São muitos os buracos por onde escorre o dinheiro público no estado do Rio de Janeiro. Conseguir identificar e estancar esses vazamentos são passos fundamentais para o Rio fazer o ajuste fiscal que governantes perdulários tentam evitar a todo custo. Identificamos e denunciamos um desses focos de descuido com nosso dinheiro. O Tribunal de Contas do Estado mandou corrigir.
Em janeiro, recebi em meu gabinete, em Brasília, uma denúncia de um servidor público estadual que dizia que a Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj) e o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJ-RJ) têm inflado, todos os anos, a estimativa dos gastos destinados ao pagamento de seus funcionários da ativa. Uma manobra que tem passado despercebida pelos órgãos fiscalizadores. Tão logo recebi a denúncia, enviei um ofício ao Tribunal de Contas do Estado (TCE-RJ) solicitando que averiguasse as informações.
No Rio, a lei orçamentária permite que a Alerj e o TJ-RJ encaminhem suas estimativas de gasto anual com funcionários ao governo do estado, que precisa repassar os valores para os órgãos quitarem suas folhas de pagamento. Os cálculos devem ser feitos obedecendo a parâmetros técnicos e a um limite financeiro estabelecido por lei. Porém, aproveitando-se de uma brecha na legislação orçamentária, os órgãos solicitam os recursos até o valor máximo permitido – a fim de não incorrerem numa irregularidade fiscal – independentemente se vão usar ou não. Melhor dizendo, pedem mais dinheiro do que realmente precisam.
Agindo assim, a Alerj e o TJ-RJ administram suas contas como se fossem ilhas de prosperidade cercadas por um mar de dificuldades. O problema disso é que a origem do dinheiro para os três poderes é o bolso do cidadão fluminense.
Essa prática já seria questionável em tempos de vacas gordas. Na crise que vive o Rio, é injustificável. No estado que teve que suspender o pagamento de sua dívida com a União e que em um passado recente atrasou o pagamento de fornecedores e servidores, esses recursos seriam de grande valia. O ajuste fiscal de que o Rio precisa só será possível com o compromisso dos três Poderes.
Para se ter uma ideia de quanto esse dinheiro faz falta, a Alerj informa em seu portal, que, desde 2018, tem “economizado” R$ 500 milhões por ano. Já o Tribunal de Justiça do Rio “cancelou” mais de R$ 500 milhões em 2020. No fim das contas, Alerj e TJ-RJ acabam se tornando os mocinhos da história. Com o “dinheiro superestimado” em caixa, invadem o trabalho do Executivo e investem em obras e fazem repasses que, sem critérios objetivos, são usados politicamente.
Em alguns casos, os recursos não liquidados são devolvidos aos cofres públicos, mas em outros são remanejados para novos gastos. No ano passado, por exemplo, Alerj e TJ-RJ transferiram essas “economias” para a rubrica “Despesa de Exercícios Anteriores”, que foge ao controle do TCE-RJ quanto aos limites de despesa de pessoal. Até 2020, esses órgãos custearam obras públicas nas áreas de saúde, educação e segurança, se apropriando da função do Poder Executivo.
É verdade que essa atitude não configura uma ilegalidade, mas com certeza atrapalha o equilíbrio das contas públicas. Isso porque milhões de reais ficam parados nos cofres do Tesouro do Estado, sem que o governo possa destinar a outras finalidades. Dinheiro que poderia estar sendo aplicado em saúde, educação, segurança, ou seja, em prol de toda a população.
No último dia 28, tivemos a primeira vitória para a população do Rio. O TCE-RJ determinou que o TJ-RJ altere a forma de cálculo de despesas com pessoal na Lei Orçamentária Anual (LOA) e na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para os próximos exercícios. A mesma decisão foi tomada em relação à Secretaria Estadual de Planejamento e Gestão, que precisa rever sua metodologia de cálculo. E, finalmente, na última quarta-feira (11), o plenário do TCE decidiu que determinará à Alerj que use critérios objetivos e claros para solicitar os recursos para despesas com pessoal e encargos sociais.
Sem dúvida, esse foi um passo importante, mas precisamos ir além até garantir que o dinheiro público, do pagador de impostos, seja tratado com zelo, eficiência e transparência. Dessa forma, vamos tornar o orçamento mais condizente com a realidade e permitir aumentar os investimentos públicos.
O importante é uma ação coordenada, com o fechamento da brecha na lei e estabelecendo critérios técnicos, objetivos e que considerem a real estrutura dos órgãos no orçamento. Não é Alerj ou TJ que economizam, pois não geram os recursos, não arrecadam e ainda têm seus quadros inflados e os salários idem. Quem gasta além do devido pela esperteza desses órgãos é o executivo, que acaba perdendo recursos importantes. Vou além: fechar essa brecha deveria ser exigência do Regime de Recuperação Fiscal.