William Bitar: Primeiro de Maio: Dia do Trabalhador ou do Trabalho? Origens e celebrações no Rio de Janeiro

A histórica data tem um longo passado no Rio

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O Dia do Trabalhador, efeméride internacional, comemorado no dia Primeiro de Maio em diversos países do mundo, tem sua origem associada a uma greve iniciada em 1º de maio de 1886, em Chicago, EUA. Tratava-se de um movimento operário reivindicando melhores condições de trabalho e redução da jornada diária, que chegava a 17 ou 18 horas, como em muitas outras tantas fábricas.

Durante as manifestações, que duraram alguns dias, houve confronto com as forças repressoras resultando em prisões e mortes de trabalhadores, com posterior execução daqueles considerados líderes. Era apenas o início da resistência contra falsas promessas da Revolução Industrial, cujos reais objetivos visavam aumentar a produção e, consequentemente, o lucro, com a exploração da força de trabalho da mão-de-obra.

Três anos depois, uma nova manifestação no norte da França foi dispersada pelas forças de segurança, com a morte de uma dezena de trabalhadores. O significado da data ganhava consistência e alguns meses depois, em Bruxelas, a Internacional Socialista proclamou o 1º de maio como dia internacional de reinvindicação de condições laborais.

Após a Revolução Russa de 1917, em 1920, a recém-criada União Soviética adotou a data como feriado nacional, acompanhada por outros países.  No entanto, os Estados Unidos não reconhecem a data, comemorando seu Labor Day na primeira segunda-feira de setembro, homenageando a importância dos direitos trabalhistas, mas omitindo as mortes americanas em Illinois, em 1886, que geraram o Primeiro de Maio internacional.

No Brasil, as comemorações do Dia do Trabalhador estão associadas à herança imigrante, principalmente italianos e espanhóis, contratados pelas indústrias em crescimento, muitos deles oriundos da lavoura. Devido às precárias condições de trabalho, surgiram as lutas pelos direitos, assim como ocorrera na Europa.

Durante o governo Venceslau Brás, houve uma greve geral entre junho e julho de 1917 em São Paulo, possivelmente deflagrada por integrantes do movimento anarquista com a participação de operários e comerciantes. Após cinco dias de paralisação geral, as reivindicações por melhores condições de trabalho e aumento de salários foram atendidas.

A imprensa registrou uma grande manifestação de 1º de Maio ocorrida no Rio, em 1919, quando houve um grandioso comício na Praça Mauá. Dali, cantando hinos, a multidão dirigiu-se ao Palácio Monroe, onde funcionava o Senado Federal, apresentando suas reivindicações.

Após o final da Primeira Guerra e uma grande efervescência nacional como o movimento tenentista, a coluna Miguel Costa-Prestes, estado de sítio, aumento significativo da força nacional do operariado, em setembro de 1924, o Presidente Artur Bernardes decretou: “Artigo único: é considerado feriado nacional o dia 1 de maio, consagrado à confraternidade universal das classes operárias e à comemoração dos mártires do trabalho”.

Com a Revolução de 1930 e o início do primeiro período Vargas, o movimento operário gradativamente assistiu a transformações em sua estrutura política. As influências anarquistas e comunistas, atuantes desde o início do século XX, foram cooptadas pelo trabalhismo varguista, que em breve estaria representado nas figuras dos pelegos, infiltrados nas organizações dos trabalhadores.

Em breve, Vargas implementaria a política dos Institutos de Aposentadorias e Pensões, agregando profissionais de áreas distintas, cujas contribuições retornavam sob forma de saúde, lazer, aposentadorias e habitação, através dos diversos conjuntos habitacionais construídos em todo o Brasil, com maior concentração no Rio de Janeiro: os IAP’s, familiares para muitos cariocas conhecidos como iapis, iapcs, iapetecs…

A propaganda oficial getulista promoveu uma sutil alteração no Dia do Trabalhador, que se tornou do Trabalho. Também foi criado o Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, no primeiro mês do novo governo, em novembro de 1930.  Os protestos e passeatas anteriores seriam substituídos por festividades, desfiles e celebrações patrocinadas pelo poder público, cujo grande cenário foi o Estádio São Januário, então o maior do Brasil, popularmente conhecido como campo do Vasco da Gama, a partir de 1939.  Afinal, na política trabalhista, Vargas havia concedido muitas vantagens ao trabalhador, muitas delas anunciadas neste dia, como o aumento anual do salário-mínimo para os “Trabalhadores do Brasil”.

Também no Dia do Trabalho, em 1º de maio de 1943, Vargas promulgou a Consolidação das Leis Trabalhistas – CLT, flexibilizada no Governo Temer mais de sete décadas depois, com discussões pouco aprofundadas, alterações que muitos consideram prejudiciais para a classe trabalhadora e vantajosas para os patrões.

Durante o Estado Novo, o 1º de Maio talvez fosse a festa maior, na qual o presidente se encontrava diretamente com o povo, discursando da tribuna no setor social.  Era o momento de homenagear o Trabalho, portanto, um incentivo da sociedade de consumo para acelerar a produção, aumentando os lucros. No gramado do estádio, corais de estudantes, orquestras, enquanto na pista de atletismo desfilavam jovens com estandartes ostentando a imagem do Presidente.

Em breve, a Esplanada do Castelo, no Centro, receberia seus novos edifícios ministeriais, entre eles Fazenda, Educação e Trabalho, este último com sua fachada art-déco, ao lado do neogrego destinado às atividades da Fazenda. Aos fundos, um moderno edifício para abrigar o Ministério da Educação e Saúde.

Criavam-se múltiplos cenários para as celebrações de veneração ao chefe de estado, assim como ocorriam em outros governos totalitários no mundo.

Vargas foi deposto em outubro de 1945, mas nas eleições seguintes, em 1950, retornou eleito à presidência, contando com apoio fortalecido de associações e partidos trabalhistas, como o PTB, que ajudara a criar.

No dia 1º de maio de 1951, discursava Getúlio para os trabalhadores:

O que é insuportável é que dentro da sociedade, onde tudo deve ser harmonia, equidade e cooperação para o bem comum, uns reservem para si todos os benefícios e outros carreguem apenas o fardo das privações e dos sofrimentos. Queiram ou não queiram ouvir-me os inimigos do povo, continuarei proclamando em voz alta que não é possível manter a sociedade dividida em zonas de miséria e zonas de abundância; em que uns dispõem do supérfluo e a outros falta o indispensável para a subsistência; em que uns acumulam para si o mais que podem e outros carecem de roupa, de lar e de pão; em que uns padecem a fome e outros especulam com a fome.

Três anos após, em 24 de agosto, morria Vargas no Palácio do Catete, encerrando um ciclo na política trabalhista nacional.

Jamais os futuros primeiros de maios nacionais teriam semelhantes celebrações e significado!

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Carioca, arquiteto graduado pela FAU-UFRJ, professor, incluindo a FAU-UFRJ, no Departamento de História e Teoria. Autor de pesquisas e projetos de restauração e revitalização do patrimônio cultural. . Consultor, palestrante, coautor de vários livros, além de diversos artigos e entrevistas em periódicos e participação regular em congressos e seminários sobre Patrimônio Cultural e Arquitetura no Brasil.

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