Ruínas na rua do Ouvidor amedrontam frequentadores do Polo Gastronômico, que vem renascendo

Imóveis de Ordens Religiosas correriam risco de desabamento, além de ser anteparo ao desenvolvimento econômico da região do Polo da Praça XV. São muitos prédios praticamente interditados e caindo aos pedaços, colecionando multas e décadas de abandono, apesar de serem isentos de IPTU

Advertisement
Receba notícias no WhatsApp
O abandono é visível nos prédios da rua do Ouvidor, Travessa dos Mercadores e Travessa do Comércio. Enquanto caem aos pedaços, são isentos de IPTU

Quem chega na tradicional rua do Ouvidor pelo boulevard Olímpico começa a ter impressão de que o polo gastronômico da região está renascendo aos poucos. Sempre cheio nas tardes de quarta a sábado, o trecho que começa com o decano restaurante Rio Minho, no número 10, e termina na rua Primeiro de Março volta a fervilhar com restaurantes, que também vêm reabrindo nas ruas do Rosário e do Mercado. O Bar Capitu, sobrado restauradíssimo sempre cheio, com comida brasileira, assim como o Al Khayam, árabe concorrido, o Cais do Oriente e o Sobrado da Cidade se destacam em meio a casas com comida mais em conta como o 20×20, o Spetinho da Ouvidor e o Plus Restaurante. A Ouvidor, fechada a automóveis neste trecho, se transforma em um movimentado e alegre restaurante a céu aberto.

Mas ao se dirigir em direção à primeiro de Março, a gente começa a olhar pra cima e notar que estamos andando no meio de ruínas, que parecem prestes a cair em nossas cabeças. É assim com a tradicional Igreja de Nossa Senhora da Lapa dos Mercadores; de propriedade de uma ordem religiosa praticamente falida de mesmo nome, a linda Igreja tem sua fachada na esquina da Travessa do Comércio caindo aos pedaços. Blocos de pedra e tijolos já caíram, e o templo, que é famoso por ter recebido uma bala de canhão na Revolta da Armada, já chegou a ser interditada pela Defesa Civil, como mostramos aqui. A Ordem da Lapa dos Mercadores também é proprietária de um pequeno prédio na rua Sete de Setembro.

Screen Shot 2022 12 10 at 15.50.35 Ruínas na rua do Ouvidor amedrontam frequentadores do Polo Gastronômico, que vem renascendo
A parede da Igreja de Nossa Senhora da Lapa dos Mercadores pela Travessa do Comércio é uma ruína, que contrasta com a beleza interna do templo, que está fechado há anos, propriedade de uma Ordem Religiosa em declínio

Só que a igrejinha caindo aos pedaços acaba sendo a menor das preocupações dos transeuntes. Os prédios 24, 26 e 28 da rua do Ouvidor são verdadeiras ruínas. Suas fachadas caindo aos pedaços são o reflexo de mais de 20 anos sem nenhum tipo de cuidado ou ocupação. Plantas nascem pelas paredes, destruindo e soltando afrescos do início do século XX. Janelas caindo, telhado esburacado, reboco soltando. Os pedaços vinham caindo nas ruas até que sua proprietária, a Irmandade da Santa Cruz dos Militares, acabou tendo que instalar um imenso apara-lixo com andaimes para evitar que alguém acabasse atingido pela destruição total dos edifícios, que vem sendo levada a termo nos últimos anos, apesar de tratar-se de uma instituição que, segundo informações do mercado imobiliário, teria mais de 300 imóveis, incluindo um quarteirão inteiro no bairro de Botafogo. O apara-lixo, pavorosa armação de metal, se confunde com as pichações nas cantarias centenárias, numa região que é protegida pelos principais órgãos de Patrimônio. O conjunto arquitetônico da região é tombado pelo Iphan, por exemplo.

Realmente é um lugar cujo desenvolvimento acaba pausado por que estes imóveis destruídos estão aqui parados há mais de 20 anos. Assustam as pessoas, são focos de mosquitos, o reboco vive caindo, além do aspecto de sujeira e mau trato. Um vizinho assim a gente só torce pra tomar jeito um dia”, disse Domingos Antunes, administrador de um imóvel na Travessa do Comércio, que não consegue alugar há mais de 4 anos. Para Francielly Silvino, que disse costumar almoçar no local toda semana, as ruínas da Irmandade causam preocupação: “Eu só sento bem longe, já vi cacos caírem lá de cima em dia de vento”, reclama.

