Roberto Anderson: Cidades da Chapada

A Chapada Diamantina é bem conhecida e procurada pelos turistas por suas belezas naturais. Lindas cachoeiras, uma topografia que apresenta cortes dramáticos nos altos platôs, morros de formas impactantes

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A Chapada Diamantina é bem conhecida e procurada pelos turistas por suas belezas naturais. Lindas cachoeiras, uma topografia que apresenta cortes dramáticos nos altos platôs, morros de formas impactantes, além de vales circundados por encostas verdes, em que as rochas afloram em camadas, atraem muitos visitantes.

Mas a Chapada é também pontilhada de cidades graciosas do período do ouro e do diamante, este último já no século XIX. Rio de Contas, Lençóis, Igatu, Mucugê, todas tombadas pelo Iphan, são algumas dessas cidades que valem muito a pena a visita. Há também o Capão, mais informal, hippie e acolhedor, com jeito de Mauá, uma boa referência para cariocas e paulistas.

Rio de Contas está junto ao rio Brumado, onde em 1710 se descobriu ouro. É uma cidade planejada, criada por provisão real de 1745, que recomendava um traçado regular e boa arquitetura. Mas sendo portuguesa, essa regularidade é relativa, com variação do tamanho das quadras, praças trapezoidais e a sabedoria da adaptação à topografia do terreno.

A sua imponente Casa de Câmara e Cadeia se destaca isolada em uma pequena praça, sem estar alinhada com a mesma, nem com a praça maior à sua frente, e nem mesmo com a igreja matriz mais adiante, o que a torna ainda mais interessante. As longas ruas da cidade são ladeadas por casas e sobrados de cores vivas formando grupamentos muito bonitos.

Casas de antigas famílias abastadas da região, algumas transformadas em hotéis ou repartições do serviço público, embelezam ainda mais o conjunto arquitetônico da cidade. Além disso, há a bela igreja matriz do Santíssimo Sacramento e a inacabada igreja de Santana, com sua alvenaria de pedra e cal exposta, que brilha iluminada à noite.

Lençóis foi o maior produtor de diamantes do mundo na segunda metade do século XIX. Seu povoamento teve início a partir de 1845 com a descoberta dessa riqueza. A cidade logo se enriqueceu e, além dos garimpeiros, atraiu gente de várias partes. A ostentação proporcionada pelos diamantes e o coronelismo, inclusive com a perseguição à Coluna Prestes, são parte da história local.

Hoje Lençóis é a principal cidade da Chapada Diamantina com muitos hotéis e restaurantes que, no centro histórico, ocupam as ruas, calçadas em pedras, com mesas e cadeiras, tornando o lugar bem animado. Sua arquitetura é rica e variada, com diversos sobrados neoclássicos e ecléticos onde, curiosamente, há uma frequência de portais e janelas ogivais. E, naturalmente, as de arco pleno, aquelas com um semicírculo, as de arco abatido, um meio caminho entre o semicírculo e a linha reta, e as de vergas retas. Apesar de ser uma cidade já do século XIX, há também casas com aquelas feições coloniais, com beirais e a simplicidade que tanto encanta.

Igatu é uma pequena cidade encarapitada no alto de uma serra, à qual se chega por uma estrada de aproximadamente 6 km, de pedras irregulares, como certas ruas de cidades coloniais. Embora ela tenha sido pavimentada na década de 1950, às vezes tem-se a impressão de estar numa estrada do império romano. A cidade tem uma tradição de construção de casas e muros em pedra, o que a torna singular.

Em Igatu a mineração de diamantes não só aconteceu em rios, como em uma grande caverna escavada na rocha, chamada de gruna. No auge dessa atividade, a cidade chegou a ter cerca de 9 mil habitantes e uma rica vida urbana. Exaurido o garimpo, veio a decadência, que provocou um grande êxodo populacional, deixando para traz casas, agora curiosas ruínas em pedra. Mais recentemente, a cidade recebeu novos moradores que abriram lojas de artesanato e restaurantes, em boa convivência com o comércio e a população local, de poucas centenas de habitantes.

Mucugê é também do período da exploração dos diamantes, com história semelhante à de Lençóis, tendo se desmembrado do município de Rio de Contas. Na primeira metade do século XX, após a decadência da mineração, a cidade vivenciou a colheita intensiva da espécie local de sempre-viva, flor então usada em decoração. Mas essa atividade, feita de forma predatória, levou à extinção da mesma. Atualmente ela só existe por cultivo in vitro.

Apesar de sua bela arquitetura, Mucugê é bem mais pacata que Lençóis. A agitação local se dá nas festas juninas e na festa literária local. Uma das atrações da cidade é o cemitério Santa Isabel, conhecido como cemitério bizantino. Uma obra do século XIX, suas tumbas são caiadas e têm curiosos ornatos, semelhantes aos de portadas e cúpulas de igrejas. O contraste do branco das sepulturas com a vegetação e as pedras da serra logo atrás tornam o conjunto ainda mais impactante.

Um traço comum a essas cidades é a constante presença de formações musicais, com bandas centenárias e um bom trabalho de ensino de música. Rio de Contas tem um Clube Musical. Lençóis tem uma banda de instrumentos de sopro, a Sociedade Phylarmonica Lira Popular de Lençóis. E Mucugê tem duas formações musicais, uma delas, a Sociedade Musical Filarmônica 23 de dezembro, com 124 anos. Como elas têm sedes nos centros históricos dessas cidades, é possível ouvir da rua os seus deliciosos ensaios.

A Chapada Diamantina é um lugar de muita história e cultura. Aliar percursos com o olhar atento às suas cidades aos seus parques naturais é a medida perfeita.

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Roberto Anderson é professor da PUC-Rio, tendo também ministrado aulas na UFRJ e na Universidade Santa Úrsula. Formou-se em arquitetura e urbanismo pela UFRJ, onde também se doutorou em urbanismo. Trabalhou no setor público boa parte de sua carreira. Atuou na Fundrem, na Secretaria de Estado de Planejamento, na Subprefeitura do Centro, no PDBG, e no Instituto Estadual do Patrimônio Cultural - Inepac, onde chegou à sua direção-geral.

1 COMENTÁRIO

  1. Lamentavelmente, muitos desses lugares que poderiam atrair mais turistas estão cercados por favelas ou há muita depredação. Quanto à questão ambiental então, nem se fala!
    O povo brasileiro dá pouca importância em preservar locais históricos, porque tudo querem associar com a escravidão.
    Diferente de muitos outros países, acreditam que destruindo esses marcos históricos fazem “justiça social”!

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