Conheci o cartunista Ykenga no tempo em que ele trabalhava aqui, no jornal O Dia. Foi ele que me levou para conhecer o “Beco do Rato”.
O butiquim – com “u”, como o carioca fala – não poderia ser mais bem localizado. Fica na rua Joaquim Silva, 11, na Lapa. Entre os Arcos da Lapa, a Sala Cecília Meireles e a escadaria Selarón, três monumentos cariocas.
Era um dos lugares preferidos pelo cartunista, que gostava de parar ali para comer o famoso pastel de fubá e tomar sua cervejinha, quando saía da antiga redação do jornal, na Rua do Riachuelo.
Foi Ykenga, por sinal, quem criou a logomarca da casa. Um rato de chapéu de palha tocando violão para uma lua apaixonada.
O Beco do Rato sobreviveu a invasão da Lapa pelos bares de grifes. Verdadeiros pés sujos de unhas pintadas, como bem definiu o sambista, escritor e boêmio, Moacyr Luz; autor do livro “Manual de Sobrevivência nos Botequins Mais Vagabundos”.
Um livro genial, que registra de forma bem humorada a memória afetiva e cultural dos botecos do Rio de Janeiro. São dezenas de depoimentos reunidos pelo autor que transcendem a experiência de frequentador de botequim e resgata aspectos fundamentais sobre a identidade e valores culturais da boêmia carioca.
Essa horda de bares e restaurantes caros e metidos a bestas que hoje abundam (ops!) a Lapa, acabaram com os pés-sujos e com a boemia do bairro.
A mesma velha Lapa que já viu passar Carmem Miranda, Madame Satã, Selarón, Lima Barreto, Geraldo Pereira, Osvaldo Nunes, Silvio Santos e o cartunista Péricles, criador do “Amigo da Onça”, entre outros.
O cardápio do buteco não é muito diversificado, mas conta com alguns quitutes da culinária mineira.
A especialidade do bar é o pastel de angú, criação dos escravos mineiros, que o inventaram com o intuito de aproveitar as sobras de fubá, a receita nasceu na pequena cidade de Itabirito e o itabiritense, Márcio, o dono do buteco, trouxe para o Rio.
A deliciosa iguaria é parecida com o risole, porém sua massa lembra polenta, já que leva fubá de milho. Super crocantes por fora e bem recheados e macios por dentro, são feitos na hora e chegam bem quentes à mesa.
No cardápio das bebidas, chama a atenção outra atração da “terrinha”: a cachaça de milho. Sua cor amarela intensa impressiona; já o sabor é suave. Dá para sentir bem o gosto do milho; mas ele não é exagerado e combina na medida certa com o álcool da cachaça. Mas, vá devagar!
Outra atração do buteco é a roda de samba que rola todos os dias, menos às segundas-feiras, e já teve como convidados nomes consagrados como Marquinho Satã, Arlindinho e Joel
Teixeira que se misturam com sambistas da nova geração.
Sentamos numa mesa, no meio da rua, que nos fins de semana fica interditada para as apresentações de cinema, poesia e chorinho, outras atrações do “pé-sujo”.
Entre cervejas e cachaças de Minas – Ykenga é grande conhecedor, chegou a ser membro da Academia da Cachaça. Não sei se ainda é – falamos dos porres que tomamos no falecido bar do Samuca, em Santa Tereza e rimos ao lembrar da velha história do garfo que o “negão” (negão pode, né?) quase enfiou na mão do meu filho Eddie, numa disputa por um pedaço de pizza, num boteco, na Ilha Grande; que Ferreth – outro cartunista, amigo nosso, que publicava a tira “Dimenor” no O Dia – sempre repete quando a gente se encontra.
Sentei e fui logo avisando: “Nada de cerveja sem álcool. Quem bebe cerveja sem álcool, não gosta de cerveja, gosta de mijar”.