O Morro da Providência é uma área de ocupação já muito antiga. Lá está a favela do mesmo nome, cujo início se deu em 1897, sendo considerada a primeira do Brasil. Há casas menos acabadas, mas também há diversos sobrados do início do século passado. O tempo consolidou-o como um espaço de moradia de trabalhadores e de produção de cultura popular.
A última intervenção desastrada e autoritária ali realizada foi uma tentativa de demolição de casas, algumas por estarem em áreas de risco, e outras por estarem no caminho da construção do teleférico. Os moradores de 832 casas, o que representava 1/3 da comunidade, se depararam com números pintados nas suas fachadas, de forma totalmente desrespeitosa, indicando que estavam condenadas. Mas, graças à sua mobilização, o número de remoções acabou sendo menor. Em 2014, veio o teleférico. Dois anos após a sua inauguração, veio a paralisação do serviço, e também a promessa de que voltaria a funcionar. Ainda não voltou.
Como área antiga da cidade, as vias pavimentadas do morro o são em paralelepípedo, algo que também ocorre em ladeiras de Santa Teresa, por exemplo. Esse tipo de pavimentação tem várias qualidades. É permeável e retarda a descida das águas pluviais, o que é uma grande vantagem em uma situação de crise climática. Esteticamente, é bastante superior ao asfalto e admite um matinho crescendo em suas frestas. Mas precisa de manutenção. Com o excesso de chuvas e veículos pesados passando quando o solo está encharcado, podem ocorrer deformações. Nada que uma boa manutenção não resolva.
Apesar de todas as suas qualidades, a Subprefeitura do Centro decidiu cobrir com asfalto as vias em paralelepípedos. De acordo com o entusiasmo do responsável pelo órgão, imagina-se que ele seria capaz de asfaltar até as vielas de Ouro Preto! O asfalto reflete mais calor, acelera a descida das águas pluviais, não é permeável, e é feio. Mas, obviamente agrada a uma parcela dos moradores que têm carro, que creem que circularão sobre um tapete. Um tapete que tende a se desgastar e se amoldar às deformações que continuarão a ocorrer na pavimentação em paralelepípedo logo abaixo.
Essa é a mesma prefeitura que faz parte do C40, uma rede global de cidades que se propõem a enfrentar as consequências da crise climática. Parece estranho, não? No entanto, ao se verificar que, na atual administração, o prefeito separou o licenciamento ambiental da gestão do meio ambiente, entregando-o a alguém mais conectado com o mercado imobiliário, percebe-se que esta forte incongruência é proposital.
Os problemas advindos dessa desconexão entre a gestão ambiental e o licenciamento são tão gritantes, que a Vereadora Luciana Boiteux protocolou um pedido de CPI sobre o licenciamento urbano e ambiental. A sua instalação aguarda parecer de Carlo Caiado, presidente da Câmara de Vereadores do Rio. Enquanto coisas agressivas ao meio ambiente são licenciadas ou executadas à revelia da Secretaria de Meio Ambiente, a administração da cidade se mostra ao exterior como uma joia de consciência ambiental. Não é desejável, não queremos que seja como diziam nossas avós, por fora bela viola, por dentro pão bolorento.
Já há muito tempo que a questão ambiental deixou de ser encarada como uma área setorial, relegada à uma secretaria do meio ambiente. De forma a enfrentar os tremendos desafios da crise climática e a complexidade dos desafios ambientais, a busca pela sustentabilidade ambiental deve ser vista como algo transversal a toda a administração pública. Decisões econômicas, projetos de engenharia, projetos urbanísticos e de mobilidade, projetos habitacionais, drenagem, tudo isso deve ser perpassado por uma visão sistêmica, que tenha um norte, a sustentabilidade ambiental. Do jeito que está no Rio de Janeiro, não só estamos atrasados, como estamos regredindo.
Em outubro haverá eleições para o próximo mandatário da Prefeitura. O atual prefeito deseja, e deverá contar com o apoio do PT e dos demais partidos da Federação Brasil da Esperança. Seria um momento interessante para que este partido, que já se encontra incorporado à administração atual, aproveitasse para rediscutir os princípios em que tal apoio se dará. Especialmente, nas áreas do urbanismo, meio ambiente e urbanização de favelas, onde há dinâmicas que precisariam ser rediscutidas e ajustamentos importantes a serem feitos.
Discurso sobre meio ambiente, preservação ambienta, etc, em favelas “non ecxiste”.
Deixem de hipócrita!
Me mostrem uma favela onde a tal “área verde” foi preservada?