Nosso maior escritor, Nelson Rodrigues, dizia que algumas partidas de futebol são tão importantes que nelas estariam presentes os vivos, enfermos e até os mortos!
Não seria diferente da partida de futebol, Final da Libertadores das Américas, pela forma como ela se construiu. Já sabia que tudo o que se conquista pelo Tricolor é com sofrimento, pois é nossa marca e nos forjamos assim. Levava comigo a cicatriz daquela partida de 15 anos atrás, na qual tinha certeza da vitória de um jogo que levou todo esse tempo para enfim terminar.
Na linha da fé e no mês que se comemora João de Deus, fiz o mínimo que me cabia e organizei, com muitos amigos tricolores, uma Missa com o Padre Omar, o mesmo da missa aos pés do Cristo Redentor na arrancada milagrosa de 2009, que nos livrou do rebaixamento. A Missa foi tão linda por ver Francisco Horta à beira dos seus 90 anos profetizando como um mantra o “Vencer ou Vencer“. Disse, porém, ao final da Missa, para muitos amigos, que eu estava esperando receber um “sinal” que me mostrasse que aquele sofrimento teria algum tipo de representatividade para alcançar a graça, como já tive no passado. Porém, esse sinal até o dia da partida não me havia chegado, e isso, no meu íntimo, muito me preocupava.
Procurava esse sinal em todos os lugares e momentos, e ele não vinha, o que trazia uma preocupação no íntimo do meu coração. O dia do jogo não chegava, e a tensão era muito grande, e a ansiedade crescia, sinal de que as preces seriam em vão.
Foi quando chegou o dia. Ao cruzar a passarela do metrô, recebi algo que me mostrou que aquele era o sinal que esperava: uma pessoa do nada ofereceu uma faixa de campeão a um torcedor bem à minha frente, que não aceitou por puro medo ou superstição. Depois essa pessoa, que só tinha essa faixa nas mãos, ofereceu a mim sem cobrar nada. Achei estranho, resisti a aceitar, mas ele insistiu. Não consigo mais ver os seus olhos ou me lembrar da sua face. Só me recordo da forma como insistentemente me entregava aquela faixa.
Coloquei imediatamente a faixa dobrada no bolso do casaco, pois em nenhum momento poderia mostrá-la a outra pessoa, pois como todos sabem, comemorar antes poderia dar azar. No meu íntimo, eu sabia que aquela situação era o sinal que eu tanto esperava! Era o sinal que certamente estava vindo de minha mãe, Dona Leda, que esteve sempre comigo, em todas as vitórias ou derrotas de minha vida, entre elas a do meu Fluminense.
Não comentei nada sobre o sinal com ninguém, mas mantive a faixa no bolso durante toda a partida, e até quando retirava algumas coisas, fazia questão de que a faixa não saísse do meu bolso, sequer um pedaço do meu bolso.
Assisti à partida junto com meu filho, e sua presença fez também com que eu sentisse ainda mais a força da presença de Dona Leda! Sentia de fato que aquela junção de forças vinha especialmente dela!
O sofrimento é nossa marca, e certamente também estaria nesse jogo épico! Não conseguia mais me conter à medida que os minutos se passavam. Apertava a faixa pelo lado de fora do casaco, e teve um momento que achei que mais uma vez aquela luz estaria distante de nós quando fomos à prorrogação.
A entrada de JK vestindo a camisa 9 do Fred, que era o grande ídolo de Dona Leda, me deu nova esperança! A esperança quando ele afundou as redes com um chute que veio com toda força, com toda raiva do preconceito contra jovens pobres. O foguete foi levando a emoção de todos nós, vivos e mortos, que naquele momento ainda aguardávamos com expectativa e com sofrimento!
Lembrei, ao fim, de todos os Tricolores amigos que certamente estariam naquele momento! Lembrei de Jesus Chediack, Francisco Dornelles, lembrei da minha querida Daisy Lúcidi! Amigos que já partiram, mas que certamente estariam fisicamente conosco naquele momento, mas que estavam de fato naquele palco de emoção!
Ao fim de toda vitória do Fluminense, Dona Leda me ligava para falar: ‘Viva o Fluminense!‘ Nas derrotas, ela se calava e só me ligava no dia seguinte para me consolar!
O meu amor também se consolidou com Dona Leda através do Fluminense, e ontem não poderia ser diferente em lembrar dela. Tenho a certeza de que aquela faixa do desconhecido me foi enviada por ela.
Ao fim do jogo, fui sozinho para um canto, liguei para o telefone dela, deixando tocar, sem que ela me atendesse, até o telefone desligar, e eu pudesse falar para ela com minha emoção e lágrimas: ‘Dona Leda, viva o Fluminense!‘
Tive a certeza de que ela estava em algum lugar vibrando comigo, e agora com meu filho Francisco, nessa vitória que estava guardada há milênios.
Tudo que sou na minha vida hoje penso que não era uma construção que fiz só para mim, pois na ausência dela chego à conclusão de que fazia para dar orgulho para ela, e esse orgulho me realimentava para superar cada vez mais, até nas derrotas e vitórias do meu Fluminense!
Ela me faz uma falta muito grande como uma referência de vida, e hoje compensa no amor que tenho pelo meu filho, mas sabia que de alguma maneira o dia de ontem seria uma forma de levar o meu orgulho a ela através do meu amor pelo Fluminense.
Agradeço por ter percebido o sinal e por ela ter me entregado aquela faixa, que tinha certeza que poderia colocar no meu peito ao final! Ao chorar e gritar: ‘É campeão,’ pude colocar essa faixa que Dona Leda me deu e tive a certeza de que ela estava juntinho de mim naquele momento.
Viva o Fluminense e Viva Dona Leda!
Muito bom!
Saudações!