Secretário assina exoneração de cientista e indicada do PL deve assumir presidência da Fundação de Amparo à Pesquisa

Comunidade cientifica se opôs à saída de Jerson Lima Silva e possível entrada de Caroline Alves da Costa, presidente da Faetec e aliada do deputado Dr. Serginho

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Foto: Fiocruz/Divulgação

Na última sexta-feira (25/10), o Secretário de Ciência, Tecnologia e Inovação do Estado do Rio de Janeiro, Anderson Luis de Moraes, assinou a exoneração do presidente da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj), o cientista Jerson Lima Silva. Em seu lugar, deve ser nomeada Caroline Alves da Costa, atual presidente da Faetec – Fundação de Apoio à Escola Técnica. Caroline é apadrinhada política do deputado estadual Dr. Serginho (PL). Para a mudança ser concretizada ainda falta a assinatura do governador Cláudio Castro (PL).

Na presidência da Faetec, no dia em 27 de janeiro de 2023, Caroline Alves da Costa enviou um ofício pedindo ao então reitor da Uerj, Mario Sergio Alves Carneiro, a volta de um programa da Universidade que havia sido denunciado como base para “rachadinhas” do Governo Estadual e finalizado em dezembro 2022 após notícias na imprensa. À época, o pedido de Caroline foi negado.

De acordo com uma reportagem assinada por Rubem Berta e Igor Mello, o governo Cláudio Castro (PL) articulou com a Uerj a liberação de R$ 44,5 milhões para retomar no ano passado o projeto de pesquisa com suspeita de rachadinhas.

Reportagens do UOL mostraram desde dezembro de 2022 irregularidades neste projeto tocado pela Uerj com dinheiro do governo fluminense. Entre as suspeitas, estão contratações de cabos eleitorais fantasmas de deputados bolsonaristas (do PL) aliados de Claudio Castro e o já citado esquema de rachadinhas. As verbas passavam por fundações e outras instituições estaduais.

Além das suspeitas de desvios, Caroline está muito longe de ser qualificada para o cargo, pois tem apenas um curso de graduação em Pedagogia“, afirmam membros da comunidade cientifica em um comunicado.

As críticas da comunidade científica já vinham acontecendo durante a semana passada, quando o secretário Anderson Luis de Moraes avisou que pretendia nomear para a presidência da Faperj o empresário do ramo de corretoras de seguros e ex-deputado federal Alexandre Valle (PL), candidato não eleito à Prefeitura de Itaguaí. Os cientistas se queixaram porque Alexandre “não tem qualquer conhecimento da área e não possui nem graduação de nível superior“.

O anúncio causou forte indignação da comunidade científica fluminense, que reuniu centenas de representantes na manhã de quinta-feira, 24/10, para protestar contra a decisão em frente ao prédio da Faperj, que também abriga a SECTI. Alexandre Valle deve assumir o comando da Faetec no lugar de Caroline Alves da Costa caso ela vá mesmo para a presidência da Fundação de Amparo à Pesquisa.

O troca-troca de nomeações políticas deixa a comunidade científica consternada e muito preocupada com o futuro da Faperj, que é a principal fundação de amparo à ciência do RJ, com orçamento fixo de 2% do valor líquido da arrecadação do estado do Rio. Ela reconhece a qualidade da gestão do prof. Jerson, que está à frende da instituição desde 2019 e antes disso já atuava como Diretor Científico da mesma desde 2003. Jerson é médico formado pela UFRJ, doutor em Biofísica e pesquisador titular também da UFRJ. Com cerca de 230 trabalhos científicos publicados em revistas internacionais, é membro da Academia Mundial de Ciências, da ABC, da Academia Nacional de Medicina (ANM), tendo sido agraciado com inúmeros prêmios e distinções nacionais e internacionais“, informa um comunicado dos cientistas.

Durante a manifestação do dia 24/10, estavam representantes da Academia Brasileira de Ciências (ABC), da Sociedade Brasileira de Progresso para a Ciência (SBPC), da UFRJ, Uerj, UniRio, UFF e PUC-Rio, dentre outras. A ABC, SBPC e a Confederação de Reitores enviaram cartas abertas ao governador com um apelo para que não dê seguimento à exoneração.

“Ao longo da história, a ciência e a tecnologia no Brasil têm sido impulsionadas por lideranças dedicadas, capazes de transformar realidades e abrir novos horizontes para o desenvolvimento. No Rio de Janeiro, a Faperj, desde sua criação, tem sido um exemplo desse compromisso com a inovação e a pesquisa. Fundada por grandes nomes como Carlos Chagas Filho e contando com a passagem de figuras ilustres como Darcy Ribeiro, a fundação sempre teve à frente cientistas de peso, capazes de compreender as complexidades do sistema científico e de propor soluções que atendam às necessidades da sociedade e do desenvolvimento econômico. No entanto, o cenário atual coloca em risco essa tradição de excelência. A possível exoneração do Prof. Jerson Lima, um cientista de renome internacional, e a substituição por um deputado de formação acadêmica incompleta, com pouca ou nenhuma experiência na gestão científica, é motivo de grande preocupação. O professor Jerson Lima, ao longo de sua carreira, demonstrou uma liderança incontestável na comunidade científica e uma visão inovadora para o futuro da pesquisa no Brasil. Sua atuação na Faperj tem sido marcada por uma gestão que valoriza a inclusão de jovens pesquisadores, a capacitação de docentes e o incentivo às mulheres na ciência, elementos essenciais para o avanço científico no país. A decisão de trocar um gestor com esse perfil por alguém com um currículo notadamente limitado levanta questões sobre o compromisso do governo com a continuidade e o fortalecimento das políticas de ciência e tecnologia. A Faperj, sob a gestão do Prof. Jerson, tornou-se um modelo para outras fundações de amparo à pesquisa no Brasil, contribuindo de forma significativa para o desenvolvimento do conhecimento e da inovação no estado e no país. É essencial que o governador do Rio de Janeiro reflita sobre o impacto de tal mudança e sobre a necessidade de se manter à frente da Faperj uma liderança à altura de seus desafios e responsabilidades. A ciência, para prosperar, precisa ser gerida por quem compreende suas dinâmicas e seus potenciais transformadores“, disse o professor Vitor Ferreira, assessor da Faperj.

A presidência da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) também se posicionou dizendo que “vem juntar-se à comunidade científica do Rio de Janeiro e de todo país, para manifestar sua preocupação em relação à decisão do Governo Estadual de substituir o presidente da Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj). A Fiocruz, como instituição pública e estratégica de saúde, é testemunha das contribuições de Jerson Lima da Silva, à frente da Faperj, para consolidar e expandir a produção e o reconhecimento das instituições de Ciência, Tecnologia e Inovação (CT&I) de nosso estado. Médico, professor e pesquisador reconhecido no Brasil e no exterior, Jerson Lima tem se reafirmado como gestor de visão estratégica, que conduziu a Faperj a uma posição elevada entre as principais agências de fomento à pesquisa científica e tecnológica em nosso país. Seu entendimento do papel da ciência e da tecnologia para o progresso econômico e social, identifica-se plenamente com nossa missão institucional de contribuir com pesquisa, produção de insumos e serviços para a promoção da saúde da população, a redução das desigualdades e iniquidades sociais, a consolidação e o fortalecimento do Sistema Único de Saúde (SUS), a elaboração e o aperfeiçoamento de políticas públicas de saúde. Em sua gestão, a Faperj foi fundamental na defesa da ciência e ganhou maior agilidade na garantia de bolsas e recursos financeiros fundamentais ao desenvolvimento de pesquisas, além de incentivar parcerias entre o setor público e o privado, e a transferência de tecnologia como um mecanismo de inovação. Desse modo, temos absoluta convicção de que, ao reforçar o posicionamento de diversas instituições científicas, é necessário que o governo estadual submeta à maior ponderação e reflexão sua decisão de promover mudanças na direção da Faperj, sob o risco de causar um impacto devastador nas conquistas de um projeto construído com tanto zelo e competência nos últimos anos”.

A comunidade científica lançou uma petição online contra a medida.

A reportagem do DIÁRIO DO RIO fez contato com Caroline Alves da Costa, mas ainda não teve resposta até o fechamento desta matéria.

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