William Siri: Novo Índice de Progresso Social escancara a desigualdade social no mapa da cidade

Metodologia permite avaliar qualidade de vida dos cidadãos para além dos aspectos econômicos

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Foto: Urbe Carioca

No mês passado, a Prefeitura do Rio, por meio do Instituto Pereira Passos, divulgou relatório contendo informações do Índice de Progresso Social (IPS) no Rio de Janeiro, com base no ano de 2022. Este índice, que cumpre metodologia internacional, procura medir o desenvolvimento socioambiental da população considerando sua experiência diária, para além dos aspectos puramente econômicos. Ou seja, o IPS precisa ser considerado quando pensamos a cidade e por isso irei me debruçar sobre tal análise neste artigo.

Como diferencial, ele utiliza medidas ligadas à qualidade de vida dos vários bairros da cidade, acabando por avaliar a influência direta das políticas públicas nas esferas federal, estadual e municipal na vida das pessoas. Para calcular as notas não são utilizados parâmetros ligados à renda ou à geração de riquezas (PIB). O que importa, por exemplo, é saber se o cidadão tem suas necessidades essenciais atendidas: se possui acesso a ensino, comunicação, habitação, mobilidade urbana e etc.

Aqui no Rio, o IPS começou a ser calculado em 2016 e as medidas eram dadas apenas para as Regiões Administrativas. Em 2022, os dados produzidos receberam novo grau de detalhamento, fornecendo o recorte pelos bairros. Essa mudança permite um melhor diagnóstico das desigualdades da cidade.

A obtenção do índice é dada pela média das notas entre três dimensões: necessidades humanas básicas, que abrangem fatores como nutrição, acesso à saúde, água e saneamento, moradia e segurança; fundamentos do bem-estar, que avaliam acesso à educação, tecnologia (telefone, celular e internet), sustentabilidade e coleta seletiva, entre outros indicadores; e oportunidades, que tratam da mobilidade urbana, acesso ao Ensino Superior, homicídios de jovens negros e violência contra a mulher, entre outros.

Dos 163 bairros do Rio, 158 participaram da composição do IPS 2022. Ficaram fora dele Paquetá, Lapa, Vila Kennedy, Jabour e Ilha de Guaratiba. É importante também ressaltar que alguns dados muito relevantes, como o acesso à água canalizada e esgotamento sanitário, são do Censo de 2010, o que por si só já distorce o retrato atual da cidade que o índice propõe. Ainda estão desatualizados indicadores como acesso à telefone e internet e ao Ensino Superior por conta do último detalhamento divulgado referente também ao Censo de 2010 coletado pelo IBGE.

No mapa abaixo temos o resultado do estudo. Os bairros com piores notas aparecem em vermelho, seguido dos bairros em laranja. As melhores notas estão em verde escuro e, em seguida, verde claro.

image 19 William Siri: Novo Índice de Progresso Social escancara a desigualdade social no mapa da cidade

É nítida a concentração das piores notas nas regiões fora do eixo Zona Sul–Barra da Tijuca. No ranking de bairros, a pior colocação ficou com a Cidade Nova que, por ironia, é onde está localizada a sede da Prefeitura do Rio de Janeiro. Este contraste é frequente: regiões urbanizadas lado a lado de favelas sem acesso a serviços públicos básicos.

Este mapa é importante pois torna visualmente nítido os obstáculos impostos aos moradores das áreas periféricas. Nelas, a falta de mobilidade urbana e o atendimento limitado na rede de saúde pública salta aos olhos. Nas regiões de favelas, além dos problemas ligados à falta de água e de conexão com a rede de esgoto, despontam a falta de acesso ao Ensino Superior, o que só perpetua as desigualdades da nossa sociedade.

Muitas das notas poderiam ser melhores se houvesse vontade política e iniciativa da Prefeitura. O bairro de Grumari, por exemplo, demonstrou ter a menor taxa de acompanhamento pré-natal. Os bairros de Bonsucesso, Camorim e Pedra de Guaratiba apresentaram grande taxa de mortalidade por doenças crônicas. Sobre os casos de dengue, vemos os três piores resultados nos bairros de Pedra de Guaratiba (mais uma vez), Barra de Guaratiba e Guaratiba, respectivamente.

Nos aspectos ambientais, foi observado que, pelo menos, 60% dos bairros viram a redução de sua cobertura verde no comparativo com o ano de 2013, o que influencia diretamente no bem-estar da população. Quanto menos vegetação, maior a sensação térmica nas localidades, que sofrem com a formação de ilhas de calor. Este resultado é totalmente incompatível com o que se espera de uma cidade que deveria estar no centro da discussão das mudanças climáticas. Vale lembrar que nosso mandato aprovou a Lei 7.315/2022, que reconhece o Estado de Emergência Climática e estabelece como meta a neutralização de emissões de gases de efeito estufa.

No quesito violência contra as mulheres, a Zona Oeste chama muito a atenção. Cinco dos dez bairros com o maior número de registros estão na região: Grumari, Pedra de Guaratiba, Camorim, Barra de Guaratiba e Gardênia Azul.

Diante de tais dados, o IPS constata as desigualdades dentro de uma mesma área da cidade. A Barra da Tijuca é um exemplo disso. Enquanto o bairro é o primeiro colocado no ranking, Grumari, bairro quase vizinho dela e pertencente à mesma região administrativa, está entre os quatro últimos colocados da classificação geral na cidade. Vale dizer que, apesar do estudo não considerar aspectos econômicos, se observa uma melhor qualidade de vida onde a renda per capita é maior: depois da Barra da Tijuca, os 11 bairros que a seguem no ranking são da Zona Sul.

Trocando em miúdos, tais resultados escancaram a ausência do Poder Público no combate às desigualdades. O estudo se mostra um documento importante para cobrar da Prefeitura ações efetivas neste sentido, o que faremos. Não se pode permitir que esses indicadores morram no papel: eles devem balizar o planejamento da cidade por resultados futuros melhores, em nome da equidade na execução das políticas públicas e de melhorias no direcionamento de recursos para os investimentos públicos. 

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1 COMENTÁRIO

  1. Pois é, privatizaram a CEDAE, e agora? Vão levar saneamento básico para as áreas mais remotas e com população de menor poder aquisitivo? Cobrando quanto pelo serviço? Ou é o Estado que tem que pagar por todo o ônus?

    Todo o transporte coletivo da cidade foi privatizado, há anos; e daí? Qual a melhora significativa? Os empresários privados do setor vão meter a mão no bolso para investir em ampliação e melhoria sem extorquir os usuários com tarifas fora da realidade da maioria da população? Ou é o Estado que tem que pagar por todo o ônus?

    Essas construtoras não podem ver uma área verde que já querem concretar tudo e erguer esses blocos horrorosos de concreto e vidro, tudo com o beneplácito do poder judiciário, que concede liminares para quem paga mais por elas. A cidade vai virando uma selva de concreto e asfalto, e tem muita gente achando é bom! Alguns chamam esse processo de “revitalização”, como se sentir calor e olhar para paredes e pisos de concreto fossem realmente “devolver vida” para alguém.

    O estudo é bonitinho, mas as soluções dos problemas são sempre mais do mesmo.

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