Advertisement

Os sobrados 26 e 28 receberam na última semana uma rede para impedir as dezenas de pedras que vinham se desprendendo de atingir pedestres. O 24 continua com a fachada destruída, mas sem apara-lixo e sem a rede. Uma rápida busca no site do TJ-RJ mostra que os problemas dos prédios acabaram ocasionando mais problemas: um vizinho processa a Irmandade por danos causados a seu prédio, na Travessa dos Mercadores. O prédio teria sido danificado do 4o. andar até o térreo, e ele pleiteia indenização. Estivemos no local e a situação dos prédios realmente parece feia (fotos).

A região vem recebendo atenção da Secretaria de Conservação, que fez consertos em calçadas, nas ruas e também refez todo o sistema pluvial da região do Arco do Teles até a Praça XV. Mas o problema das ruínas das propriedades das Ordens Religiosas só se agrava há anos, na região. Segundo informações, todos os imóveis do lado par da rua do Ouvidor entre a Primeiro de Março e a rua do Mercado pertencem à tal Irmandade dos Militares, incluindo as ruínas 24, 26 e 28. Do chão, é possível ver que o telhado está rompido, e que chove dentro dos imóveis, além das fachadas que estão se despedaçando, das cantarias tomadas de pichações e do imenso andaime que circunda os imóveis, dificultando o fluxo de pessoas e a mobilidade na rua do Ouvidor e na Travessa dos Mercadores.

Um arquiteto especializado em imóveis históricos consultado pelo DIÁRIO deu conta de que o Iphan tenta há anos solucionar o problema, e que há a possibilidade de os imóveis receberem multas milionárias pelo descumprimento de sucessivas notificações. Segundo ele, os imóveis já foram vistoriados e há risco de desabamento da parte interna; os imóveis ainda têm estrutura de madeira, e a chuva constante pode ter causado problemas estruturais graves. Ainda segundo a fonte, as fachadas com os belos detalhes são de custosa reconstituição, e os órgãos de patrimônio exigem que sejam refeitas exatamente como eram. Os imóveis são isentos de IPTU por pertencerem a instituições filantrópicas.

Os imóveis não tem uso religioso; sempre foram alugados para comerciantes, e a renda é recebida pelas irmandades. Os imóveis 26 e 28 estão arruinados há décadas e ficam bem na esquina da Ouvidor com a Mercadores. O 24, na Ouvidor, estava alugado a um restaurante, mas agora está para alugar, apesar de sua fachada caindo aos pedaços. As irmandades são ordens religiosas leigas, que, apesar de professarem a fé católica, são independentes da Igreja e não estão sob o comando da Arquidiocese do Rio. São como associações de pessoas que não são padres nem freiras mas que mantinham igrejas particulares. Teoricamente, a Arquidiocese poderia interferir e intervir nas ordens ou irmandades que se encontram em dificuldades ou que enfrentam administrações danosas a seu patrimônio, porém ao fazê-lo a Igreja arrisca ter responsabilidade sobre suas dívidas, inclusive trabalhistas.

Enquanto isso, o Centro do Rio sofre por conta da má administração destas instituições.

Advertisement
Receba notícias no WhatsApp
entrar grupo whatsapp Ruínas na rua do Ouvidor amedrontam frequentadores do Polo Gastronômico, que vem renascendo
Advertisement

3 COMENTÁRIOS

  1. Há dias, li uma reportagem que a alerj quer comprar um prédio que já foi do Eike, e transformar em residência social….mais uma favela no coracao do RJ….os políticos não estão preocupados com manutenção de nada, só querem é meios para continuar sugando os recursos públicos.

  2. É a inoperância do Estado que provoca isso. Quando o custo de deixar ruir é menor que o de conservar, isso vai continuar acontecendo. Preferem pagar as multas do que restaurar. O que devia acontecer é a prefeitura desapropriar e leiloar para algum grupo que tivesse um projeto e recursos para a restauração. O que não dá é ficar esperando uma tragédia anunciada acontecer.

  3. Ué mas essa é a realidade de toda a cidade, praticamente. Tudo é feio, cinza, acabado. Estava vendo o documentário da Flor De Liz na HBO e como tem vários trechos com imagens de drones pelo Rio e Niterói, dá pra ver não só a favelização desse lugar horroroso, bem como a degradação dos prédios e suas arquiteturas obsoletas. O Rio é TODO uma casa abandonada. Todos esses prefeitos e governadores que passaram por aqui, bem com essa desgraça de tráfico, milícia e tudo que há de sórdido e imundo nessa sociedade deveria ser jogado numa ilha para conviver entre eles até morrerem. Desgraçados.

Comente

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui