção de mananciais que estão sendo mapeadas e hierarquizadas no programa concebido e desenvolvido pelo CEIVAP”.
Todavia, o prazo definido para o início das ações de preservação da bacia hidrográfica do Rio Paraíba do Sul já venceu e nada foi feito. Nem mesmo iniciado. Para ambientalistas, isso vai causar um grave colapso hídrico no estado do Rio de Janeiro, que pode perdurar até 2023, com possibilidades de piora.
“Este pedido foi feito ao MPF e ao MP Estadual em Janeiro de 2020 (há 1 ano e meio) e também incluía o pedido de Decretação de Estado de Alerta e Emergência Hídrica na RMRJ para que os governos federal e Estadual adotassem medidas e ações voltadas a reverter o alto grau de vulnerabilidade hídrica do Estado do Rio de Janeiro e nada foi feito em 1 ano e meio e agora o Colapso Hídrico está batendo forte nas nossas portas”, afirma Sérgio Ricardo, membro-fundador do Baía Viva, movimento que há décadas luta pela pauta do saneamento e da distribuição digna de água à população do Rio de Janeiro.
Ainda de acordo com Sérgio Ricardo: “Diante da baixa confiabilidade da população em relação à atuação dos órgãos ambientais (SEAS e INEA), da CEDAE e das agências reguladoras ANA e AGENERSA, que têm um longo histórico de omissões e negligência, o movimento propõe que a PGR e o MP Estadual determinem a formação de um pool (consórcio) de universidades e instituições científicas e técnicas (como a FIOCRUZ) para desenvolver um Programa de Monitoramento da Qualidade da Água para abastecimento público; definição de novos parâmetros de potabilidade (como a análise dos impactos provocados pela proliferação de algas tóxicas nos reservatórios e rios) e para identificar as principais fontes de poluição presentes nas bacias hidrográficas fluminenses e avaliar de forma independente o grau de criticidade dos mananciais fluminenses destinados ao abastecimento público”.
Adacto Ottoni, professor associado do departamento de engenharia sanitária e do meio ambiente da UERJ, explica que “o problema é a degradação das bacias hidrográficas. Quem garante água doce é a floresta, que retém água que cai das chuvas. Com essas florestas sofrendo desmatamento, menos água é retida e os reservatórios ficam com menos capacidade para a geração de energia. Isso, somado à falta de chuvas, traz o problema da falta d’água”.
Os técnicos da AGEVAP explicam que o Programa de Investimento em Serviços Ambientais para a Conservação e Recuperação de Mananciais visa atender 21 microbacias do Rio Paraíba do Sul, considerado o maior manancial do estado do Rio de Janeiro, aplicando recursos financeiros e humanos para aumentar a capacidade dos ecossistemas produzirem serviços que permitam a melhoria da qualidade de vida das populações atendidas pelo rio no abastecimento de água. “A intenção é diagnosticar e entender como a bacia funciona e, a partir daí, propor medidas de preservação, como a criação de unidades de conservação, a implantação de sistemas agropastoris, o manejo sustentável da pastagem rural, o saneamento básico da unidade domiciliar e da unidade de produção agropecuária, e a recuperação e conservação do solo em estradas vicinais, além da capacitação contínua da comunidade e dos proprietários de terras e produtores rurais”, explicou o representante da AGEVAP, Flávio Monteiro.
Entretanto, alertam os especialistas que todas essas ideias precisam ser postas em prática, pelos órgãos competentes, o mais rápido possível para que a crise hídrica que já vivemos não seja ainda mais grave.
“A Cedae pede que a população evite o desperdício de água e que adie, se possível, serviços não-essenciais que gastam muita água”, disse Daniel Okumura, diretor de Saneamento e Grande Operação da Companhia.